Cimeira ibérica: Portugal e Espanha assinam novos acordos "históricos" para gestão da água do Tejo e Guadiana
Em declarações à TSF, a ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, destaca o impacto que o entendimento entre os dois países vai ter nos rios Tejo e Guadiana
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Portugal e Espanha reúnem-se esta quarta-feira na 35.ª cimeira ibérica para assinarem uma dezena de acordos, com destaque para a área da água, e certificarem as boas relações bilaterais num momento em que têm governos de cores diferentes.
Vinte e cinco anos depois da Convenção de Albufeira, que estabelecia até agora as regras para a partilha da água, a ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho, sublinha o impacto que o entendimento vai ter nos rios Tejo e Guadiana.
"Portugal e Espanha chegaram a um acordo que eu considero histórico em termos da gestão dos recursos hídricos. Em poucas palavras, no Tejo, o principal resultado é que conseguimos caudais mínimos diários. Acabaram os dias de caudal zero no Tejo. Em relação ao Alqueva, os utilizadores da margem espanhola do Alqueva irão pagar a água que utilizam exatamente nas mesmas condições que os utilizadores do lado português. Era algo que nunca tinha acontecido, utilizavam a água e não havia cobrança do nosso lado. O resultado mais expressivo é em relação ao Guadiana. Dá a garantia de viabilizar a tomada de água do Pomarão, essencial para dar maior resiliência hídrica ao Algarve. São 30 hectómetros cúbicos e, para termos uma ideia, o consumo urbano de todo o Algarve num ano são cerca de 75 hectómetros cúbicos", explica à TSF Maria da Graça Carvalho.
A governante com a pasta do Ambiente considera que o caudal do Guadiana foi o ponto mais difícil de fechar neste acordo. Uma das novidades é que os agricultores espanhóis vão passar a pagar a água da barragem do Alqueva. Durante as negociações chegou a adiantar-se a possibilidade de ser paga a água já consumida, uma fatura que se calcula rondar os 40 milhões de euros, mas a ministra explica que não foi possível, porque o contador nunca saiu do zero.
"Não foram registados, não foram faturados e, portanto, Espanha também não pagou aos agricultores espanhóis. Não pagaram porque também não houve uma pressão e uma ação concreta para que pagassem. A partir de agora vamos fazer essa contabilização, vamos apresentar as contas e está acordado que a partir de agora são pagos exatamente como é feito aos agricultores do lado português", esclarece.
O governo quer rever o plano hídrico e espera até apresentar os investimentos e infraestruturas até ao final do ano. A ministra já olha para outras zona do país.
"O sudoeste alentejano também tem grandes problemas de água, vamos também arranjar soluções aí e depois avançando para norte e para as outras regiões do país. A região das Beiras, Trás-os-Montes, a Lezíria, todas estas zonas que têm problemas de águas. Nós temos um grupo de trabalho, que é “A água que une”, e até ao fim do ano vai-nos apresentar um conjunto de infraestruturas que são necessárias e um conjunto de financiamento necessário. Temos também outro anúncio no conjunto do Baixo Alentejo e do Algarve, um investimento de pouco mais de 50 milhões de euros para olhar para rios desta zona e também construir alguns açudes que façam retenção de águas e isso vai dar uma maior resiliência da água nesta região", acrescenta.
O primeiro-ministro português, o conservador Luís Montenegro, estreia-se como anfitrião de uma cimeira luso-espanhola e encontra-se em Faro, às 09h15, com o homólogo de Espanha, o socialista Pedro Sánchez.
Montenegro e Sánchez são recebidos com honras militares no Palácio Fialho e, depois da tradicional "fotografia de família", vão à Câmara Municipal de Faro receber as chaves da cidade, seguindo-se um encontro a dois, no Museu Municipal.
A comitiva portuguesa desta cimeira inclui 12 ministros e a espanhola 11 e, a par do encontro entre os dois primeiros-ministros, estão previstas 13 reuniões bilaterais, segundo a versão mais atualizada do programa.
Às 11h15 realiza-se a sessão plenária da cimeira, com a presença dos dois chefes de Governo e de todos os ministros, a que se segue, às 13:00, a assinatura de acordos e uma conferência de imprensa conjunta de Luís Montenegro e Pedro Sánchez.
A cimeira termina com um almoço entre as duas delegações, mas Montenegro e Sánchez ainda vão, às 16:00, ao encerramento de um fórum empresarial, na Universidade do Algarve, organizado por confederações empresariais dos dois países.
O tema central da cimeira é "Água, um bem comum" e foi já anunciada a assinatura de acordos relativos aos caudais dos rios Tejo e Guadiana, assim como para o pagamento da água captada por agricultores espanhóis no Alqueva.
O acordo do Alqueva permitirá ainda avançar com o projeto português de captação de água na zona do Pomarão (Beja), para abastecimento ao Algarve, que afeta águas internacionais, segundo o governo de Lisboa.
Luís Montenegro garantiu no fim de semana passado que estes acordos são históricos e fontes oficiais do Governo espanhol confirmaram na terça-feira que são provavelmente os entendimentos "mais importantes" nesta área alcançados por Portugal e Espanha nos últimos 25 anos, desde que está em vigor a Convenção de Albufeira, o tratado bilateral que regula a gestão dos rios partilhados pelos dois países.
Além dos rios, mas ainda na área da água, são esperados avanços, segundo o gabinete do primeiro-ministro português, na "pesca, segurança de navegação ou conservação do património natural" e ainda o lançamento do Prémio Magalhães-Elcano, já anunciado em cimeiras anteriores a propósito dos 500 anos da primeira viagem de circum-navegação.
"Portugal e Espanha estão comprometidos na gestão partilhada dos recursos hídricos no plano bilateral, mas estão igualmente determinados a unir esforços para a construção da Agenda Europeia da Água, no quadro da Estratégia Europeia para a Resiliência Hídrica", acrescentou a mesma fonte do executivo português.
Está ainda confirmada a formalização dos acordos para a construção das pontes internacionais de Nisa-Cedilho (rio Sever) e Alcoutim-Sanlúcar de Guadiana (Guadiana), que terão financiamento europeu e que têm sido reiteradamente anunciadas em sucessivas cimeiras entre os dois países.
Fontes do Governo espanhol disseram na terça-feira que a declaração final da cimeira estava ainda em negociação, mas adiantaram que deverão ser assinados hoje entre nove e 11 acordos em Faro.
Esta cimeira foi anunciada em abril, durante a primeira visita oficial de Luis Montenegro como primeiro-ministro, a Espanha, poucas semanas após tomar posse.
"Não há diferenças partidárias que possam colocar em crise um segundo ou um milímetro a relação que aprofundamos há séculos em benefício das pessoas", afirmou então Luís Montenegro, numa conferência de imprensa em Madrid ao lado de Pedro Sánchez.
"A notícia de hoje é que as nossas boas relações bilaterais vão continuar a estreitar-se. Os nossos governos continuarão a trabalhar em benefício dos portugueses e dos espanhóis", disse, por seu turno, Pedro Sánchez.
