Com período de defeso para cumprir pela primeira vez, pesca do polvo é a mais rentável no Algarve
Associações querem manter pesca sustentável
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Na lota da Fuzeta lavam-se as caixas do polvo depois de pesar aquele que foi descarregado. Carlos Leal, pescador e armador, observa na balança o resultado da faina do dia. Chega a pescar 300 quilos de polvo por dia no inverno, quase cem quilos no verão. Esta é uma espécie de rápido crescimento e a que mais rendimento oferece na pesca artesanal do Algarve.
”O polvo, se comer meio quilo, é meio quilo que engorda”, explica. “Se numa semana tiver 200 ou 300 gramas, na semana seguinte já pode estar bom para apanhar”, acrescenta. “Só que a malta apanha tudo logo e depois tem de se parar mesmo”, lamenta. A pesca excessiva e o receio da sobre-exploração da espécie levou a que, este ano, pela primeira vez, se tenha estabelecida uma época de defeso, entre 15 de setembro e 14 de outubro.
“É um problema muito sério e tem-se verificado ao longo dos anos que há um excesso de artes nas embarcações”, conta a diretora da Associação de Armadores de Pesca da Fuzeta (AAPF). A bióloga Sónia Olim adianta que uma embarcação que, por lei, pode transportar 1500 covos, pode trabalhar com 20 mil. “Não há respeito”, lamenta. Os covos (armadilhas feitas com rede plástica rígida) e os alcatruzes (pequenos potes de barro) são as artes utilizadas para capturar polvo. E ninguém pode pescar polvo abaixo dos 750 gramas, o peso mínimo determinado pela legislação portuguesa.
Para evitar abusos, o Comité de Cogestão do Polvo, criado em março de 2025, propôs ao Governo a criação do defeso para deixar crescer os juvenis. Integra inúmeras entidades, entre elas o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), que dá o seu conhecimento científico, e várias associações de armadores. Só no Algarve, há 14 associações. Se esta época em que as embarcações irão parar não for suficiente, poder-se-á voltar a analisar a situação, para que os stocks não baixem.
A pesca do polvo representa cerca de 80% do total da pesca artesanal no Algarve e só nesta Associação estão inscritas perto de 80 embarcações apenas dedicadas a esta arte.
Os quatro barcos de Carlos Leal entram nesse número. “Desde os 9 anos que ando ao mar, tenho 56, está a ver há quantos anos aqui ando”, conta. “Já andei ao tresmalho, em traineiras, já andei embarcado em Marrocos, mas agora estou nisto”, adianta. “Nisto”, a pesca do polvo, é a que lhe deu até hoje mais rendimento e que já levou os seus três filhos a seguir o mesmo caminho. Explica que esta arte implica menos despesa. “Se a gente andar ao tresmalho, os golfinhos estragam a arte toda e é uma coisa que não dura muito tempo.”
A maioria do polvo capturada no mar algarvio não é vendida nos mercados portugueses. Vai quase todo para exportação. Espanha, França, Itália, mas também os Estados Unidos e Canadá. ”O nosso polvo é reconhecido e há mercados que querem o polvo algarvio e pagam esse preço”, explica Sónia Olim.
Um quilo de polvo do Algarve pode custar ao consumidor quase 20 euros ou mais, uma pesca que, ao contrário de outras, está em alta.
O plano de gestão do polvo era para ter sido publicado durante o executivo de António Costa, mas o governo caiu e só em março deste ano saiu o decreto-lei que o criou. Falta agora financiamento para manter o comité e dar-lhe uma estrutura fixa que possa ir avaliando e determinando medidas para a sustentabilidade da espécie.
No entanto, Sónia Olim, que já reuniu com várias autarquias do Algarve, acredita que será possível financiamento. “A resposta foi positiva. Temos o apoio das autarquias de Tavira, Olhão, Faro, Portimão, Vila do Bispo e Lagoa. Esperamos ter uma decisão antes das eleições [autárquicas] porque depois muda tudo e não sabemos quem irá apoiar o comité”, afirma.