“Como é que alguém consegue vender um filho?” Uma volta no carocha de Joaquim Banha
Corpo do artigo
É como se fosse um filho e não o vende por nada. Joaquim Banha tem 81 anos e conduz há mais de 15 um carocha de 1950. O apaixonado por estes carros tem ainda outros cinco. Este sábado segue viagem no carocha antigo até Leiria para o Carocha Fest, que celebra os 90 anos deste modelo. Antes da viagem, a TSF andou à boleia com Joaquim Banha neste carocha num passeio entre Cascais e a praia do Guincho.
O carro costuma ligar logo à primeira, mas desta vez foi à "primeira e meia". Estamos na linha de Cascais, a viagem no carocha de Joaquim Banha começa na Parede e tem como destino a praia do Guincho. O carro tem 75 anos, cor bordeaux, jantes brancas e o interior está quase todo original, desde os bancos de molas aos estofos castanhos, o relógio de corda e o volante em marfim. São detalhes que chamam à atenção de quem passa na rua, visto que só foi preciso parar no primeiro semáforo para que Joaquim Banha fosse reconhecido por um morador de Cascais que garante à TSF que "ele é muito famoso".
Joaquim Banha revela à TSF que esta atenção é normal: “Isto que aconteceu aqui é frequente, com as pessoas a parar para olhar, porque o carro embora seja carocha tem um formato muito maneirinho, como diz a minha neta: 'É muito fofinho.' Isto acaba por ser, com este segmento de carros antigos, quase uma família, as pessoas conhecem-se, muito ou pouco.”
Uma família da qual Joaquim Banha faz parte há mais de 15 anos, quando comprou o primeiro carocha: "Esta paixão surgiu exatamente quando tive de me decidir entre uma carrinha Anglia que tinha e um carocha que o meu filho ia vender. E na altura o meu racional foi: 'Não percebes nada de nenhum e optei pelo carocha.'"
Do mesmo modelo deste carro, Joaquim tem ainda outros cinco: "Um de 1960 de teto de abrir, a rena que é uma peça feita pelo saudoso professor Pardal, que era um senhor que fazia muitas alterações de carochas, e tem um formato um por um que foi montado à frente num sofá que tem um motor instalado, depois tenho um Karmann Ghia, de 1963, e tenho outro carocha do mesmo ano e dentro da família Volkswagen tenho uma carrinha Variant.”
Com mais de 80 anos, Joaquim acredita que a idade é apenas um detalhe: “A verdade é que estamos na segunda infância, vou-me divertindo, estou reformado há muitos anos, desde os 62 anos, e tenho este hobby.” Um passatempo que passou das estradas de alcatrão para casa. “Tenho uma divisão toda integralmente com miniaturas de carochas, com livros de carochas, com taças e prémios que me têm dado", explica.
As taças e os prémios de que Joaquim Banha fala foram oferecidos durante as mais de 15 viagens que fez pelo mundo. Neste carocha já foi a Espanha, França, Inglaterra, mas também à Noruega, há seis anos: “A maior viagem que já fiz foi ao Cabo Norte, o local mais perto do Pólo Norte onde se pode ir de carro. Tive a inspiração de uma pessoa que já morreu, que se chamava Vasco Calisto, que tinha feito há muitos anos essa mesma viagem (...), numa altura em que não havia estradas, cacilheiros, pontes. As estradas que fiz para o Cabo Norte são fabulosas." Uma viagem que durou 35 dias porque, explica, Joaquim Banha visitou "vários de museus".
Nestas viagens é obrigatório levar ferramentas, equipamentos para que o carro ande sem problemas, medicamentos e roupa: "Aqui vou contar-vos que a minha mulher faz sempre a preparação da roupa, que é a seguinte: são tantas noites, levas tantas cuecas, pares de meias, t-shirts, pólos. Normalmente eu chego a Lérida [Espanha] a casa de um amigo e a primeira coisa que faço é tirar tudo do carro."
O amante de carochas quer agora partilhar a relação que tem com este carro. "Eu faço um diário da viagem. À noite perco ali uma horita a fazer a descrição do que é que aconteceu durante o dia e isso permitiu-me escrever um livro. Neste momento, está já na editora o manuscrito de um livro para ser editado brevemente", afirma. A ideia partiu de um amigo: "Esse ainda é, no bom sentido, mais maluco do que eu. Deve ter entre 300 e 400 carros antigos."
A viagem até à praia do Guincho durou 40 minutos e é para recordar: "Todas as viagens têm princípio, meio e fim. Isto é um passeiozinho, é para desentorpecer as rodas."
Para os curiosos, o carocha de 1950 não está à venda: “Este é o meu preferido. É frequente pararem nos sinais e perguntarem se eu o vendo e eu respondo sempre assim: 'Como é que alguém consegue vender um filho? Ninguém consegue vender o filho.”
A próxima viagem de Joaquim Banha é até ao Carocha Fest, organizado pelo Automóvel Club de Portugal. A iniciativa vai realizar-se este sábado no Jardim da Almuinha Grande, em Leiria, para celebrar os 90 anos do carocha.
