Produto Interno Bruto vai cair entre 7,5% e 11,8% neste ano. Défice pode chegar a 9% e taxa de desemprego pode ultrapassar 13%. Retoma vai ser lenta
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O Conselho das Finanças Públicas (CFP) projeta, para este ano, uma contração da economia portuguesa de 7,5% a 11,8%. A previsão, pior do que a queda de 7% comunicada pelo governo aos partidos, consta do relatório publicado nesta quarta-feira pelo organismo de análise das contas do Estado.
Sublinhando as muitas incertezas que ainda subsistem, o organismo liderado por Nazaré da Costa Cabral, o CFP desenhou dois cenários de evolução. Ambos concentram o efeito do confinamento no segundo trimestre de 2020, diferindo "na magnitude dos choques na procura global e externa, no ritmo de normalização da atividade económica, interna e externa, durante o segundo semestre de 2020 e na duração das medidas de política".
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A redução do PIB reflete, por um lado, "a diminuição significativa da procura externa dirigida a Portugal com impacto nas exportações totais, em particular nas exportações de serviços, por via da quebra da procura dirigida ao sector do turismo e atividades associadas", explicam os especialistas, adiantando que "por outro lado, reflete o adiamento de investimento e de consumo por parte dos agentes económicos num cenário de elevada incerteza".
No cenário base, o Produto Interno Bruto cai 7,5% neste ano e recupera nos dois seguintes, sem no entanto anular a queda de 2020: cresce 3% no próximo e 2,6% em 2022. A taxa de desemprego vai subir para 11% neste ano, descendo lentamente para 9% em 2021 e 8,1% no ano seguinte. As exportações vão cair 20,6%, com a recuperação dos anos seguintes a ser insuficiente para compensar sequer metade deste recuo: vão subir 6% no próximo ano e 2,2% no seguinte. O consumo privado vai emagrecer 7,5%, subindo 4,3% em 2021 e 3,4 em 2022.
O saldo orçamental, refletindo quedas de receita e aumentos da despesa, vai resultar, neste cenário, num défice de 6,5% do PIB.
Já no cenário severo, a queda do PIB será de 11,8% neste ano, com um crescimento de 4,7% em 2021 e 2,2 no ano seguinte. O desemprego pode alcançar 13,1%, descendo para 10,8% em 2021 e 9,5% em 2022. As exportações podem cair 26,9% neste ano, tendo uma retoma tímida nos anos seguintes: 8,4% no próximo ano e 3,1% no seguinte. A queda do consumo privado pode chegar aos 12,8% em 2020, recuperando depois 6,6% e 4,2%.
O CFP sublinha no entanto que existem riscos negativos para as projeções para a recuperação, que será insuficiente para compensar a queda de 2020: "a retoma do crescimento em 2021 e 2022 é alicerçada na expectativa de que o choque na economia é transitório, sendo, contudo, os riscos descendentes subjacentes a este cenário muito elevados", lê-se no documento, que assinala que "o contexto atual caracteriza-se por um cenário de incerteza extrema, em que o choque comum e generalizado a nível global intensifica os riscos descendentes para Portugal como uma pequena economia aberta". A instituição avisa que "em qualquer dos dois cenários considerados a retoma esperada da economia não será suficiente para que se recupere o nível do PIB pré-pandemia neste horizonte temporal".
O impacto nas contas públicas estimado neste cenário adverso será ainda mais pesado, com o défice a alcançar 9,3%.
O peso da dívida pública no PIB vai sofrer por arrasto:"no cenário base projeta-se um aumento do rácio da dívida de 15,3 pontos percentuais, alcançando 133,1% do PIB, enquanto no cenário severo esse aumento é de 24 p.p. elevando o rácio da dívida para 141,8% do PIB", lê-se no relatório, que explica ainda que "a redução projetada para o rácio dívida até 2022 colocará aquele indicador em 129,8% do PIB no cenário base".
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O CFP sublinha a grande incerteza em torno da economia (o que, para além do desenho dos dois cenários, também levou os técnicos a não irem além do horizonte de 2022 nas projeções), mas realça que a ajuda europeia pode constituir um fator positivo: "assinala-se um risco ascendente a este exercício que decorre do plano de recuperação da Europa já proposto pela Comissão Europeia". O CFP diz também aguardar a apresentação do orçamento retificativo e da "recalibragem das medidas de apoio à economia e ao emprego".
A instituição destaca a importância da definição de uma estratégia de recuperação, escrevendo que "o tempo é já o da definição das linhas com que se irá coser a recuperação económica do país", e realça as consequências nas contas públicas dessa retoma: "da capacidade de recuperação económica dependerá, em grande medida, a situação futura das finanças públicas, não apenas no curto prazo (evolução dos saldos orçamentais) mas também no médio-longo prazo (dinâmica da dívida pública)".
Há despesa para além da pandemia
O CFP enumera vários riscos associados a estas previsões, começando pelas medidas de combate aos efeitos da pandemia: "a ausência de uma previsão do impacto dessas medidas para a totalidade do ano levou à elaboração pelo CFP de uma estimativa anual própria, o que acentuou ainda mais o risco associado".
A instituição realça que algumas medidas terão um impacto direto negativo no saldo orçamental, "destacando-se as medidas de saúde pública, o lay-off simplificado e o apoio à retoma da atividade empresarial", para além de "outras medidas de apoio à liquidez previstas para apoio às empresas, famílias e outras entidades, que não têm um impacto direto imediato do ponto de vista orçamental, mas que em muitos dos casos constituem passivos contingentes das administrações públicas".
O CFP escreve ainda que há riscos que vão além da Covid, incluindo "o risco potencial de medidas de apoio ao sector financeiro e a entidades do sector privado, nomeadamente o eventual apoio do Estado português à TAP". Motivos para que instituição considera que "tornarão mais difícil a recuperação de uma situação orçamental para o nível pré-crise".
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