Corrupção na Madeira. Juiz não encontrou "indiciada a prática de qualquer crime" e advogados aplaudem decisão "muitíssimo correta"
Os advogados dos três detidos consideram que a decisão vem dar razão ao que têm defendido nas últimas semanas.
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Paulo Sá e Cunha, advogado do ex-autarca do Funchal Pedro Calado, lamenta a demora da decisão que obrigou os arguidos a estarem na cadeia tanto tempo.
"Agora perguntar-me-ão: 'bom, mas depois de tanto aparato, depois de tanto tempo, chegamos a este resultado.' A justiça funciona assim. A única coisa que aqui lamento é que estes três cidadãos tivessem estado detidos durante tanto tempo. Como também vos fui dizendo sempre, se isso viesse a propiciar uma boa decisão, como é o caso, fico feliz por isso. Tenho pena de que não tenham sido restituídos à liberdade mais cedo, mas é assim que as coisas funcionam", desabafou Paulo Sá e Cunha.
O advogado também aproveitou para criticar o que diz ser uma prática instalada em Portugal.
"Nenhum político se deve demitir, se deve sentir obrigado a demitir antes de ser acusado ou mais rigorosamente pronunciado porque aí sim há uma decisão de um juiz que entende que o caso deve ser submetido a julgamento. Infelizmente instituiu-se entre nós a prática de que uma mera suspeita deve levar à demissão do titular de cargo político. Não discuto os critérios políticos. Do ponto de vista legal acho que isso é mau, é dar uma machadada mortal na presunção de inocência", defendeu o advogado de Pedro Calado.
Quanto à decisão em concreto do juiz, de libertar os três arguidos, o advogado do antigo autarca do Funchal disse que é uma decisão que dá razão àquilo que tem dito nas últimas semanas.
"Entendiamos que esta situação assentava numa total ausência de indícios. O juiz de instrução hoje, numa decisão que parece muitíssimo correta, decidiu isto mesmo. Esta decisão é recorrível, portanto o Ministério Público poderá recorrer, é normal que recorra. Eu, se tivesse uma decisão adversa, também recorreria. De qualquer modo, como sempre vos fui dizendo ao longo do tempo, estes indícios eram não indícios. Não eram indícios fortes, não eram coisa nenhuma", lembrou.
Também à porta do Tribunal em Lisboa, pouco depois de ter sido conhecida a decisão do juiz, Raúl Soares da Veiga, o advogado de Avelino Farinha, o líder do grupo de construção AFA, explicou em concreto a decisão tomada pelo magistrado.
"O juiz chegou à conclusão de que, face ao que lhe foi apresentado, quer a indiciação do Ministério Público, quer toda a alegação muito longa com muitas páginas, face às provas que foram trazidas, dos interrogatórios dos arguidos e o que eles disseram, face ao que o Ministério Público concluiu e achou que havia indícios de crimes, perigos e face ao que as defesas disseram em sentido contrário, chegou-se à conclusão de que não há indícios da prática de nenhum dos crimes imputados. Isto também não é uma decisão final do processo, o processo continua. Acho natural, embora possa desde já dizer que não tem hipóteses de ganhar esse recurso. Com esta decisão, esse recurso tem muitíssimas poucas chances de ter êxito", considera Raúl Soares da Veiga.
Quanto ao advogado de Custódio Correia, o outro empresário que também esteve detido durante três, André Navarro de Noronha, entende que a justiça funcionou. Questionado pelos jornalistas sobre se esta decisão representa ou não uma derrota do Ministério Público, o advogado prefere destacar essa ideia de como o sistema de justiça funcionou.
"Não lhe vou falar em vitórias nem derrotas, o que lhe digo é que o sistema não tinha funcionado na detenção, não funcionou na promoção, mas funcionou, e bem, na decisão. Depois de 300 inspetores, mais não sei quantas centenas de milhares de euros, o despacho dizer que não há indício da prática de qualquer crime... a justiça funcionou. Questão diferente é a reflexão que o Ministério Público tem de fazer sobre a ação penal", recomendou ao MP André Navarro de Noronha.
O ex-autarca do Funchal Pedro Calado e os dois empresários detidos há três semanas no âmbito da investigação a suspeitas de corrupção na Madeira vão ficar esta quarta-feira em liberdade, sob termo de identidade e residência, determinou o juiz de instrução.
Segundo o despacho do juiz Jorge Bernardes de Melo, do Tribunal Central de Instrução Criminal, em Lisboa, foi aplicada a medida cautelar menos gravosa ao ex-presidente do município Pedro Calado (PSD), bem como aos empresários Avelino Farinha, líder do grupo de construção AFA, e Custódio Correia, principal acionista do grupo ligado à construção civil Socicorreia.
"Não se encontrando indiciada a prática, pelo arguido Custódio Ferreira Correia, pelo arguido José Avelino Aguiar Farinha e/ou pelo arguido Pedro Miguel Amaro de Bettencourt Calado de um qualquer crime, deverão os mesmos aguardar os ulteriores termos do processo sujeitos à medida de coação de termo de identidade e residência", refere o documento.