Covid-19. Decisão de não ir para o hospital pode explicar algumas mortes em lares
A opção consciente pelo não-internamento num hospital pode explicar parte das mortes por Covid-19 nos lares de idosos em Portugal. A convicção é de quem trabalha no terreno e tem sido transmitida aos médicos de saúde pública.
Corpo do artigo
Dados da Direção-Geral da Saúde mostram que a esmagadora maioria, 91,2%, das 5773 mortes por Covid-19 registadas em Portugal até ao dia 14 de dezembro, aconteceram em hospitais e outras instituições de saúde. Mas há 211 pessoas que perderam a vida em casa e 288 morreram em lares. A DGS tem também registo de cinco mortes relativamente às quais não foi registado o local do óbito.
A TSF procurou uma interpretação destes dados junto da Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa. Os especialistas começam por notar que não é fácil encontrar registos dos locais onde se morre de Covid-19, nos diversos países europeus.
Além de Portugal, a Noruega é um dos poucos onde essa informação está disponível e é atualizada semanalmente. Neste caso, os dados mais recentes do Instituto Norueguês de Saúde Pública mostram que 95% dos noruegueses vítimas do coronavírus morre nos hospitais e noutras instituições de saúde; 3% em casa; e 2% das mortes não têm local registado.
TSF\audio\2020\12\noticias\23\23_dezembro_guilhermina_sousa_mortos
Porque se morre de Covid-19 em lares? E em casa?
Em Portugal, a esmagadora maioria das vítimas mortais da Covid-19 morre nos hospitais. Até ao dia 14 de dezembro, foram 91,2% do total, ou seja, 5229. Mas também há mortes em casa (211) e em lares (288). Nalguns casos, nota quem está no terreno, porque há uma decisão de não levar os idosos doentes para o hospital.
Ao contrário de outros países, em Portugal não há, nem nunca houve, qualquer indicação para não internar os mais velhos infetados com coronavírus e que vivem situações de fragilidade extrema.
Mas Vasco Ricoca Peixoto, investigador e médico de saúde pública, afirma que, à semelhança do que acontece com outras doenças, também há casos de Covid-19 em que conta mais a decisão conjunta da família, da equipa médica e do lar, e os idosos acabam para não ir para o hospital.
O especialista nota que "ser internado num hospital também tem riscos, como as infeções hospitalares; e se se percebe clinicamente que o benefício é nulo ou quase nulo", pode ser tomada essa decisão de não internar.
Esta decisão de "gerir a doença no lar" acontece mais em casos de demência muito avançada ou de pessoas que praticamente já não têm nenhuma relação com as outras.
Ainda assim, Vasco Ricoca Peixoto nota que, casos como estes, seja a doença Covid-19 ou qualquer outra, tornam ainda mais necessária a existência de verdadeiros e eficazes cuidados paliativos.
Sobre as mais de 200 mortes por Covid-19 em casa, o médico e investigador sublinha que nem sempre os sintomas iniciais são devidamente valorizados. Sem um médico por perto, em casa, é frequente a decisão de "aguentar"; e, em muitos casos, o agravamento da situação acaba por precipitar o fim.