Cursos ligados a tecnologia e energia garantem mais emprego, mas jovens procuraram "salário emocional"
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Setembro é um mês de novos começos. Os jovens candidatos ao Ensino Superior vão saber este sábado se foram colocados no curso da sua preferência, outros começam agora a entrar no mercado de trabalho, depois das férias de verão e do regresso das empresas à sua atividade normal.
Os resultados da primeira fase do Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior serão conhecidos este domingo. Segue-se depois a 2.ª fase, que decorre entre 12 e 23 de setembro, havendo ainda uma 3.ª fase, entre 7 e 11 de outubro. Mais de 61 mil estudantes candidataram-se este ano a total de 55.362 vagas.
De acordo com a Direção-Geral de Ensino Superior (DGES), foram reforçadas em 3.6% as vagas em ciclos de estudos que visam a formação em competências digitais face às vagas iniciais do ano anterior.
Sem surpresa, os cursos ligados às áreas tecnológicas continuam a ser os que garantem mais empregabilidade, mas também engenharias e estudos relacionados com energia e sustentabilidade energética, "a parte da sociedade que está em maior transformação e que no próximos cinco a dez anos vai requerer muitos mais profissionais", aponta em declarações à TSF Pedro Lacerda, CEO da consultora de recursos humanos Kelly Portugal.
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Segundo o relatório "Tendências Globais do Emprego Jovem", divulgado em agosto pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), são os jovens aqueles que estão em melhor situação para beneficiar das economias verde e azul. Segundo este relatório poderão ser criados cerca de oito milhões e meio de empregos até 2030 através da implementação de medidas de políticas sustentáveis.
Procuram-se cada vez mais engenheiros ambientais, da área eólica, solar, energia elétrica, afirma a consultora de recursos humanos, tal como profissões ligadas à cibersegurança, internet ou programação.
A pandemia fez ainda crescer a procura em aéreas ligadas ao comércio online e tecnologias da informação devido à "substituição de recursos humanos por tecnologias em muitas áreas de negócio, como a banca ou áreas no setor de retalho, onde muitas empresas trocaram as suas agências físicas pelo e-commerce".
Por outro lado, também "profissões mais 'tradicionais' começam a ter um nível de escassez muito grande, ou porque as universidades não conseguem produzir o número de profissionais suficientes para a procura do mercado ou porque há um êxodo muito grande para fora de Portugal", como é o caso de enfermeiros e radiologistas.
Segundo o último relatório "o Futuro dos Empregos", do Fórum Económico Mundial em parceria com o Fundo Monetário Internacional, divulgado em 2020, empregos no campo da tecnologia, como analistas e cientistas de dados e especialistas em inteligência artificial e machine learning, e de profissões ligadas à estratégia e ao marketing digital, como a gestão de redes sociais, vendas e produção de conteúdos, serão os mais procurados no futuro a nível global. Pelo contrário, vai reduzir a procura por empregos ligados à administração, à montagem, à reparação e ao atendimento ao público.
Segundo o Fórum Económico Mundial, a tecnologia vai implicar o corte de 85 milhões de postos de trabalho entre 2020 e 2025, mas também criar 97 milhões de novos empregos.
Ter um curso com saída não é a única garantia para o emprego. Os recrutadores procuram num candidato a um primeiro emprego "adaptabilidade e resiliência", indica Pedro Lacerda, face a "um mercado laboral completamente global e em contínua transformação".
Outra característica muito procurada é a capacidade de antecipação. "Nunca se ouviu falar em tantos ciberataques como se ouviu agora. Isto provoca uma série de alterações no mercado laboral. Conseguir antecipar eventuais ciberataques é, neste momento, uma das prioridades das nossas empresas", explica.
Após dois anos de pandemia, a Organização Internacional do Trabalho acredita que 2022 ainda não será o ano da retoma global no que toca ao emprego jovem. As estimativas apontam para 73 milhões de jovens desempregados em todo o mundo este ano, valor ainda acima do registado em 2019.
Portugal é exceção: a taxa do desemprego jovem já é inferior ao pré-pandemia. "O mercado de trabalho em Portugal, nesta dimensão, já teve uma recuperação mais rápida do que é a tendência internacional", apontou o coordenador do Observatório do Emprego Jovem do ISCTE, Paulo Marques, em declarações à TSF na sequência da publicação do relatório "Tendências Globais do Emprego Jovem".
No recrutamento já se nota alguma retoma, mas "de uma forma lenta e competindo muitíssimo com o exterior: quem vive em Portugal procura também numa grande proporção empregos fora de Portugal", quer sejam em teletrabalho ou não.
Já o teletrabalho "é uma tendência do mercado que veio para ficar", acredita Pedro Lacerda. Cada vez mais empresas oferecem empregos em regime de teletrabalho ou com modelos híbridos, apostadas no trabalho por objetivos em oposição a horários rígidos, na "entrega de qualidade e na entrega a tempo e horas, que significa maior autonomia e maior responsabilidade".
"Quebrou-se um estigma de quem não está fisicamente no trabalho ou é malandro ou é um profissional de segunda ou terceira categoria", reforça.
Segundo o Fórum Económico Mundial, 84% dos empregadores em todo o mundo admitem apostar no trabalho remoto, podendo colocar em teletrabalho até 44% dos seus colaboradores em teletrabalho. Contudo, 78% esperam impactos negativos na produtividade.
Por outro lado, também mudou o que os candidatos procuram nas empresas. "O conceito de carreira é um conceito muito mais diluído do que era há 20 anos, já não tem a importância que tinha", considera Pedro Lacerda. E "o conceito de salário tem uma componente de salário emocional que é fundamental": é importante a "relação do candidato com a chefia" e a "relação com o tipo de trabalho que se vai fazer".
Os jovens procuram identificar-se com "a cultura da empresa". Querem saber "qual é o dress code da empresa, quais são os horários da empresa, que tipo de atividades after hours [fora do horário de trabalho] que a empresa faz, que tipo de pessoas - em termos de diversidade - é que a empresa tem", mas também "o que é que a empresa vive no seu dia a dia, que valores tem, como é que a razão de existência da empresa está diretamente ligada comigo, com aquilo que eu sou enquanto pessoa, com a minha forma de estar e pensar (...) Quem procura emprego procura isto. Procura, no limite, o bem-estar e a felicidade."
"A parte monetária, obviamente que é importante", mas longe vai o tempo em que "só quem era médico teria uma capacidade financeira para ter uma vida estável ou só quem era engenheiro informático é que teria o seu futuro garantido".
