De "uma nuvem cinzenta que perdura" a "um ano mais calmo": o balanço da primeira semana de aulas
Há ainda cem mil alunos sem, pelo menos, um professor. O tema subiu a debate no Fórum TSF e Manuel Pereira, presidente da Associação de Diretores Escolares, considera que "não é com aspirinas que o problema se vai resolver"
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Uma semana depois do início do ano letivo, a Fenprof garante que há ainda cem mil alunos a quem falta, pelo menos, um professor. O número foi avançado no Fórum TSF por Francisco Gonçalves, secretário-geral-adjunto da Federação Nacional dos Professores.
"O número vai mudando de dia para dia, nós fazemos uma estimativa a partir dos horários lançados nas ofertas de escola e essas ofertas de escola, ao fim de três dias, são retiradas da plataforma e, eventualmente, caso não tenha sido possível encontrar um professor, serão novamente lançadas na semana seguinte. Portanto, neste momento, a nossa estimativa aponta para que - números de sexta-feira - sejam ainda mais de 100.000 os alunos que não terão todos os professores", adianta.
Também ouvido no Fórum TSF, Manuel Teodósio, vice-secretário-geral da FNE, considera que a falta de professores nas escolas é um problema que se tem agravado.
"É um problema que vem crescendo. Quando todos os anos temos cerca de cinco mil professores que saem e apenas estamos a formar na casa dos 1200, cada ano que passa este problema é maior. Sendo um problema grave, não há uma solução de um dia para o outro, porque se não há professores, só há um caminho a fazer: formar-se os professores necessários. Para colmatar a falha, temos de começar rapidamente a formar, não 5000, mas até dez mil professores. Se nós para o próximo ano letivo conseguirmos estar a formar eventualmente 10.000 novos professores, eles só vão sair em 2030, o que quer dizer que a solução só vai ter efeitos práticos daqui a cerca de seis anos", explica.
A falta de professores é uma preocupação para os dirigentes escolares. O presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, não nota melhorias em relação a outros anos.
"Este ano está a ser igual aos anos anteriores. A nuvem cinzenta perdura sobre o sistema educativo nacional, tem a ver com a escassez de professores, sobretudo em Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve. Percebe-se que o Ministério da Educação quer resolver o problema", considera, acrescentando: "No mês de julho, apresentou 15 medidas e já abriu, até ao dia 26, um concurso de vinculação extraordinária."
Sobre a proibição do uso de telemóveis no 1.º e 2.º ciclos, Filinto Lima assegura que é "residual" a percentagem de escolas que seguiu a recomendação do Governo. Em declarações no Fórum TSF, Filinto Lima concorda com a medida.
"Esteve bem o Ministério da Educação, dando a oportunidade às suas comunidades educativas para voltar a debater a temática, que já debateram no passado, já tomamos algumas decisões. O que é certo é que, até este momento, 2% das escolas aderiram à proibição do telemóvel, 98%, até ao momento, não aderiram", refere.
Falta de professores: "Não é com aspirinas que o problema se vai resolver"
Manuel Pereira, presidente da Associação de Diretores Escolares, também em declarações no Fórum TSF, entende que o ano letivo não começou pior (comparando com outros anos), mas destaca que continuam a faltar professores.
"É preciso fazer com que esta carreira seja uma carreira estimulante para que os jovens, à entrada na universidade, possam fazer a opção de quererem ser professores. A verdade é que neste momento isso não está a acontecer. Não obstante, ao final deste ano, serão mais de 4000 professores que vão sair para aposentação, não obstante os muitos milhares que se aposentaram nos últimos 5/6 anos e os muitos milhares que se vão aposentar nos próximos anos. A situação é problemática e não é com aspirinas que o problema se vai resolver", diz.
Ao contrário da opinião dos diretores escolares, a presidente da Confederação das Associações de Pais (Confap), Mariana Carvalho, afirma que as aulas estão a começar num ambiente mais sereno.
"Está a ser um ano mais calmo, porque as conversações entre o Governo e os vários sindicatos têm levado a uma harmonia nas escolas. Ainda assim, sabemos que, como todos os inícios de anos letivos, não se conhece exatamente quais são os números relativamente à falta de professores, que é uma das questões que estão no topo das nossas preocupações e que também sabemos que não é de fácil resolução. Não conhecemos ainda os dados relativamente aos efeitos da diminuição da falta de professores com estas medidas anunciadas pelo Governo e os números são muito voláteis", explica.
A presidente da Confap defende ainda a necessidade de reforçar a presença de psicólogos nas escolas: "Temos de ter equipas multidisciplinares nas escolas, nos agrupamentos, junto da comunidade educativa, para sensibilizar, alertar e perceber algumas situações de alerta. A Confap tem vindo a pedir encarecidamente que se criem gabinetes de apoio à comunidade educativa, com equipas multidisciplinares, incluindo enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, psicoterapeutas, até pessoas ligadas também às questões jurídicas."
Também ouvido no Fórum TSF, o bastonário da Ordem dos Psicólogos concorda com o reforço destes profissionais nas escolas.
"Nós passámos de 700/800 psicólogos para perto de 1800 psicólogos em meia dúzia de anos e isso é muito significativo num país como o nosso. A verdade também é que passamos por uma pandemia e, ao longo de muitos anos, agravaram-se muitos problemas. Estamos perante desafios completamente diferentes daqueles que existiam há seis anos, particularmente naqueles que afetam a saúde mental dos nossos mais jovens. A comunidade educativa está sob uma enorme pressão e têm-se degradado os ambientes escolares em certos aspetos, nomeadamente no que diz respeito à saúde mental e de outros atores da comunidade educativa, como os professores. Essa é uma questão que deveria também merecer uma resposta reforçada, particularmente quando o Serviço Nacional de Saúde tem demorado muito mais a investir nesta área", sublinha.
