Assinala-se este domingo uma década de um dos episódios mais caricatos da história recente da política portuguesa.
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Corria o dia de 2 de julho de 2013 e pouco faltava para as 16h30 quando chega a notícia que ia deixar o país em alvoroço.
"Acabamos de receber um e-mail com o comunicado de Paulo Portas onde diz: 'Apresentei hoje de manhã a minha demissão ao Governo e ao primeiro-ministro. Com a apresentação de um pedido de demissão que é irrevogável obedeço à minha consciência e mais não posso fazer'", escreveu na altura, Paulo Portas.
O então ministro de Estado dos Negócios Estrangeiros, do Governo PSD/CDS, revelava, numa carta, que ia sair do Governo e que não havia volta a dar. O motivo? A escolha de Maria Luís Albuquerque para suceder, na pasta das Finanças, a Vítor Gaspar, que se tinha demitido na véspera, alegando dificuldades para fechar a avaliação da troika e, sem o nomear, dando a entender que Paulo Portas era o motivo.
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"Entendia que o Governo devia ter uma componente económica mais forte e as coisas aconteceram de uma maneira que me obrigava a fazer o que tive de fazer", justificou.
O ministro queria uma linha política que não assentasse tanto no aumento de impostos e olhava para Maria Luís Albuquerque como um "Gaspar de saias". O então primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, não o ouviu e, de surpresa, Portas decidiu sair.
"O país foi surpreendido pelo pedido de demissão de Paulo Portas, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros e presidente do CDS. Eu próprio tenho de manifestar a minha surpresa", confessou Passos Coelho.
Apesar de tudo, Passos Coelho não aceitava e recusava a queda do Governo.
"Pelo facto de o ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros ser presidente de um dos partidos que apoia o Governo, seria precipitado aceitar esse pedido de demissão. Também eu serei claro: não me demito, não abandono o meu país", sublinhou o então primeiro-ministro.
Maria Luís Albuquerque tomou, nessa tarde, posse em Belém. Uma cerimónia à qual os ministros que eram do CDS não faltaram. O Presidente da República, Cavaco Silva, viu o caso mal parado e engendrou uma estratégia para um "compromisso de salvação nacional", chamando até o então líder do PS, António José Seguro, para conversações com vista a um futuro do qual os socialistas também fizessem parte. Mas Passos Coelho não desistia de salvar o casamento da direita.
"Procurarei, junto do CDS, clarificar e garantir todas as condições de estabilidade para o Governo e para o país, para prosseguirmos a estratégia de superação de crise nacional, agarrarmos um novo ciclo de prosperidade que os portugueses merecem e darmos sentido ao grande esforço e sacrifício de todos", explicou.
Conversas que acabariam por ter um final feliz para a coligação PSD/CDS. Paulo Portas acaba por revogar a demissão irrevogável e, depois do abalo do episódio, regressa, com mais poder, ao Governo.
"O acordo reúne as condições políticas necessárias para garantir a estabilidade até ao fim da legislatura e assegurar o cumprimento dos compromissos externos de Portugal. Reforça também a valorização da política económica, a prioridade do crescimento e do emprego e tem consequências na composição do Governo", acrescentou Passos Coelho.
O primeiro-ministro aceita-o de volta e Paulo Portas torna-se vice-primeiro-ministro.