Diretor da PJ preocupado com aumento de violência de traficantes contra autoridades

O diretor Nacional da PJ, Luís Neves
Filipe Amorim/Lusa
Luís Neves apela a "lealdade institucional" por parte de outras forças policiais
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O diretor nacional da PJ mostrou-se hoje preocupado com o aumento da violência dos traficantes de droga contra as autoridades, notando que as redes de tráfico por via marítima já usam armas de calibre de guerra.
"As organizações criminosas estão cada vez mais sofisticadas e, não raras vezes, reativas à violência, à atuação das autoridades. A Guarda Nacional Republicana, nos últimos dois meses, foi confrontada com a utilização de armas de calibre de guerra, com AK 47", sublinhou Luís Neves.
Aquele responsável, que falava na abertura da conferência "Tráfico de Estupefacientes por Via Marítima - As Narcolanchas", aproveitou a ocasião para homenagear o militar da GNR morto no final de outubro em serviço no Algarve, não por arma de fogo, mas após uma colisão com uma lancha rápida no Rio Guadiana.
De acordo com o diretor nacional da PJ, durante muitos anos, os elementos destas redes só utilizavam armas de fogo contra os grupos rivais "que conseguiam ficar na posse da droga uns dos outros", mas, atualmente, "perdeu-se o respeito pela autoridade" e os próprios agentes de segurança são também vítimas.
Segundo Luís Neves, do ponto de vista operacional, estas organizações utilizam embarcações aparentemente legítimas - e também submergíveis e semi-submergíveis -, apoiadas em alto mar por lanchas de grande velocidade que fazem depois o desembarque no continente.
"Há muito pouco tempo, com o apoio da Marinha e com o apoio da Força Aérea, a quase 300 a 400 milhas, conseguimos localizar uma destas embarcações e apreender quase duas toneladas de cocaína, sendo certo que nas suas redondezas já existiam várias lanchas rápidas", exemplificou.
De acordo com o responsável, o cenário agora é diferente de há uns anos e as lanchas já não constituem um meio de transporte do norte de África para a Europa: "Já vão a centenas de milhas com combustível, com jerricãs, levam para lá combustível e trazem, para o território europeu, droga", indicou.
Luís Neves referiu, ainda, que atualmente existe uma "macro máfia" no centro e norte da Europa e organizações sediadas sobretudo na Suécia que "aportam elevados níveis de crime", na sua maioria, de criminalidade violenta.
"[...] Falamos de homicídios, de raptos, de utilização de armas de calibre de guerra. Nos últimos anos temos vários homicídios consumados e tentados em Portugal, cometidos por sicários vindos do norte da Europa para aqui fazerem ajustes de contas porque a droga não foi entregue ao seu proprietário".
Relativamente a apreensões de droga, Luís Neves indicou que no ano passado foram apreendidas 23 toneladas de cocaína e sete toneladas de haxixe, para além de centenas de milhares de peças de "ectasy".
"Até ao momento, foram apreendidas, este ano, 14 toneladas de cocaína e centenas de indivíduos presos com património e vantagens de lucro apreendidas, através do Gabinete de Recuperação de Ativos", referiu, acrescentando que em 2024 foram apreendidos mais de sete milhões e meio de euros destes valores.
Diretor da PJ apela a "lealdade institucional" por parte de outras forças policiais
Na abertura deste seminário, Luis Neves considerou que só com a colaboração de todas as polícias é possível combater a criminalidade cada vez mais violenta, ligada ao tráfico de droga.
Em declarações que foram lidas como um "recado" dirigido à Polícia de Segurança Pública, o diretor nacional da Polícia Judiciária afirmou que "a colaboração e partilha da informação na atividade de investigar deve estar sempre subjacente a dois pilares: a qualidade da informação e a solidariedade da sua participação e da sua permuta." Em outubro a PSP apreendeu 6 toneladas de haxixe, duas lanchas rápidas e armas de fogo, numa operação à revelia da Polícia Judiciária.
É a PJ que, por lei, tem que ser obrigatoriamente avisada de qualquer ação levada a cabo por um dos outros órgãos de polícia criminal. É o que está previsto num decreto-lei de 1995 que atribui à Unidade Nacional de Combate ao Tráfico de Estupefacientes da PJ o papel de "centralização informativa e de coordenação operacional" do combate ao tráfico de droga. Também de acordo com a Lei de Organização da Investigação Criminal, a PJ tem competência reservada para investigar o tráfico de droga.
"A nossa relação, seja ela interna ou internacional, deve-se pautar sempre pelos princípios da solidariedade, do apoio e suporte, da confiança e da lealdade institucional.", considerou o dirigente da PJ.
Talvez para enfatizar o papel central da PJ e da necessidade de colaboração e de entreajuda entre forças policiais, Luis Neves relatou um episódio ocorrido há algum tempo. "Durante muitos anos, nunca o dissemos, numa grande organização da Polícia de Segurança Pública, quando da última cimeira da NATO, organizada em Portugal, foi (...) na cooperação policial internacional e num instrumento do DICIAP, do Ministério Público, que uma ação encoberta evitou que camaradas da Polícia de Segurança Pública pudessem ter sido mortos por um grupo anarquista", revelou. "Nunca falámos sobre este assunto e outros, mas gostaria que em momentos próprios não se esquecessem que somos complementares uns dos outros e é isso que o cidadão espera de todos nós", concluiu.
A conferência que hoje decorre na Diretoria do Sul da PJ, em Faro, conta com a participação de diversas entidades nacionais e internacionais, tendo como objetivo a definição de estratégias para uma atuação mais eficaz das autoridades na prevenção e repressão do fenómeno.
