"É uma loucura." Usar sumários para apurar número de alunos sem aulas é "tarefa hercúlea e inglória"
Em declarações à TSF, o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares lamenta que esteja a ser dada prioridade a uma questão que não resolve o "problema de raiz, que é a falta de professores"
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O presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares afirma que é uma loucura usar os sumários das aulas para apurar o número exato de alunos sem aulas. Manuel Pereira defende que esta é uma "tarefa hercúlea e inglória" que não ataca o "problema de raiz".
Em causa está a recomendação da KPMG, que sugere a implementação de um sistema que “permita recolher de forma tempestiva e centralizada, diretamente das escolas”, informação sobre a evolução do número de alunos sem aulas, através, por exemplo, “da recolha e compilação dos sumários das aulas” existentes em suporte eletrónico. Segundo o Ministério da Educação, Ciência e Inovação, esta nova solução será implementada a partir do próximo ano letivo, com o objetivo de se conseguir “monitorizar com rigor, credibilidade e transparência o número de alunos sem aulas, a cada disciplina, em diferentes momentos e ao longo do ano letivo”.
Em declarações à TSF, o dirigente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares nota que existem "mais de 50 mil turmas", com uma média de "seis/sete aulas por dia". Isto significa que existem, "mais de meio milhão de sumários diários". E, apesar de reconhecer que é possível extrair estes dados informaticamente, lamenta esteja a ser dada prioridade a uma questão que não resolve o "problema de raiz".
"Isto é uma loucura. (...) O sistema de sumários não é um sistema centralizado. Cada escola usa a sua plataforma e, portanto, o Ministério, se tiver acesso às plataformas de cada escola, em termos informáticos, é possível saber quantos alunos estão sem aulas em cada dia, porque os números mudam todos os dias", sublinha, argumentando, ainda assim, que esta é uma "tarefa hercúlea e inglória".
Manuel Pereira defende, assim, que esta "energia" devia ser aplicada para resolver "um problema de raiz, que é a falta de professores".
O Movimento Missão Escola Pública entende, por sua vez, que o recurso aos sumários é uma possibilidade: "Sempre defendemos a centralização no que diz respeito quer a dados relativos a alunos, quer a professores, quer a assistentes operacionais. É uma solução que será para aplicar."
À TSF, a porta-voz do grupo, Cristina Mota, assinala, contudo, que, tendo por base os dados atualmente facultados pelas escolas, já era possível ter informação sobre os alunos sem aulas e, por isso, era possível que o país já estivesse a "encarar" o problema da falta de professores.
"Se o Ministério da Educação entender por bem e tiver muita dificuldade, até nisso a Escola Pública se disponibiliza para ajudar nessa tarefa, não queremos honorários, à semelhança dos 70 mil euros que, entretanto, já foram gastos. Mas queremos medidas que venham ao encontro da resolução dos problemas que encontramos", sugere.
Atualmente, para se tentar chegar ao número de alunos sem aulas, os serviços baseiam-se no "sistema de identificação de necessidade de professores e alocação dos mesmos", que pode ir sendo corrigindo ou ajustado, mas estas alterações são feitas "maioritariamente por contactos telefónicos", sem a necessidade de serem validadas pelas escolas.
A falta de professores nas escolas é um problema que tem vindo a agravar-se nos últimos anos devido ao envelhecimento da classe docente, tendo a equipa de Fernando Alexandre anunciado um pacote de medidas que tinha como objetivo reduzir em 90% os alunos sem aulas até ao natal de 2024.
Em novembro do ano passado, Fernando Alexandre anunciou que eram pouco mais de dois mil os estudantes sem aulas a pelo menos uma disciplina desde o início do ano, o que significava menos 89% do que em idêntico período do ano anterior, ou seja, muito perto do objetivo proposto pelo Governo.
No entanto, alguns dias depois, o ministro reconheceu, em declarações à TSF, que os números não eram fiáveis, tendo anunciado uma auditoria para perceber afinal quantos alunos tinham ficado sem aulas, a que disciplinas e durante quanto tempo.
Este fim de semana, a maior estrutura sindical representativa de professores, a Fenprof, apresentou uma estimativa sobre o impacto do problema no atual ano letivo, contabilizando "quase 1,4 milhões de ocorrências de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina", números que incluem duplicações de estudantes que ficaram sem vários professores ou em vários momentos.