"Falta de recursos." Não há "devida atenção aos sistemas de segurança" nas prisões e "quase nada que foi feito" desde a fuga de Vale de Judeus
O presidente do Observatório de Segurança Interna considera que as prisões portuguesas são "seguras", enquanto o homólogo do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo quer "um estudo aprofundado sobre as condições de segurança". O Sindicato dos Guardas Prisionais pede a valorização das carreiras
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Observatórios de Segurança Interna e de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo, bem como o Sindicato dos Guardas Prisionais consideram que há falta de recursos nos estabelecimentos prisionais, depois da fuga de dois reclusos de Alcoentre.
À TSF, Luís Fernandes, presidente do Observatório de Segurança Interna, considera que estes reclusos e os que fugiram da prisão de Vale de Judeus, em setembro do ano passado, aproveitaram as fragilidades do sistema.
"Há de facto uma falta de recursos. Consegue-se entender que esta falta de recursos permite explorar aqui fragilidades e, nesse sentido, a única coisa que o observatório pode solicitar à tutela é que rapidamente faça algo para melhorar este assunto. Há sempre uma falta técnica, porque se repararmos temos de ter a perceção de que o imobiliário é antigo. Efetivamente, tem vindo a ser recondicionado, mas há determinadas circunstâncias que impedem que o investimento que é feito seja feito na sua totalidade, porque existem demasiados estabelecimentos prisionais, existe uma população prisional relativamente elevada", considera.
Para o presidente do Observatório de Segurança Interna, os estabelecimentos prisionais são seguros: "As prisões portuguesas são relativamente seguras e, quanto a isso, podemos afirmar categoricamente. Se reparar, até agora não houve nenhum motim grave, não há mortes em excesso. Efetivamente há determinadas coisas que ocorrem, mas esta permeabilidade que existe no sistema consegue-se identificar face à fragilidade humana e face também à fragilidade e debilidade do investimento e do próprio imobiliário do sistema."
Na mesma linha de pensamento, o presidente do Observatório de Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo, Francisco Rodrigues, defende que o sistema prisional português tem falhas e defende que se realize um estudo aprofundado.
"Sempre que há uma fuga, é porque há alguma coisa que corre mal, é porque, porventura, tudo aquilo que está implementado, quer do ponto de vista físico, é do ponto de vista humano, para a guarda dos detidos não funcionou. Na minha opinião, o que está a falhar é que não se está a dar a devida atenção aos sistemas de segurança que devem estar implementados nas prisões portuguesas. Naturalmente, estou a generalizar. Para que haja uma fuga, significa que houve primeiro a vontade da fuga, que houve uma preparação da fuga e depois que houve os meios necessários para a fuga e depois que os sistemas que deveriam estar implementados ou que estão implementados, porque também podem estar implementados e falhar, não conseguiram evitar a fuga. Portanto, eu acho é que havia necessidade de fazer um estudo um pouco mais aprofundado sobre as condições de segurança das prisões portuguesas", afirma.
Pelo lado do Sindicato dos Guardas Prisionais, Frederico Morais lamenta que nada tenha sido feito desde a fuga de cinco reclusos do estabelecimento prisional de Vale de Judeus.
"Olho para uma falência do sistema prisional que nós temos vindo a alertar já há algum tempo, porque nós dissemos que desde setembro quase nada tinha sido feito e isto são consequências do quase nada que foi feito. Ou seja, nós não aprendemos nada com a fuga de vales de Deus. Nós, quem dirige os serviços, porque não se tomaram medidas, as medidas que se deviam ter tomado não se tomaram e agora temos mais uma fuga, mais uma fuga caricata em Portugal. E é mesmo por causa disso, por não se terem tomado medidas sérias, como a gente pediu", acusa.
Assim, os reclusos sabem aproveitar as falhas: "O simples exemplo de fechar mais os reclusos do que o que estão. Começar a ter medidas mais rigorosas a nível de segurança, porque na zona da torre por onde eles fugiram ontem, no domingo tinha lá um guarda porque havia visitas. E então como há visitas, reforça-se a segurança periférica. Ontem, para quem dirige o estabelecimento prisional, era um dia normal, não precisávamos de ter a periferia ativa. Ao não ter a periferia ativa, os reclusos sabem disso, eles observam, não havia guardas e eles aproveitaram para fugir por aquela zona."
O sindicalista acredita ainda que é preciso valorizar a carreira de guarda prisional de forma a atrair novos profissionais e a motivar os que já existem.
"É necessário primeiro valorizar a carreira, porque nós temos um concurso a decorrer para 255. Já só temos 68 candidatos e ainda faltam os testes médicos, ou seja, nem um terço das vagas vão ser preenchidas. Não são preenchidas, mas isto é um problema geral de todas as forças de segurança. Falta de atratividade na carreira que leva a isto, porque se tivéssemos uma carreira atrativa, as coisas eram diferentes. E depois precisamos de motivar aqueles que estão cá", explica.
E nota diferenças relativamente a outras forças de segurança: "Nós precisamos de motivar quem está cá, porque eu vou dar um exemplo muito simples: a guarda prisional e a PSP são equiparados a nível remuneratório, mas a nível de carreiras não são. Um agente da PSP ao fim de cinco anos e oito meses é promovido agente principal. Na guarda prisional, eu tenho 23 anos de serviço e ainda não sou guarda principal. Isto também é motivação. Nós temos de motivar também quem cá está para, porque as pessoas estão saturadas, estão cansadas. Temos guardas prisionais a entrar em burnout devido excesso de trabalho. É isso que nós pedimos."
Os dois reclusos que se evadiram na segunda-feira do Estabelecimento Prisional de Alcoentre, no concelho de Azambuja, distrito de Lisboa, foram capturados esta terça-feira de manhã, pelas 06h40, adianta a GNR em comunicado.
Em declarações à TSF, o capitão João Costa, do Destacamento Territorial de Alenquer, explica que a captura aconteceu após uma denúncia feita por volta das 03h00. "Andámos a rondar, tivemos muitos meios no local, tivemos os meios de vigilância aérea, não conseguimos dar com nada. Quando nós já estávamos a dar por determinadas as buscas, a patrulha de ocorrências começou a seguir algumas pistas que conseguiram encontrar: umas pegadas no chão, um barraco com alguns vestígios de que tinha lá estado pessoal. Entretanto, os militares continuaram a bater a zona e depararam-se com eles", explica.
