Ferro Rodrigues fez mesmo questão de salientar que Vítor Constâncio, antigo ministro das Finanças de Mário Soares e ex-vice-presidente do Banco Central Europeu, é uma das pessoas referência da sua geração.
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O presidente da Assembleia da República insurge-se contra a tentativa de linchamento do ex-governador do Banco de Portugal Vítor Constâncio e recusa a crucificação de pessoas que tiveram responsabilidades na banca no período de crise financeira.
Ferro Rodrigues, em entrevista à agência Lusa e questionado sobre os resultados alcançados nesta legislatura com as comissões parlamentares de inquérito à Caixa Geral de Depósitos (CGD), afirmou: "Nesta questão, relativizo muito a importância dos reguladores nacionais. Não me peçam para alinhar em nenhum linchamento de pessoas como Vítor Constâncio, que eu considero muito."
Também não alinho numa versão que me parece excessivamente divulgada de que não houve crise internacional nenhuma, como se não tivesse mesmo existido.
Neste ponto, Ferro Rodrigues fez mesmo questão de salientar que Vítor Constâncio, antigo ministro das Finanças de Mário Soares e ex-vice-presidente do Banco Central Europeu, é uma das pessoas referência da sua geração.
"Acho que houve a tentativa - não sei se por parte de quem, porque depois isso no relatório final não transparece - de colocar aquilo que se chamava antigamente como inimigos do povo alguns empresários, capitalistas, gestores e governadores do Banco Portugal", declarou o presidente da Assembleia da República.
Ainda a propósito do apuramento de responsabilidades políticas e criminais no setor da banca, o antigo líder do PS entre 2002 e 2004 acentuou que não alinha "em julgamentos populares seja contra quem for".
O presidente da Assembleia da República deixou então nova advertência. "Também devo dizer que não alinho em nenhuma crucificação de pessoas que passaram por ali e tiveram maior exposição, ou maior mediatismo, na sua participação na comissão de inquérito. Também não alinho numa versão que me parece excessivamente divulgada de que não houve crise internacional nenhuma, como se não tivesse mesmo existido. Houve uma crise brutal que teve, evidentemente, um impacto absolutamente trágico nos resultados em geral dos bancos e da banca portuguesa, incluindo o banco público", frisou Ferro Rodrigues.
As reformas estruturais não são uma coisa que se decreta e que são postas em ação no dia a seguir. São formas de estar e de exercer o poder político que tem continuidade e que têm repercussão durante muitos anos.
Quanto às dúvidas que levantou a propósito do objeto da comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos e que motivou protestos da oposição, Ferro Rodrigues alegou que a sua ação se destinou "pura e simplesmente respeitar a Constituição e o regimento" da Assembleia da República.
"Depois foi alterado o objeto do inquérito e tudo seguiu em frente - e ainda bem que seguiu em frente com o apuramento da verdade política. Vamos ver o que isso significa em termos de em termos de outras verdades", disse.
Interrogado sobre eventuais consequências que poderão existir no plano judicial, Ferro Rodrigues referiu apenas que "os resultados do relatório foram mandados para a Procuradoria-Geral da República".
Ainda no plano económico e financeiro, o antigo líder socialista rejeitou a ideia de que em Portugal, nos últimos quatro anos, não houve qualquer reforma estrutural para responder aos problemas do país.
"Há um problema que é a definição de reforma estrutural. Se as reformas estruturais forem aquilo que já vem do consenso de Washington, do final do século passado, em que as reformas estruturais são tirar direitos aos trabalhadores, liberalizar e flexibilizar o trabalho, são pôr em causa tudo o que tenha que ver com mínima proteção ao ambiente, então é evidente que não houve reformas estruturais - e ainda bem", alegou.
Ferro Rodrigues considerou depois que, na presente legislatura, "foram dados passos muito importantes para a melhoria da sustentabilidade dos vários sistemas sociais em Portugal - isso é o fundamental das reformas estruturais".
"As reformas estruturais não são uma coisa que se decreta e que são postas em ação no dia a seguir. São formas de estar e de exercer o poder político que tem continuidade e que têm repercussão durante muitos anos", contrapôs o presidente da Assembleia da República.
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PS deve ter panóplia de alternativas da direita à esquerda para governar
O presidente da Assembleia da República considera que o PS não deve colocar a questão da maioria absoluta como tema central e espera que disponha de uma "panóplia de alternativas" da esquerda à direita para governar.
Nesta entrevista à agência Lusa, Ferro Rodrigues defende a importância para o sistema democrático resultante da atual solução política, com um Governo minoritário socialista suportado no parlamento pelo Bloco de Esquerda, PCP e PEV, mas não manifesta qualquer certeza sobre a possibilidade de esta mesma solução se poder repetir na próxima legislatura, fazendo tudo depender dos resultados das próximas eleições.
Acho que o PS não deve colocar essa questão [da maioria absoluta] como central na campanha, mas também não pode levar a que os eleitores do PS, que tenham gostado muito desta solução política, como é o meu caso, façam apelos para que não se vote no partido
"O PS possivelmente estará em condições de ter uma panóplia de alternativas à sua disposição para poder governar, continuando a sua governação, como até agora, em diálogo e em trabalho conjunto. Os estudos de opinião, como agora se diz em linguagem politicamente correta, permitem antever que o PS poderá escolher parceiros, ou o parceiro, desde a direita até à esquerda. Isso é bom para o país e bom para o primeiro-ministro", António Costa, declarou.
Questionado sobre a possibilidade de o PS alcançar uma vitória com maioria absoluta nas próximas eleições legislativas, Ferro Rodrigues recusou-se a fazer o papel de analista político.
"Aquilo que sei é que todos os partidos, em última análise, vão querer ter maioria absoluta. O que seria anormal e um absurdo era os dirigentes do PS pedirem aos eleitores para não votarem no PS para não terem maioria absoluta", observou.
No entanto, no plano estratégico, o antigo líder socialista e ministro dos dois governos liderados por António Guterres deixou um recado à direção do seu partido.
Quebrou-se o tabu de que era impossível um entendimento do PS com outras forças de esquerda para durar uma legislatura. Isso também significa que alguns partidos deixaram de se considerar a si próprios como partidos meramente de protesto (...)
"Acho que o PS não deve colocar essa questão [da maioria absoluta] como central na campanha, mas também não pode levar a que os eleitores do PS, que tenham gostado muito desta solução política, como é o meu caso, façam apelos para que não se vote no partido. Isso levado até o infinito e ao absurdo levaria a que ninguém votasse no PS", apontou.
Neste tema, o presidente da Assembleia da República sustentou que "a centralidade do parlamento", que considerou ter-se verificado a partir desta legislatura, teve uma consequência muito concreta, porque "significa que as maiorias, ou a maioria que se estabeleça na Assembleia da República, é aquela que é determinante para a formação de um próximo Governo".
O antigo líder do PS entre 2002 e 2004 advogou que, nesta legislatura, se quebrou "um tabu, segundo o qual só havia possibilidade de soluções ou de maioria absoluta de um partido ou de soluções que passassem por entendimentos com o centro e com a direita".
"Quebrou-se o tabu de que era impossível um entendimento do PS com outras forças de esquerda para durar uma legislatura. Isso também significa que alguns partidos deixaram de se considerar a si próprios como partidos meramente de protesto e passaram a considerar-se a si próprios como partidos que podem ter um protagonismo de Governo", referiu.
E, numa alusão indireta ao Bloco de Esquerda, PCP e PEV, Ferro Rodrigues colocou mesmo uma hipótese de evolução do sistema político português a médio ou longo prazo: "E imaginar daqui a 20 ou 30 anos que esses partidos podem estar com outros em vez de aliados com o PS", sugeriu.
"Portanto, o que se passou nesta legislatura foi uma novidade estratégica e estrutural no funcionamento do sistema político português, que permite atualmente muito mais soluções", insistiu.
Interrogado sobre a possibilidade de a presente solução de Governo se repetir nos mesmos moldes na próxima legislatura, o presidente da Assembleia da República deu uma resposta prudente.
"O que vai acontecer a partir de 6 de outubro só os eleitores é que podem determinar. Como é óbvio, todos os partidos querem ter mais votos do que tiveram. Querem ter o máximo de votos que for possível. Portanto, o que vai acontecer vai depender dos eleitores portugueses e a composição da Assembleia da República vai refletir esse voto dos portugueses", justificou.