Filhos de quem? De todos nós...
Os vestígios de vidas entregues à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa até ao século XIX estão agora em exposição. Estão lá também os motivos para uma candidatura à Unesco como Registo da Memória do Mundo
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Durante séculos, milhares de famílias separaram-se na roda da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa. Os recém-nascidos chegavam acompanhados de "sinais", vestígios da ligação a uma família que esperava poder um dia voltar e recuperar o filho entregue aos cuidados da instituição.
Acontecia a um ritmo que chegou a 2600 crianças por ano. Não só eram acolhidas, batizadas, criadas e formadas numa profissão como enchiam os livros de registo de "Fêmeas", Varões", "Pretos e Pardos".
Nesses registos, que se guardaram até hoje nos arquivos da Santa Casa, pode ainda seguir-se o fio emaranhado de muitas vidas. Algumas (poucas) que foram recuperadas pela mãe ou pelo pai; muitas (a maioria) que acabavam por morrer de tanta coisa (quase tudo) o que matava os bebés naqueles tempos.
São alguns desenhos, cartas, fotos ou simples medalhas, peças de vestuário, bilhetinhos, os inúmeros sinais, guardados como marca única de cada criança, que estão agora à luz do dia no Museu de São Roque, junto à Igreja do mesmo santo, em Lisboa.

"Filhos de todos... filhos de quem?" é a exposição que até 29 de março resgata a memória dessas pessoas e dessa sociedade que tem, afinal, ainda tantos pontos de contacto com a nossa, no que diz respeito a famílias que, por algum motivo - sempre forte e raras vezes pronunciável - deixam um filho "exposto", na esperança de que, na roda da sorte, alguém o salve e faça feliz.

Com a ajuda de Francisco Manoel, diretor do arquivo da SCML e Teresa Nicolau, diretora da Cultura, a TSF entrou nesta máquina do tempo. Mas, atenção, esta reportagem não dispensa a visita da exposição.
