Acordo para travar rota ilegal para o Algarve quer levar o Instituto de Emprego a selecionar trabalhadores num dos principais vizinhos de Portugal.
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O acordo com Marrocos sobre imigração legal para Portugal ainda está a ser negociado, mas aquilo que está em discussão entre os dois Estados é que o Governo, através do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), recrute e selecione os trabalhadores marroquinos.
A revelação está num parecer recente da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) chamada a pronunciar-se, pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre os problemas de proteção de dados pessoais numa contraproposta ao projeto de acordo sobre a permanência em Portugal de cidadãos marroquinos com o objetivo de prestação de trabalho.
Recorde-se que a negociação de um acordo foi anunciada pelo Executivo depois de há cerca de um ano terem começado a surgir marroquinos a tentarem desembarcar, ilegalmente, na costa do Algarve, levantando fortes suspeitas de uma nova rota de migração ilegal.
O documento da CNPD revela que o projeto de acordo prevê que o recrutamento dos trabalhadores marroquinos seja "realizado conjuntamente pelo Governo português e pelo Governo de Marrocos".
Os dois governos irão designar para a execução desse processo de recrutamento e seleção de trabalhadores, bem como comunicação com os empregadores, o português IEFP e a marroquina Agência de Promoção do Emprego e Competências.
O acordo prevê a transferência de dados pessoais dos trabalhadores marroquinos para Portugal e dos dados de empregadores portugueses para Marrocos.
Contactado pela TSF, o Ministério dos Negócios Estrangeiros apenas diz que "as negociações prosseguem tendo em vista a conclusão do acordo".
"É o modelo espanhol"
Raúl Braga Pires, investigador do mundo árabe que durante vários anos deu aulas em Marrocos, reage dizendo que aquilo que está descrito no acordo revela que Portugal pretende seguir o modelo espanhol de recrutamento de trabalhadores marroquinos.
Um modelo que, como defende, tem mitigado a imigração ilegal para Espanha, mas, como é evidente, está muito longe de resolver o problema como se vê pelos milhares que continuam a chegar ilegalmente às costas espanholas.
Raúl Braga Pires acrescenta que tem dúvidas que os empresários portugueses se interessem pelas fracas qualificações da maioria dos marroquinos que pretendem migrar para a Europa, acrescentando que os próprios marroquinos olham para Portugal sobretudo como uma porta de entrada para a União Europeia com o objetivo de chegarem a países com melhores ordenados e onde têm muitos familiares - Espanha, França, Holanda ou Bélgica.
O presidente da Associação Solidariedade Imigrante, Timóteo Macedo, está convencido que este acordo surge apenas como uma "fuga para a frente" do Governo português para mostrar que está a fazer alguma coisa depois das primeiras notícias de uma nova rota de migração ilegal para o Algarve.
O representante da associação que ajuda muitos imigrantes sem documentos sublinha que há centenas ou milhares de estrangeiros já hoje em Portugal à espera da legalização, não sendo preciso ir buscar mais trabalhadores a Marrocos.
Para Timóteo Macedo todos os acordos deste tipo feitos no passado falharam e não será este entre Portugal e Marrocos que terá um destino diferente.