Governo só apoiou um décimo das segundas habitações atingidas pelas chamas em 2017
No total, os grandes incêndios de 2017 destruíram mais de mil casas, a maioria na região Centro, mas os números fornecidos à TSF revelam que a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro só recebeu candidaturas para reconstruir 90 habitações.
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Apenas quatro das cerca de 30 autarquias afetadas pelos grandes incêndios de 2017 concorreram ao programa do Governo para apoiar a reconstrução de segundas habitações.
Pampilhosa da Serra, Góis, Castanheira de Pera e Pedrógão Grande: foram as únicas autarquias que entregaram candidaturas à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Centro para ter acesso ao empréstimo do Fundo de Apoio Municipal (FAM) que permite comparticipar parte das obras de reconstrução das segundas habitações afetadas pelos fogos de 2017.
Depois das chamas, o primeiro-ministro tinha salientado a importância destas casas para manter vivo o Interior do país, mas vários autarcas admitem que muitas habitações vão ficar por recuperar, por falta de dinheiro dos proprietários, tendo em conta o modelo de apoio disponibilizado pelo Governo.
Prazo terminou em abril
À TSF a CCDR do Centro confirmou que só deu luz verde à reconstrução de 90 destas casas, embora tenham ardido mais de mil em 2017. Na prática, apenas estas quatro câmaras aproveitaram o mecanismo de apoio criado pelo Governo através do recurso ao FAM, sendo o empréstimo contraído independente da dívida corrente dos municípios.
Apesar do apoio das câmaras (percentagem de comparticipação e teto máximo admitido) variar consoante os regulamentos municipais previamente elaborados, cerca de 50% da despesa, em média, tem de ser paga pelos donos das casas. Tendo em conta o modelo de apoio disponibilizado pelo Governo, vários autarcas ouvidos pela TSF admitem que muitas habitações vão ficar por recuperar por falta de dinheiro dos proprietários.
Proprietários sem dinheiro
Em Santa Comba Dão arderam 140 casas, mas a câmara só recebeu seis candidaturas. O presidente Leonel Gouveia lembra que muitos proprietários não têm hipótese nem interesse em investir.
No caso das candidaturas que recebeu, a autarquia deixou passar o prazo para recorrer ao FAM, devido a problemas financeiros, mas espera que a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro e o Governo reconsiderem: "Estamos a pensar que essa prorrogação nos vai ser concedida, estivemos num processo de recuperação financeira e só tivemos condições de suportar mais esse empréstimo no final do primeiro trimestre".
Prazo adiado três vezes
Também a câmara de Tondela, que recebeu 30 candidaturas num total de 150 casas afetadas, deixou passar a data. Apesar de o prazo oficial ter terminado a 30 de abril e ter sido alargado três vezes, o autarca José António Jesus diz que foi difícil cumprir as metas devido a questões burocráticas.
"O que tem vindo a atrasar o processo é a circunstância de as famílias não terem ainda os projetos de reabilitação das suas habitações, noutros casos as pessoas tiveram de juntar também a demonstração dos consumos de energia". O autarca espera que, apesar de o prazo ter sido já ultrapassado, os processos sejam ainda admitidos.
Condições pouco vantajosas
Ao contrário de outras autarquias, Oliveira do Hospital não se candidatou ao empréstimo para comparticipar a reconstrução das segundas habitações. O Presidente Alexandrino Mendes diz que o orçamento municipal consegue suportar a despesa mas, caso precisasse, não teria recorrido porque o apoio do Governo tem poucas vantagens: "Nós não temos necessidade de ir ao FAM porque até teríamos hipótese de fazer endividamento com melhor taxa de juro na banca comercial."
Promessas para nada
Depois dos incêndios de 2017, o primeiro-ministro tinha salientado a importância das segundas habitações para manter vivo o Interior do país, tendo em conta os vínculos sociais e económicos ao território.
Quase dois anos depois, o autarca de Arganil, Luís Paulo Lopes, lamenta que o mecanismo de apoio criado pelo Governo tenha "empurrado" a despesa para cima das câmaras e dos proprietários.
O autarca diz mesmo que o Interior só fica a perder: "Tinha sido criada inicialmente pelo Governo uma expectativa de que haveria um apoio forte para a reconstrução das segundas habitações, mas isso não veio a confirmar-se. O que vai acontecer é que muitas pessoas que regressavam com regularidade a estes concelhos vão deixar de o fazer", antecipa Luís Paulo Lopes.