Grupo de cidadãos, que inclui ex-ministra da Justiça, vai apresentar queixa-crime contra Ventura e Pedro Pinto
"Atingiu-se um limite. Nenhum democrata pode deixar de se indignar com estas declarações. A minha consciência obriga-me a tomar uma atitude em relação a quem se aproveita deste clima para fazer apelos ao ódio e a mais violência", justifica Francisca Van Dunem
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Um grupo de cidadãos, entre os quais a ex-ministra da Justiça Francisca Van Dunem, vai apresentar uma queixa-crime contra André Ventura e Pedro Pinto, do Chega, por declarações relacionadas com a morte de Odair Moniz, baleado pela polícia.
Em causa estão declarações do líder parlamentar do Chega, Pedro Pinto, sobre os tumultos dos últimos dias relacionados com a morte de Odair Moniz, baleado pela polícia na Amadora, afirmando que se as forças de segurança "disparassem mais a matar, o país estava mais na ordem".
Também o presidente do Chega disse sobre o agente da PSP que baleou Odair Moniz: "Nós não devíamos constituir este homem arguido; nós devíamos agradecer a este polícia o trabalho que fez. Nós devíamos condecorá-lo e não constituí-lo arguido, ameaçar com processos ou ameaçar prendê-lo."
Segundo o projeto de queixa-crime, a que o Diário de Notícias teve acesso, os principais ilícitos são: "instigação à prática de crime", "apologia da prática de crime" e "incitamento à desobediência coletiva".
Um dos subscritores desta queixa-crime é o comentador Pedro Marques Lopes, que considera que estas afirmações são graves e não respeitam a lei. "Passou-se um limite e o limite é o respeito da lei. O deputado Pedro Pinto e o deputado de André Ventura cometeram crimes graves", diz à TSF, acrescentando: "Não é pelo facto de serem dirigentes políticos que deixam de estar sob alçada da lei."
Pedro Marques Lopes questiona a legalidade do Chega e defende que o Tribunal Constitucional tem de estar atento à atuação do partido.
Quem também é subscritora é a ex-ministra da Justiça, ex-ministra da Administração Interna e ex-Procuradora-Geral da distrital de Lisboa Francisa Van Dunem, que, em declaração ao DN, disse que foi "atingido um limite".
"Atingiu-se um limite. Nenhum democrata pode deixar de se indignar com estas declarações. A minha consciência obriga-me a tomar uma atitude em relação a quem se aproveita deste clima para fazer apelos ao ódio e a mais violência. Vou subscrever a queixa, que espero que seja subscrita pelo maior número possível de pessoas"
Sobre as declarações de Pedro Pinto, é referido na proposta de queixa que está consubstanciando "a apologia de um crime".
"O suspeito Pedro Pinto incentivou - e sabe que o fez - que agentes das forças de segurança usassem, indevidamente, as armas que lhes são entregues pela República Portuguesa, em nome de todos os cidadãos, para matar outros concidadãos na via pública, através de execuções sumárias que são proibidas pela Constituição e por todos os textos internacionais de defesa dos direitos humanos", é referido no texto.
O documento citado pelo DN diz também que o "suspeito André Ventura conhece muito bem o regime jurídico do porte e uso de armas de fogo pelas forças de segurança, não só porque é doutorado em Direito, como porque é deputado, participando na tomada de decisão legislativa".
Refere igualmente que André Ventura "sabe que ao elogiar publicamente um ato policial que conduziu à morte de um cidadão (...) cria nas pessoas que não dispõem de conhecimentos jurídicos especializados, a convicção de que as forças de segurança podem usar armas de fogo sempre que um cidadão desrespeite uma ordem delas emanada, incluindo de detenção".
Por isso, os subscritores consideram que André Ventura, como Pedro Pinto, quiseram incentivar a "desordem e a desobediência dos agentes das forças de segurança face aos seus superiores hierárquicos", cometendo o crime de "incitamento a desobediência coletiva".
Na proposta de queixa-crime são também realçadas as declarações de Ricardo Reis, um assessor parlamentar do partido, que disse na rede social X a 23 de outubro: "A única palavra é esta: obrigado ao agente que deixou as ruas mais seguras!" e "menos um criminoso... menos um eleito do Bloco [de Esquerda]".
Sobre estas declarações, é referido na proposta que está em causa um crime de associação criminosa.
O social-democrata e comentador João Maria Jonet, os comentadores Daniel Oliveira e Pedro Marques Lopes, o antigo vice-presidente do PSD André Coelho Lima e a deputada do PS Isabel Moreira são outros dos subscritores da queixa.
Desde a noite de segunda-feira registaram-se desacatos no Zambujal e, desde terça-feira, noutros bairros da AML, onde foram queimados autocarros, automóveis e caixotes do lixo. Mais de uma dezena de pessoas foram detidas, o motorista de um autocarro sofreu queimaduras graves e dois polícias receberam tratamento hospitalar, havendo ainda alguns cidadãos feridos sem gravidade.
