É um confronto público inédito. No meio está o Regulamento para a Transferência de Doentes. A ministra da Saúde afirma que o regulamento é inválido porque a Entidade Reguladora da Saúde foi além dos seus poderes, a ERS responde que é válido e assim vai continuar. Marta Temido não tem competência para invalidá-lo.
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O regulamento da polémica é da autoria da Entidade Reguladora da Saúde (ERS). Trata-se de um documento que começou a ser preparado no ano passado, esteve em consulta pública no início do ano e entrou em vigor no passado dia 3 de dezembro.
Esta quinta-feira, 10 de dezembro, um despacho da ministra da Saúde, publicado no Diário da República, decreta que o regulamento é invalidado "com fundamento em ilegalidade por incompetência absoluta da referida entidade administrativa independente". Ou seja, o Ministério afirma que a ERS não tem competência para regular esta matéria da transferência de doentes.
Acusada de extravasar competências, a presidente da Entidade Reguladora da Saúde responde de imediato e na mesma moeda.
"A senhora ministra da Saúde não detém poderes de direção, de tutela ou de superintendência sobre a ERS, nem poderes de controlo da legalidade de atos ou de regulamentos desta entidade. Deste modo, a declaração de invalidade de um regulamento da ERS só poderá ser feita pela própria ERS ou pelos tribunais." Como se não bastasse, acrescenta o comunicado, que o dito regulamento continua em vigor e faz tábua rasa do despacho de Marta Temido, "é entendimento da ERS que o despacho da senhora Ministra da Saúde, por ser um ato que se situa fora das suas atribuições, não produz quaisquer efeitos jurídicos, nos termos da lei".
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Além da questão política, abre-se a dúvida legal: afinal, o regulamento está ou não em vigor?
No essencial, o texto do documento que entrou em vigor (ou teria entrado em vigor) no passado dia 3 de dezembro alega que é preciso acabar com os problemas durante os processos de transferência de utentes entre unidades de saúde, garantir que só há deslocações quando são de facto necessárias e que existe uma efetiva transferência de responsabilidades no tratamento e acompanhamento do doente.
O regulamento abrange a transferência entre unidades públicas de saúde, mas também para os setores privado e social, como tem acontecido com mais frequência durante a pandemia de Covid-19. O incumprimento paga-se caro, no caso de pessoas coletivas a coima máxima é superior aos 44 mil euros.
Questionado pela TSF, o Ministério da Saúde não explica porque motivo não levantou estes obstáculos durante o processo de consulta pública do regulamento, mas insiste que tem parecer jurídico a dar-lhe razão, repete que a decisão de "invalidar o regulamento é válida" e que o dito regulamento nunca chegou a vigorar.
A presidente da Entidade Reguladora da Saúde é Sofia Nogueira da Silva e tem mandato até 2022. A economista foi nomeada em 2016, na vigência deste Governo, por proposta do anterior ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes.