Gulbenkian associa-se ao "carbono azul" para antecipar neutralidade carbónica
Os especialistas dizem que o carbono azul é mais eficiente do que as florestas na quantidade de dióxido de carbono removido da atmosfera.
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No Dia Mundial do Oceano, a Fundação Calouste Gulbenkian lança um projeto para preservar e mapear todos os ecossistemas marinhos, em Portugal, que conseguem capturar e armazenar carbono. O "carbono azul" evita que o carbono se propague para a atmosfera, contribuindo para a redução dos gases com efeito de estufa.
Na véspera da Conferência do Oceano das Nações Unidas, que vai decorrer em Lisboa, e onde será apresentado o projeto "Gulbenkian Carbono Azul", a fundação admite que o sequestro do carbono no oceano é um elemento fundamental para que Portugal consiga antecipar a meta da neutralidade carbónica, prevista para 2050.
O projeto está dividido em três fases e deve estar concluído no final do próximo ano, antes da constituição de um mercado voluntário de carbono azul em Portugal, "que vai ser o primeiro no país".
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Os especialistas dizem que o carbono azul é mais eficiente do que as florestas, na quantidade de dióxido de carbono removido da atmosfera, conseguindo armazenar oito a 30 vezes mais carbono do que os ecossistemas terrestres.
Em Portugal, o carbono azul existe em sapais e ervas marinhas (a costa portuguesa não tem mangais, já que são ecossistemas típicos de climas tropicais), mas não há nenhum plano de intervenção e preservação. Com o mapeamento da Gulbenkian, os ecossistemas serão caracterizados com "condição em que se encontram, taxa anual de sequestro de carbono, entre outras características".
"Este projeto quer dar a conhecer os ecossistemas de carbono azul que existem em Portugal continental e, além disso, vai desenhar as medidas de proteção ou restauro. Vamos ainda identificar os respetivos custos que serão necessários para que estes ecossistemas continuem com a sua função de remover carbono da atmosfera", explica Filipa Saldanha, responsável pelo projeto, em conferência de imprensa.
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Em Portugal, há nove áreas identificadas de carbono azul, de Norte a Sul: Parque Natural da Ria Formosa, Reserva Natural de Castro Marim, Estuário do Arade, Ria de Alvor, Estuário do Mira, Reserva Natural do Estuário do Sado, Reserva do Estuário do Tejo, Ria de Aveiro e Lagoa de Óbidos.
O primeiro investimento é da Fundação Calouste Gulbenkian, que vai financiar um projeto-piloto de conservação ou restauro numa das áreas marinhas. Não há valores financeiros concretos, mas é suficiente para compensar a pegada de carbono da fundação em 2021, ou seja, "2238 toneladas de dióxido de carbono, que incluem as emissões de gases de efeito estufam provenientes da eletricidade ou calor adquiridos e consumidos".
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No futuro, a fundação chama por investimento privado, com a construção de uma rede de financiadores para apoiar o crescimento das iniciativas. O projeto é desenvolvido, em parceria, com a Universidade do Algarve e com a Associação Natureza Portugal.
O professor e investigador da universidade algarvia, Rui Santos, lembra que "tudo o que foi capturado e sequestrado nos sedimentos ao longo de centenas e milhares de anos" é libertado para a atmosfera, se os ecossistemas marinhos "forem destruídos".
"Se pararmos a degradação e restaurarmos os ecossistemas de carbono azul, esta intervenção tem efeitos globais, e pode remover cerca de 3% de todas as emissões globais e anuais de carbonos", admite.
A meta é ambiciosa, sublinha Rui Santos, mas terá de ser adotada para antecipar a neutralidade carbónica, depois de o Governo já ter admitido que, no melhor dos cenários, quer antecipar a meta.
Os investigadores dizem ainda que estes ecossistemas marítimos diminuem o risco de inundações e contribuem para a qualidade da água, sendo "uma solução de elevado impacto para a adaptação das alterações climáticas".
Na lei de bases do clima, publicada a 31 de dezembro de 2021, o Governo já prevê exista uma "avaliação de necessidades, implementação de ações de restauro ecológico e desenvolvimento sustentável de ecossistemas costeiros e marinhos".