Há uma banca no Super Bock Super Rock que transforma borra de café em cogumelos
Inquietado sobre "como é que se pode aprender tanto sobre a economia e tão pouco sobre a natureza", Natan Jacquemin revela à TSF que o começo deste projeto teve a ver com a paixão pela economia circular.
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"Ainda não percebi muito bem o que é isto." Esta é a frase que mais se faz ouvir entre os curiosos que se alinham na fila para conhecer a nova banca instalada na Herdade do Cabeço da Flauta - a Nãm Mushrooms - que está a recolher os restos de borra de café do festival do Meco para criar cogumelos que os festivaleiros podem agora experimentar.
"Eu quero que a Nãm tenha um processo que se inspira na natureza, usa a natureza como dela e que está a tentar produzir como a natureza: que usa apenas coisas locais, não importa coisas da China. E é isso que nós tentamos fazer", quem o diz é Natan Jacquemin, o criador deste projeto inovador, em declarações à TSF.
Inquietado sobre "como é que se pode aprender tanto sobre a economia e tão pouco sobre a natureza", Natan revela que o começo deste projeto não teve que ver com a paixão pelo "mundo dos cogumelos", nem pelo café - até porque antes disto "nem sequer bebia", apesar de agora se ter tornado num consumidor assíduo - e foi antes movido pela profunda crença na economia circular.
Mas o é que a borra de café tem afinal a ver com a produção de cogumelos? Natan explica: "Nós aproveitamos um desperdício local, neste caso a borra de café, transformamos em cogumelos e fertilizantes. É super simples o processo porque pouca gente sabe que quando se faz um café, aproveita-se apenas 1 ou 2% da biomassa total do café, o que quer dizer que o café ainda tem muitos nutrientes, portanto é um substrato para os cogumelos."
O criador da Nãm adianta ainda que, como o café é servido quente, "o calor mata as bactérias", pelo que o produto fica automaticamente limpo de todas as impurezas.
"Nós achamos a borra de café um desperdício porque nós inventamos o conceito de desperdício, porque isso na natureza não existe. Fomos nós que decidimos que era um desperdício, mas, no fundo, pode ser um recurso, podemos integrar na economia e é isso que nós fazemos", sublinha.
Natan fala num "grave problema ecológico" e considera que o "maior desafio que a humanidade enfrenta neste momento é conseguir conciliar a economia e a ecologia", mas este defende que uma não impede a outra, muito pelo contrário.
"Nós muitas vezes dizemos: 'Se tu queres criar emprego, tens de destruir a natureza porque tens de construir uma fábrica. Mas se quiseres proteger a natureza não vais criar esses empregos, então vais destruir a economia'. Tentar juntar estas duas coisas foi um pouco o que me fez começar a Nãm", esclarece.
A presença desta nova banca no Super Bock Super Rock surgiu através de uma proposta de uma amiga de Natan, que trabalha no festival, e o desafiou a "vir recolher a borra do café, para trazer um pouco da sustentabilidade" à Herdade do Cabeço da Flauta.
Apesar de ser a primeira vez que pisam um festival e cozinham os cogumelos - porque normalmente só os distribuem -, Natan revela que o feedback dos festivaleiros sobre "a receita e a comida" tem sido muito positivo e "isso é fixe".
"Se correr bem, estamos abertos a fazer outras parcerias também", avança.
A arca que expõe os cogumelos em crescimento é um dos fatores atrativos da banca, que atrai os mais curiosos. Esta era a intenção de Natan que afirma que "poucas pessoas veem a agricultura" e, por isso, que lembrar os legumes e fungos, como os cogumelos, "vêm da terra".
"Por isso é que nós cultivamos dentro da cidade, para trazer este conhecimento para dentro da urbe e ver os cogumelos a crescer foi o que atraiu mais a atenção das pessoas", afirma.
A Nãm Mushrooms tem uma parceria com a Delta e recolhe a borra de café na cidade de Lisboa e de Cascais, que depois é transportada para uma "pequena fábrica em Odivelas", onde é misturada com "um pouco de palha e com as sementes do cogumelo, que se chamam micélio". A partir daqui, o processo dura cerca de "um mês a um mês e meio" até que o micélio comece "a colonizar todo o substrato, que no início fica preto e depois começa a ficar mais branco, fazendo nascer lindos cogumelos".
"Nós temos duas quintas urbanas, temos uma fábrica onde nós fazemos o substrato, depois mandamos esse substrato para a nossa quinta urbana em Marvila e em Cascais", conta.
Quando prontos, os cogumelos são finalmente vendidos "apenas à restauração local, para ser o mais local possível" e "todo o desperdício da produção, porque, infelizmente, o cogumelo não vai transformar toda a borra (uma parte da borra ainda vai ficar - mas vai ser mais rica ainda em nutrientes porque o cogumelo cresceu e criou muito valor ali também) é tratado pela Câmara Municipal de Lisboa, que vem recolher este fertilizante e usa isso nas hortas e viveiros" da cidade.