"Inaceitável." Ordem faz queixa da falta de regulação das empresas de contratação de médicos

Para Carlos Cortes, "estas empresas intermediárias de recrutamento de médicos têm tido uma atuação frequentemente desrespeitadora"
Pedro Correia/Global Imagens (arquivo)
O bastonário sublinha a importância de "regular e fiscalizar o trabalho das empresas de gestão de recursos humanos no setor da saúde, para evitar que situações semelhantes possam ocorrer".
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O bastonário da Ordem dos Médicos apresentou uma queixa ao Ministério da Saúde e à Entidade Reguladora da Saúde, após ter conhecimento de que o "número de altas hospitalares" é um critério para o pagamento de honorários.
Segundo uma nota de imprensa da Ordem dos Médicos (OM), este "fator de remuneração" estará a ser utilizado por empresas de gestão de recursos humanos, responsáveis pelo recrutamento de médicos por solicitação de hospitais do Serviço Nacional de Saúde.
Para o bastonário da OM, Carlos Cortes, a confirmar-se esta informação, "trata-se de uma prática inadmissível, que interfere com a autonomia médica, desconsidera a condição clínica do doente e coloca uma pressão adicional inaceitável sobre os médicos".
Em declarações à TSF, Carlos Cortes fala numa "prática que tem contornos muito sensíveis em termos éticos e em termos da qualidade da prestação dos cuidados de saúde", sublinhando ainda que a "alta que os médicos dão aos seus doentes tem de ser exclusivamente baseada em critérios de ordem clínica e não podem estar associados a indicies de produtividade baseados no número de altas que esses médicos vão dar".
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O bastonário denuncia ainda que a contratação de médicos por empresas de gestão de recursos humanos é uma prática "que já existe há muitos anos", mas que "tem sido intensificada nos últimos 10 anos", denunciando um "mercado completamente desregulado".
"E é de tal forma desregulado, muitas vezes até nos valores que são apresentados para o pagamento dos médicos, muito abaixo daquilo que é a responsabilidade e a diferenciação técnica dos médicos, mas demos conta ontem [sexta-feira] que algumas dessas empresas estavam a contratar médicos indexando a sua remuneração ao número de altas que iriam dar no serviço onde estariam, nomeadamente no serviço de urgência", explica.
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Insistindo na ideia de que a OM só teve conhecimento deste critério na sexta-feira, Carlos Cortes afirma que esta situação foi, então, de imediato comunicada ao Ministério da Saúde e à Entidade Reguladora da Saúde, assim como ao hospital que alegadamente utilizava este método o "Hospital de Setúbal". Ainda assim, o bastonário defende que o Ministério da Saúde fica "muito mal nesta situação".
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"Fica mal porque, se por um lado, conhecia esta situação, não atuou e deveria ter atuado. E se não conhecia esta situação - refiro-me ao Ministério da Saúde ou à Direção Executiva do SNS -, então não está a fazer bem o seu trabalho", acusa.
Para a OM, a contratação de clínicos deve obedecer a "critérios rigorosos e objetivos, salvaguardando a avaliação técnica e a condição clínica dos doentes".
Nesse sentido, o bastonário sublinha a importância de "regular e fiscalizar o trabalho das empresas de gestão de recursos humanos no setor da saúde, para evitar que situações semelhantes possam ocorrer".
Carlos Cortes considera ainda que "não é admissível que a remuneração dos médicos seja indexada ao número de altas dadas", ao realçar que é "uma visão mercantil e um atentado à qualidade dos cuidados de saúde".
"A alta clínica é um ato médico que deve ter critérios clínicos rigorosos e nunca poderá estar relacionado com uma bonificação remuneratória", acrescenta citado na nota de imprensa.
Para Carlos Cortes, "estas empresas intermediárias de recrutamento de médicos têm tido uma atuação frequentemente desrespeitadora do trabalho médico, da sua valorização e autonomia".
"Esta é uma prática inaceitável na qual o Ministério da Saúde tem de intervir prontamente e regular este setor", remata o bastonário.
Carlos Cortes questionou também o Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Setúbal, onde pertence o hospital visado nas notícias.
Ministério da Saúde ainda não recebeu denúncia
O Ministério da Saúde garante que ainda não recebeu qualquer denúncia da Ordem dos Médicos sobre o pagamento a médicos tarefeiros no Serviço Nacional de Saúde.
Em resposta à TSF, a tutela remete esclarecimentos para a direção-executiva do SNS, que, para já, permanece em silêncio.
Notícia atualizada às 16h41