Juízas temem que existam colegas em exaustão ou burnout que continuam a trabalhar
Associação de juízas alerta que há colegas com medo de meter baixa fazendo uma "gestão da sua própria exaustão". Em causa a falta de quem substitua os juízes nas suas ausências justificadas ao trabalho.
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A Associação das Juízas Portuguesas diz que é preciso estudar a saúde mental e situações de exaustão ou burnout dos juízes e em especial das juízas, temendo que existam muitas colegas em situações patológicas que continuam a trabalhar.
A presidente da associação criada no final de 2019 admite que receiam que o "cansaço patológico" seja uma realidade sobretudo nas mulheres que são há vários anos a maioria dos juízes dos tribunais portugueses.
Há alguns meses que as mulheres juízas têm denunciado aquilo que dizem ser a desigualdade que existe nos tribunais, nomeadamente porque elas tenderão a ser mais prejudicadas quando engravidam.
No entanto, o problema não é só na gravidez e também se coloca na doença ou quando têm de cuidar de algum familiar, tarefa que as mulheres tendem a assumir mais vezes.
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Paula Ferreira Pinto explica que o problema está muitas vezes na falta de quem substitua os juízes quando por qualquer razão mais que legítima têm de se ausentar ao trabalho.
Faltar ao trabalho pode ser pior que não faltar
Juízes e juízas sentem "muitas vezes que será muito pior estar fora porque quando voltarem terão ainda mais trabalho, havendo uma gestão da sua própria exaustão", explica.
Paula Ferreira Pinto receia que as e os colegas evitem ao máximo meter baixa pois sabem que quando regressarem irão ter uma situação ainda mais complexa que aquela que deixaram para trás.
Um exemplo: um juiz ou uma juíza que quando volta de uma ausência tem de ver todos os processos que ficaram por ver nesse período fora, situação que apenas não é frequente nas jurisdições de família e menores com crianças em perigo ou nos casos criminais com arguidos presos.
A Associação das Juízas Portuguesas acrescenta, contudo, que o problema não está no Conselho Superior da Magistratura, órgão de gestão dos juízes, mas no quadro de juízes e na falta de recursos humanos que são definidos superiormente.
"Não havendo pessoas, não as podem substituir", afirma Paula Ferreira Pinto.
Ter a secção de processos no gabinete
"Entrar num gabinete e ter, como dizemos no nosso jargão, a secção de processos no gabinete, ou seja ter muitos processos para despachar sendo humanamente impossível fazê-lo em tempo útil, é uma pressão enorme que por si só pode trazer problemas à saúde dos juízes e ao desenvolvimento da justiça para as pessoas", refere e magistrada.
Paula Ferreira Pinto conta que "acontece com alguma frequência", e até já aconteceu com ela, "regressarem de ausências perfeitamente justificadas e verem-se a braços com uma quantidade de serviço perfeitamente impossível de gerir".
Casos que causam "uma pressão de tal forma que acabará por desembocar em qualquer problema de saúde, nomeadamente num esgotamento emocional ou nervoso e às vezes em casos de depressão".
Razões que levam Associação das Juízas Portuguesas a querer promover um estudo científico junto da academia que confirme ou não as suspeitas que tem sobre a saúde mental e psiquiátrica de quem decide os processos nos tribunais, mas também sobre o impacto da maternidade sobre a avaliação das magistradas judiciais.