Em Coimbra mora a mais antiga rádio-escola do país. Lá aprende-se a fazer rádio mas, neste momento, é a Rádio que aprende a (re)fazer-se.
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Estamos no terceiro piso da Associação Académica de Coimbra (AAC). A porta de vidro abre e ouve-se música, as paredes estão vestidas de cartazes e a frequência 107.9 FM está escrita em todo o lado. É esta a atmosfera da Rádio Universidade de Coimbra (RUC) e estamos na mais antiga rádio-escola do país.
A RUC - como é mais conhecida - começou a navegar as ondas hertzianas na década de 40, com a difusão feita em circuito interno, e destinava-se maioritariamente às cantinas universitárias. Nos dias de hoje não se destina somente aos estudantes universitários mas também à comunidade local. A Rádio Universidade de Coimbra é uma casa com três décadas de história, mas agora depara-se com um futuro incerto.
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E tudo a Leslie mudou
A passagem da tempestade Leslie afetou fortemente o distrito de Coimbra: os prejuízos são de milhões e a RUC foi (também) um dos locais afetados. O presidente da RUC, João Aveiro, conta que o Observatório Astronómico de Coimbra sofreu danos irreparáveis, sendo que uma das infraestruturas afetadas é "a antena com a emissão da RUC. Essa antena acabou por cair estando totalmente irrecuperável. Só em equipamento para a repor são cerca de 31 mil euros".
O equipamento não é, no entanto, tudo. Há taxas camarárias, licenças e despesas legais a pagar para recolocar a RUC "sempre no ar". A tarefa não se adivinha fácil: a rádio não tem dinheiro para cobrir as despesas mas não é isso que a impede de tentar.
A Universidade de Coimbra é uma das entidades que negoceia com a RUC a melhor forma de reparar os danos da tempestade. Em cima da mesa há ainda concertos organizados pela rádio como forma de angariação de fundos.
Este é um cenário que entristece Isabel Simões, ruquiana (nome dos sócios da RUC) desde 1987. Ao microfone da TSF, Isabel conta que a memória não conseguiu armazenar todos os momentos que viveu na Rádio Universidade de Coimbra. Recorda, no entanto, um episódio em que a RUC fez de tudo para entrevistar Mário Soares, o primeiro sócio desta rádio fundada por estudantes.
Isabel, sexagenária, conta que o "bichinho da rádio" lhe está no corpo desde os 14 anos e que brincar aos radialistas na RUC é uma coisa séria.
"É fundamental um jornalista aperceber-se do mundo e da origem das coisas, mas o saber resolver situações difíceis só se adquire praticando muito" e garante que "os melhores da RUC, quando chegam a uma redação, sabem o que estão a fazer".
A imagem da RUC está associada a uma formação extra universidade, ou seja, é o local onde é possível errar e praticar o que está escrito nos livros. E esta é uma mensagem reforçada pelo ministro da Educação.
O rei dos RMs
Também Tiago Brandão Rodrigues passou pelas ondas hertzianas dos 107.9 nos seus tempos de estudante, uma altura em que era conhecido como "o rei dos RMs", ou seja, dos "registos magnéticos" em que armazenavam as declarações e sons que compõem a transmissão de uma rádio.
"Os meus tempos na Rádio Universidade de Coimbra foram sempre apetecíveis. Comecei a ouvir a RUC no secundário porque o meu primo que estava a estudar na Universidade de Coimbra enviava-me cassetes gravadas de programas. Depois, quando cheguei a Coimbra, tive oportunidade de entender toda a extensão do que aquilo significava. Era muito mais do que uma rádio, era uma rádio-escola."
Como ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues instalou no ensino básico e secundário um orçamento participativo das escolas, ou seja, uma verba adicional para um projeto à escolha dos alunos. A maioria das escolas escolheu criar uma rádio.
"Os alunos entendem verdadeiramente a pertinência da rádio, e da rádio como escola, como complemento importante às atividades pedagógicas da escola, por isso eu, um amante da rádio, fico absolutamente fascinado".
O ministro da Educação recorda que a RUC tem a frescura "de todas as instituições que perduram para além das pessoas", por isso espera - como tantos ruquianos - que os 107.9 FM sejam recuperados e possam continuar a formar gente e a tornar estudantes em futuros profissionais da comunicação.