Mãe das gémeas luso-brasileiras vai pedir indemnizações ao médico e aos autores da notícia
Em declarações à TSF, o advogado da família refere ser inaceitável a divulgação de imagens e dados pessoais que foi feita ao longo do processo
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A mãe das gémeas luso-brasileiras tratadas no Hospital de Santa Maria vai pedir indemnizações ao médico e aos autores da notícia sobre o alegado favorecimento das meninas, adianta o Correio da Manhã, que escreve que Daniela Martins apresentou queixa na Justiça. Ouvido pela TSF, o advogado da mãe das gémeas explica que a queixa já tem mais de um ano e, à medida que forem conhecidas as decisões judiciais, Wilson Bicalho vai avançar com pedidos de indemnização.
"Já havíamos feito uma queixa-crime contra a rede de televisão TVI/CNN e a jornalista Sandra Felgueiras, também fizemos uma queixa-crime na mesma peça processual contra o médico, pelo sigilo, pela questão deontológica de o médico não poder falar de qualquer paciente. À medida que se prove e que se mostre que foi cometido um crime e um dano e que esse dano é passível de reparação, essa reparação, no meu entendimento, tem de ser pedida", explica à TSF Wilson Bicalho, sublinhando que não é possível calcular o valor dessa reparação: "Ainda estamos a fazer cálculos e estimativas do que vai ser pedido."
O advogado da família das gémeas luso-brasileiras considera inaceitável a divulgação de imagens e dados pessoais que foi feita ao longo do processo. Wilson Bicalho salienta que, até hoje, os dados estão disponíveis online.
"Para ter noção do tamanho do impacto, se for ao Google e pesquisar 'gémeas luso-brasileiras', a Wikipédia vai dar-lhe o nome e o apelido das duas crianças. É nessa fase que perguntamos onde está o RGPD, onde está o cuidado do Estado com essas crianças, que continuam a ser simplesmente gémeas luso-brasileiras para alguns e são as crianças e as filhas de uma família. Defendo esse caso com unhas e dentes, porque eu tenho uma filha de igual idade e, se fosse com a minha filha, não sei se teria a resiliência dessa mãe", acrescenta.
Wilson Bicalho adianta que, em causa, podem estar os crimes de difamação e calúnia, devassa da vida privada, gravações e fotografias ilícitas, violação de dados pessoais e do segredo profissional e maus tratos psicológicos a menores.
Em causa está o tratamento hospitalar, em 2020, de duas crianças gémeas residentes no Brasil que adquiriram nacionalidade portuguesa e receberam no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, o medicamento Zolgensma.
Com um custo de dois milhões de euros por pessoa, este fármaco tem como objetivo controlar a propagação da atrofia muscular espinal, uma doença neurodegenerativa.
O caso foi divulgado pela TVI, em novembro passado, e está ainda a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República e a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde já concluiu que o acesso à consulta de neuropediatria destas crianças foi ilegal.
Também uma auditoria interna do Hospital Santa Maria concluiu que a marcação de uma primeira consulta hospitalar pela Secretaria de Estado da Saúde foi a única exceção ao cumprimento das regras neste caso.
A 4 de dezembro do ano passado, o Presidente da República confirmou que o seu filho, Nuno Rebelo de Sousa, o contactou por 'email' em 2019 sobre a situação das duas gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinhal que depois vieram a receber no Hospital de Santa Maria um tratamento com um dos medicamentos mais caros do mundo.
Nessa ocasião, Marcelo Rebelo de Sousa deu conta de correspondência trocada na Presidência da República em resposta ao seu filho, enviada à Procuradoria-Geral da República, e defendeu que deu a esse caso "o despacho mais neutral", igual a tantos outros, encaminhando esse dossiê para o Governo.
Este caso foi alvo de uma comissão de inquérito (CPI) e as suas conclusões seguiram para o Ministério Público.
As conclusões finais da CPI, aprovadas no passado dia 18 de março, apontam para uma "intervenção especial", sem ilegalidade, da Casa Civil do Presidente da República e referem que o ex-secretário de Estado da Saúde Lacerda Sales deu orientações à sua secretária para pedir a marcação da primeira consulta das crianças no Hospital de Santa Maria.