Nesta vila de Lamego, não há desfile de Entrudo, mas Adão Almeida continua a ter encomendas de diabos e senhorinhas.
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O som do martelo a bater na goiva é, por estes dias, a banda sonora de algumas caves na vila de Lazarim, em Lamego. Devido à pandemia não há Entrudo, nem desfile, nem testamentos. Mas continua a haver paus de amieiro para transformar em máscaras. Algumas para vender, a partir de 250 euros cada uma.
Adão Almeida já tem três encomendadas. Mas vai fazer 12. Só. O ano passado fez o dobro. "Porque este ano não há o mesmo entusiasmo". Se não as vender, ficam para sair no desfile de 2022. Se houver. Só não consegue estar parado nesta época. Ainda nem cheirava a Natal e já ele construía máscaras. Fazê-las pode não dar para comer - "se vivesse disto passava fome" - mas, como "vício" que é, tem de se alimentar. "Faz de conta que há Carnaval. Já basta não poder fazê-las no verão", porque, "com o calor, a madeira racha".
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Tem passado as tardes e noites destes dias recolhido no seu "ateliêzinho". Quando o filho sai do trabalho, "bota uma mão". Ou as duas, porque é ele, Luís Eduardo Almeida, que "escava as máscaras todas". Tira o grosso da madeira de um tronco tosco e dá-lhe as primeiras semelhanças.
Ao veterano Adão, 58 anos, calha o trabalho mais fino. Não é que Luís não se atreva já, mas aqui, como noutros misteres, a idade é um posto. "Eu, com os cornos dos diabos, não me dou mal, mas o "cabelo" das senhorinhas é melhor ser ele a fazer", confessa o artesão de 38 anos, viciado na arte desde criança. "Aos 15 anos fiz o meu primeiro diabo". Espera que, no Entrudo de 2022, a filha, agora com dois anos, já possa levar uma máscara.
O avô já está a tratar dela, uma senhorinha, "a máscara mais top do Entrudo de Lazarim". Quase uma semana de trabalho. Depois de ser escavada, é preciso "polir, fazer o cabelo, furar as orelhas para os brincos e pô-la bonita". Com os diabos, "o mais difícil é fazer os cornos" porque "não há colagens. No mesmo tronco, fazem-se a cara e os chifres".
Uma arte difícil tem o seu preço. "As senhorinhas custam 280 ou mais. O mais fraco dos diabos anda nos 250 euros e depois vai por aí acima. Já vendi máscaras a 650 euros cada uma". Uma era "um demónio com uma cobra muito bonita", outra "um demónio com os cornos enrolados" e ainda um rei.
Este ano, como não há desfile de caretos, a Câmara de Lamego desafiou os habitantes de Lazarim a colocar uma máscara à porta, caso a tenham, como forma de evocar a tradição. "Não se pode perder", frisa Luís Almeida, acentuando que a oficina dos Almeida "estará sempre aberta para quem quiser aprender".