Médicos obrigados a passar receitas eletrónicas. Decisão "péssima" ou necessária?
Bastonário diz que obrigatoriedade de passar receitas eletrónicas vai afastar médicos da profissão. Já o presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde lembra que os médicos têm de estar sempre atualizados.
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O bastonário da Ordem dos Médicos considera que a nova portaria que obriga médicos a passar receitas eletrónicas pode levar alguns profissionais a abandonar a profissão.
Os médicos mais velhos e aqueles que se deslocam de aldeia em aldeia podem ter especial dificuldade em adaptar-se às novas regras, alerta Miguel Guimarães.
"Foi uma péssima decisão" e representa uma falta de respeito para médicos e doentes, diz o bastonário em declarações à TSF.
"O Estado oferece aos médicos telemóveis para eles prescreverem com a aplicação XPTO, para eles usarem no domicílio? Quando se quer obrigar tem de ser dar os meios para isso", defende.
Além de prejudicar os médicos "inadaptados", que nunca utilizaram sistemas informáticos, a medida não vai mudar a situação atual, reforça Miguel Guimarães: "Somos um dos países a nível mundial com maior percentagem de prescrição eletrónica".
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Segundo os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) há cerca de 400 médicos registados como inadaptados aos sistemas digitais para prescrição de receitas.
"Não estamos no século passado"
O presidente do SPMS defende, contudo, que a portaria publicada esta terça-feira pode ser o empurrão que alguns médicos precisam para se atualizarem.
Henrique Martins lembra que a profissão requer uma constante atualização, o que hoje em dia implica recorrer a informação disponível online. "Temos de acabar com essa ideia romântica de que há uns médicos que deixaram de aprender há 20 anos e continuam a exercer. Se calhar não é uma ideia boa."
"Tenho muitas dúvidas que haja assim tantos médicos incapazes de usar um computador. Estamos em 2019, não no século passado."
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Além da poupança para o Serviço Nacional de Saúde, as receitas digitais ajudam a combater a fraude, nota o presidente do SPMS.
É inevitável que comecem a surgir fraudes em receitas eletrónicas - "as pessoas que fazem fraude são engenhosas e arranjam sempre formas", ressalva Henrique Martins, mas as receitas em papel são mais suscetíveis.
"O sistema em papel é muito mais frágil, é muito mais demorada a sua deteção e é mais difícil em tribunal fazer prova quando é necessário fazer acusação."
Dentistas digitais
Já o número de dentistas inadaptados informaticamente é residual, assegura o bastonário Orlando Monteiro da Silva. "Prescreve-se maioritariamente através de sistemas eletrónicos, ou até, recentemente, de dispositivos móveis com programas adaptados para o efeito."
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Para facilitar o processo, Orlando Monteiro da Silva propõe mais tempo para passar do papel para o digital.
A portaria que obriga os médicos a passar todas as receitas eletronicamente entra em vigor esta quarta-feira, mesmo os que estão inscritos como inadaptados aos sistemas de informação.
"A prescrição de medicamentos pode, excecionalmente, realizar-se por via manual nas situações de falência informática, de indisponibilidade da prescrição através de dispositivos móveis, ou nas situações de prescrição em que o utente não tenha a possibilidade de receber as prescrição desmaterializada ou de a materializar", lê-se na portaria a que o Jornal de Notícias teve acesso esta segunda-feira.
Os médicos têm cerca de cinco meses, até 31 de março, para se adaptarem.