Médicos regressam às ruas e pedem ao Governo para "salvar o SNS"
Em frente ao Ministério da Saúde, clínicos de todas as gerações exigiram mais condições e reconhecimento.
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"Manuel Pizarro, vem à janela." Os médicos foram entoando durante mais de duas horas o cântico. Queriam ver o "colega" - que também é ministro da Saúde - na rua. O governante não aceitou o desafio, mas nem isso parou a mobilização destes profissionais da saúde.
Vieram de norte a sul, e são médicos de várias gerações. A avenida que serve de casa ao Ministério da Saúde parece pequena para as centenas de médicos que quiseram estar presentes.
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João Machado, por exemplo, ainda está a terminar o internato em Évora. Conhece por dentro a realidade do Serviço Nacional de Saúde (SNS) há poucos meses, mas o pouco tempo de trabalho já o fez ver que são precisos mais ovos para conseguir manter de pé o serviço público de saúde: "O nosso trabalho não é reconhecido. Isso custa-nos. Estamos mesmo no limite. Não conseguimos fazer mais omeletes sem que nos deem os ovos para as conseguirmos fazer bem."
Avançamos uns metros na Avenida João Crisóstomo e o mapa leva-nos de novo ao sul do país, mas mais no litoral. Joana Brito é médica de família no Baixo Alentejo e nas mãos tem um cartaz que antevê o destino dos médicos caso o serviço público de saúde não seja reforçado: "'Vamos todos pró privaducho'.Tem de se atuar. Temos de investir no SNS. O SNS está neste momento, na minha opinião, já afundado. Temos de salvar o SNS", avisa a médica.
A luta juntou médicos, mas também alguns utentes. Fernanda Pinela veio do Alentejo para pedir mais consideração e respeito pelos médicos do SNS. "A falta de recursos é o mais grave porque desmotiva os médicos. Os médicos estão desmotivados porque não têm condições", lamenta.
A falta de esperança dos que acabaram de chegar
Os cânticos ecoam de todos os lados, mas há um que se destaca. A melodia faz-nos recuar 50 anos, até ao 25 de Abril de 1974. Mas a letra não é de Zeca Afonso, e não é a "Grândola, Vila Morena". Os acordes e o ritmo são o mesmo de uma das senhas da Revolução de Abril, mas a letra é outra. "A saúde é um direito, e sem ela nada feito. Sem ela nada feito", ouve-se.
Não demora muito até a letra estar na ponta da língua, e basta que se ouça uma vez o refrão para que as largas centenas que estiveram esta tarde em Lisboa já a cantassem sem hesitações. A música toca a todas as gerações. Em frente ao ministério estiveram, acima de tudo, médicos com experiência de vários anos no SNS. Os rostos mostram que o desânimo está prestes a chegar a um ponto de rutura. Mas é a esperança que ainda os move. É também a esperança que explica o porquê de vários estudantes de Medicina da capital se terem juntado ao protesto, no primeiro de dois dias de greve dos médicos, uma paralisação convocada pela Federação Nacional de Médicos (FNAM).
Raquel Pechirra faz parte da mais recente fornada de médicos do SNS. Está desde o início do ano a trabalhar no Centro Hospitalar do Oeste. Não veio sozinha. Com ela vieram outros colegas. As suas vidas cruzaram-se no hospital, mas a formação foi feita em diferentes escolas de Medicina do país. O cartaz que tem nas mãos pergunta: "Vou ser obrigada a emigrar?".
À TSF, esta jovem médica afirma com tristeza que "se isto não mudar, provavelmente vai acontecer". Só as negociações com o governo, que vão durar até junho, podem fazer esta resposta ser diferente. Apesar da "pouca esperança", os médicos prometem voltar às ruas caso as mudanças não convençam.
