Micróbios colhidos de fezes humanas reunidos em cofre-forte por cientistas portugueses
Os micróbios são úteis na proteção contra organismos que provocam doenças, mas estão a desaparecer nas sociedades ocidentais. Investigadores de microbiologia do Instituto Gulbenkian de Ciência congelarão fezes para o estudo.
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Criar um cofre-forte de micróbios é a missão que move dois investigadores do Instituto Gulbenkian de Ciência preparados para embarcar num projeto à escala mundial. O objetivo é guardar os micróbios que estão a desaparecer mas ainda desempenham funções úteis para o organismo humano. A investigação vai ser alavancada com a formação de técnicos no Peru e na Indonésia.
O primeiro desafio a ultrapassar está relacionado, como explica a investigadora de microbiologia do Instituto de Gulbenkian de Ciência Karina Xavier, com "o estilo de vida ocidental", responsável pela perda de diversidade da microbiota.
Além de contribuírem para a nutrição, os micróbios são úteis para o sistema imunitário e na proteção contra organismos que provocam doenças, mas estão a desaparecer nas sociedades modernas.
"Todos nós usamos em Portugal alimentos muito mais processados ou antibióticos necessários para combater infeções, e estes têm o efeito secundário de diminuir a diversidade natural, fruto da nossa evolução durante séculos, milhares de anos", explica à TSF a investigadora que fará parte da iniciativa.
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Será também preocupação dos cientistas envolvidos no estudo detetar a possível "associação com algumas doenças, como o aumento da suscetibilidade para infeções ou doenças crónicas e desequilíbrios nutricionais; a obesidade é disso exemplo".
O cofre-forte acolherá todos os micróbios encontrados em humanos, em especial os que estão nos intestinos. Por isso, a solução é "guardar fezes, porque as fezes são muito ricas em micróbios que temos nos nossos intestinos".
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"Temos de ir buscá-los onde essa diversidade ainda é muito grande. Temos de ir às populações que têm estilos de vida mais tradicionais." Depois de recolhidos, os excrementos ficarão expostos a temperaturas muito reduzidas. "Vamos congelar fezes a temperaturas muito baixas, para que possamos reativá-los quando necessitarmos", relata Karina Xavier. Os cientistas não sabem se as fezes congeladas podem durar décadas ou séculos, mas querem guardar tudo num cofre-forte que ficará na Suíça ou na Noruega.
Já existe um cofre-forte que armazena sementes de todo o mundo. Agora, 50 investigadores trabalham na criação de um cofre-forte de micróbios, onde vão ficar congelados dejetos humanos.
Karina Xavier e Luís Teixeira, investigadores de microbiologia do Instituto Gulbenkian de Ciência, foram convidados para participar no projeto, e darão formação em países como o Brasil e Cabo Verde.