"Uma 'governance' eficaz é fundamental para o funcionamento do setor bancário"
A TSF, o Dinheiro Vivo e a EY, em parceria com a Iberinform e a Sage, promovem, esta sexta-feira, a "Money Conference", a partir do Lapa Palace Hotel, em Lisboa.
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As tendências no setor bancário estão em discussão, esta manhã, na "Money Conference", em Lisboa. O debate conta com a intervenção de nomes como o de Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto das Finanças, Carlos Costa, governador do Banco de Portugal, e António Horta Osório, diretor executivo do Llyods Bank.
Na nota de abertura da conferência, o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, fez questão de sublinhar que, apesar dos desenvolvimentos positivos do sistema bancário português nos últimos anos - com bancos mais capitalizados, mais estáveis, com maior liquidez e melhores índices de produtividade - os bancos precisam de ser mais ambiciosos na redução do crédito mal parado.
"Têm de continuar a reduzir ativos não produtivos (...), eu diria mesmo que os bancos deviam ser mais ambiciosos", afirmou Carlos Costa, recordando que esse é um fator que condiciona a confiança do mercado e interesse dos investidores.
O governador do Banco de Portugal reforçou a necessidade de os bancos melhorarem a absorção de perdas, assegurarem que o crédito reflete o risco das aplicações e evitar comportamentos desajustados, num contexto de baixas taxas de juro, sob pena de isso vir a refletir-se anos depois de forma gravosa.
Carlos Costa referiu ainda que os bancos e outras instituições financeiras estão a enfrentar a concorrência de novas plataformas e modelos digitais de transações, pelo que têm de ser proativos, apostando nas novas tecnologias - a "banca digital".
A importância da fiscalização no setor também não passou ao lado do discurso de Carlos Costa, que classificou o controlo interno e externo como a chave para a confiança dos mercados e do supervisor.
Por esse motivo, o Banco de Portugal irá lançar em breve uma consulta pública para novas regras que obrigarão os bancos a reforçar o controlo interno. Em causa está uma nova regulamentação que revogará o aviso de 2008, adaptando as regras à luz da nova legislação europeia.
O governador do Banco de Portugal finalizou a intervenção com um aviso: "Se não formos capazes de ter um sistema financeiro eficiente, quem paga é o depositante ou o cliente."
Seguiu-se a intervenção de António Horta Osório, diretor executivo do Llyods Bank, que comparou a realidade portuguesa com a de outros países europeus. Constatando que a receita pública de Portugal, entre 2007 para 2018, está abaixo da média europeia, e que os rendimentos em Portugal correspondem a dois terços daquilo que são em Espanha e metade do que são na realidade irlandesa, Horta Osório questionou se o país está a alocar o dinheiro dos portugueses nas prioridades corretas e a receber a devida contrapartida.
Apesar de admitir que ainda há tempo para continuar a diminuir o endividamento do país, o diretor executivo do Lloyds Bank alertou para os riscos que Portugal corre se existir uma subida repentina das taxas de juro.
António Horta Osório relembrou que Portugal é "uma pequena economia", mas "muito aberta" - exportações representavam 44% do PIB português, em 2018 - pelo que depende em grande parte do que se passa no estrangeiro e, por isso, as suas "políticas económicas têm de estar em consonância com o que se passa lá fora". E a verdade é que os indicadores mostram que o ambiente macroeconómico está a desacelerar (em parte, por influência dos EUA, da China e da situação do Brexit) e que a procura externa dirigida à economia portuguesa tem tendência a abrandar nos próximos anos.
Os desafios demográficos enfrentados pelo país foram também mencionados por Horta Osório, que salientou ser urgente resolver a situação do envelhecimento da população portuguesa. Aumentar a taxa de natalidade, atrair de volta jovens portugueses que emigraram e adquiriram competências no exterior e aumentar a "imigração inteligente" (regular a entrada de imigrantes em Portugal, apostando na chegada de pessoas com competências de que Portugal precisa) foram as formas de solução sugeridas.
O diretor executivo do Lloyds Bank concluiu a intervenção declarando que Portugal precisa de questionar-se sobre o quão satisfeito está com o ponto em que a sua economia se situa: "Estamos satisfeitos com este nível de crescimento? Ou são necessários objetivos mais ambiciosos, para criar mais riqueza e poder distribuí-la melhor?".
Foi com estas perguntas em pano de fundo, que os diretores executivos de cinco bancos com atividade em Portugal entraram em palco para debater a transparência e as boas práticas no setor bancário português. António Ramalho, do Novo Banco, Miguel Maya, do Millennium BCP, Pablo Forero, do BPI, Paulo Macedo, da CGD, e Pedro Castro Almeida, do Santander, tomaram a palavra.
As comissões cobradas pelos bancos foram um dos grandes temas em cima da mesa, na qual também se falou da estabilidade do modelo de negócio, da eficiência e redução de custos, a sustentabilidade e a reputação da banca portuguesa.
O debate foi animado por uma oratória com recurso a alegorias menos convencionais. Paulo Macedo afirmou que toda a gente quer que a CGD esteja sempre "sossegada e quieta", e decidiu contar uma história da autoria do escritor surrealista Mário-Henrique Leiria para ilustrar a situação: "Uma nêspera estava na cama/deitada/muito calada/a ver/o que acontecia/chegou a Velha/e disse/olha uma nêspera/e zás comeu-a/é o que acontece/às nêsperas/que ficam deitadas/caladas/a esperar/o que acontece". "A Caixa não será uma nêspera", acrescentou. Paulo Macedo defendeu que a CGD quer "remunerar e devolver o dinheiro aos contribuintes" que injetaram fundos no banco público para o recapitalizar, e que a "Caixa não tem gestores pagos para ver navios".
Seguindo o exemplo do diretor executivo da CGD, também Pedro Castro Almeida, do Santander, decidiu recorrer a uma alegoria, para expressar que a eficiência dos bancos não tem de passar pela redução de custos (e, consequentemente, de pessoal): "Se Deus pedisse a Noé para apertar custos, ele não ia deixar os machos de fora da arca, ou o resultado seria ainda pior."
Do debate sobre os bancos portugueses, passou-se à discussão sobre a banca no mercado global e como esta pode ser reinventada. John Liver, da EY - empresa de serviços de auditoria de assessoria fiscal, de gestão e de apoio a transações -, foi o orador em destaque, num espaço aberto a perguntas e respostas.
Ricardo Mourinho Félix encerrou a conferência, sublinhando que "uma 'governance' eficaz é fundamental para o funcionamento do setor bancário", por isso, é necessário "ouvir várias vozes, diferentes pontos de vista, encontrando pontos comuns entre os bancos, os legisladores e os decisores."O secretário de Estado Adjunto e das Finanças defendeu que "a solidez dos bancos é essencial para a estabilidade financeira" e que muitos dos problemas financeiros resultaram também de ineficiências em termo de gestão.
No mesmo plano, Mourinho Félix acredita que a transparência, a supervisão, a criação de mecanismos de controle e a prestação de contas - presentes na proposta de revisão do modelo de supervisão - serão fundamentais para que as pessoas recuperem a confiança nos bancos: "Esta proposta revê que os três supervisores trabalhem mais em conjunto, reforçando o quadro institucional da sua cooperação e coordenação que se revelou, no passado, frágil. Esta proposta reforça ainda a governação financeira ao harmonizar os estatutos dos supervisores e ao dar força de lei a um conjunto de regras, nomeadamente ao nível da ética."
"Esta proposta para a reforça da supervisão prevê um reforço das obrigações de transparência e de prestações de contas, para que a Assembleia da República e o público tenham acesso a cada vez mais informação. Temos bem a consciência que não é uma proposta consensual, mas é uma proposta equilibrada, que importa retomar para o país ter uma melhor supervisão e também, por essa via, um sistema financeiro mais sólido, em que os portugueses confiem cada vez mais", remata.
Confira aqui o programa completo:
8h30 Receção dos participantes
8h45 Nota de Boas Vindas
Daniel Proença de Carvalho, Presidente do Conselho de Administração do Global Media Group
9h00 Nota de Abertura
Carlos Costa, Governador do Banco de Portugal
9h15 Sessão de Abertura
Keynote Speaker António Horta Osório, CEO do Llyods Bank
9h50 Momento solidário
10h00 DEBATE - Transparência e Boas Práticas em Portugal
António Ramalho, CEO do Novo Banco
Miguel Maya, CEO do Millennium BCP
Pablo Forero, CEO do BPI
Paulo Macedo CEO da CGD
Pedro Castro Almeida, CEO do Santander
Moderação: Rosália Amorim, Diretora do Dinheiro Vivo
11h30 Coffee Break
11h50 DEBATE - Reinventar a Banca no Mercado Global
John Liver, Partner de Financial Services, Compliance and Conduct Offer Leader da EY
Sessão de Q&A
13h00 Sessão de Encerramento
Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado Adjunto e das Finanças