Mortes pelo calor vão triplicar na Europa até 2100, caso se mantenham as atuais políticas climáticas
À TSF, o especialista Tiago Correia sublinha que as medidas para limitar o aquecimento global "demoram muito tempo a serem implementadas". É necessário "reorganizar os espaços urbanos" através de, por exemplo, "uma política energética que permita uma comodidade térmica" independentemente da estação do ano
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As mortes causadas pelo calor podem triplicar na Europa até 2100, caso se mantenham as políticas climáticas, passando das atuais 43 mil para 128 mil e afetando especialmente países como Portugal, Espanha, Itália ou Grécia, de acordo com um estudo.
A investigação da revista científica britânica The Lancet Public Health, divulgada na quarta-feira, recolhe dados de 854 cidades europeias e é a primeira análise detalhada dos riscos para a saúde decorrentes das temperaturas extremas na Europa.
O estudo sublinhou a necessidade de "reforçar as políticas para limitar o aquecimento global e proteger as regiões e os membros das sociedades mais vulneráveis" dos efeitos do clima.
É neste sentido que vai também o alerta de Tiago Correia, especialista em Saúde Pública do Instituto de Medicina e Higiene Tropical. Destacando que "há medidas importantes que precisam de ser discutidas e demoram muito tempo a serem implementadas", Tiago Correia fala "numa política de reorganização dos espaços urbanos associada ao envelhecimento da população", em declarações à TSF.
Ou seja, explica ainda que é necessário "ter cidades que sejam mais inteligentes para lidar com situações de frio extremo e de calor extremo" através de, por exemplo, "uma política energética que permita uma comodidade térmica" independentemente da estação do ano.
E quanto à saúde, o presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública, Gustavo Tato Borges, sublinha que o trabalho deve começar já "para proteger o futuro".
"Temos de começar a trabalhar agora nos jovens para que eles, que vão ser os idosos do futuro, tenham menos carga de doença e aqueles que têm doença que seja o mais controlado possível com um Sistema Nacional de Saúde que os acolhe, que os trata, que os vigia de uma forma adequada ao longo de todo o seu ciclo de vida", argumenta à TSF.
É preciso também avaliar os "impactos das variações térmicas" na saúde, defende Tiago Correia. É o caso da "deslocalização de mosquitos".
Mortes relacionadas com temperaturas extremas aumentará até 13,5% neste século
Nos últimos anos, a Europa registou alguns dos seus verões mais quentes, o que também resultou em elevadas taxas de mortalidade, especialmente entre os idosos, e prevê-se que o número de pessoas nestas faixas etárias aumente ao longo do tempo, de acordo com o estudo.
Com um aquecimento global de 3°C - com base nas atuais políticas climáticas - o número de mortes relacionadas com temperaturas extremas, frio e calor, que segundo o estudo provocam atualmente 407.538 mortes anualmente na Europa, aumentará até 13,5% neste século, principalmente entre pessoas com mais de 85 anos.
Atualmente, morrem oito vezes mais pessoas de frio do que de calor na Europa, mas a proporção de mortes causadas pelo frio e pelo calor "vai mudar drasticamente durante este século, com um aumento das mortes atribuídas às altas temperaturas em todas as partes da Europa", frisou Juan Carlos Ciscar, investigador do Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia (JRC), em comunicado.
As mortes provocadas pelo calor poderão aumentar das atuais 43.729 para 128.809 até ao final do século.
Em sentido inverso, no mesmo cenário, as mortes atribuídas ao frio poderão ser ligeiramente reduzidas: de 363.809 hoje para 333.703 em 2100.
As regiões do sul da Europa, como Portugal, Espanha, Itália e Grécia, serão as mais atingidas, com um aumento significativo das taxas de mortalidade por calor.
Em Portugal, por exemplo, o estudo projeta, no cenário de um aquecimento global de 3 °C, um aumento das mortes por calor de 1008 para 2284 por cada 100 mil pessoas até 2100 e um decréscimo das mortes devido ao frio, de 7345 para 4682.
Em contraste, países como a Noruega e a Suécia poderão registar um aumento das mortes por frio devido ao crescimento da população idosa, apesar dos declínios globais noutras regiões.
"Há uma necessidade crítica de desenvolver políticas mais específicas para proteger estas áreas e os membros da sociedade mais vulneráveis às temperaturas extremas", frisou o investigador do CCI, David García-León.
Apesar destas projeções alarmantes, os autores do estudo reconhecem limitações, como a possível sobrestimação das mortes porque os dados são baseados em áreas urbanas, onde as temperaturas são muitas vezes mais extremas do que nas áreas rurais e os resultados não têm em conta o género, etnia ou os efeitos nos bebés, que também são vulneráveis a temperaturas extremas.
