"Mulheres continuam a ser cidadãos de segunda e crianças de terceira." Grupo quer medicina da lactação na Ordem dos Médicos
Ouvida pela TSF, a pediatra Graça Gonçalves explica que, idealmente, deve haver um "desmame natural da parte da criança". Este é um processo que pode ocorrer entre os dois anos e meio do bebé e os quatro. Em alguns casos, pode ser aos sete anos. "Não é nada de outro mundo, mas é encarada como completamente aberrante"
Corpo do artigo
Um grupo de profissionais de saúde quer que a Ordem dos Médicos passe a ter a competência de medicina da lactação. O objetivo é reconhecer a amamentação como uma área clínica diferenciada, que tem um impacto muito significativo na saúde materna, infantil e pública.
Composto exclusivamente por médicos, este grupo sublinha que as políticas públicas continuam a não proteger, como devem, o aleitamento materno. E até na formação médica são precisas mudanças.
Ouvida pela TSF, a pediatra Graça Gonçalves, uma das subscritoras documento, explica que esta iniciativa pretende "dignificar a amamentação", demonstrando a sua importância e democratizando a informação disponível sobre este tema.
"Decidimos juntar-nos e criar esta especificação. Fizemos esta proposta de várias áreas, porque o conhecimento tem de ser transversal a várias especialidades, e aquilo que nos propomos é fazer com que mais colegas se interessem por esta área e tenham um conhecimento diferenciado", aponta.
A médica Graça Gonçalves assegura que a amamentação tem por trás "uma ciência", que tem tido um "grande incremento" nos últimos anos. Esta evolução tem feito com que os profissionais de saúde adquiram "conhecimentos de ordem teórica e prática", que tornam mais eficaz a ajuda prestada às mães. Lamenta, contudo, que a sociedade portuguesa não seja "pró-amamentação ou pró-criança".
Quando uma criança é amamentada, ela deverá, caso seja possível à mãe e à criança, ser amamentada até que deseje. Ou seja, que haja um desmame natural da parte da criança.
Acrescenta, contudo, que esse "desmame natural" se dá entre os dois anos e meio e os quatro anos. Mas é "normal" que essa prática se possa estender até aos sete anos.
"Não é nada de outro mundo, mas é encarada como completamente aberrante pela nossa sociedade", vinca.
Este grupo propõe-se, por isso, a dar voz às mães, mas sobretudo aos filhos, numa sociedade que se fundamenta em "princípios economicistas", que "nunca as beneficiam".
As mulheres ainda continuam a ser cidadãos de segunda e as crianças são cidadãos de terceira. Não se lhes dá valor e nem sequer são ouvidas
O anteprojeto do Executivo propõe limitar a dispensa para amamentação até aos dois anos da criança – atualmente sem limite – e exigir a apresentação semestral de atestado médico. Atualmente, só é exigido atestado quando a dispensa ultrapassa o primeiro ano de vida do filho.
