Exemplos de duas mulheres com doutoramento que ainda não estão nos quadros de nenhuma instituição.
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Bibiana Ferreira tem apenas 39 anos mas um vasto currículo. Depois de ter feito a sua licenciatura em biologia na universidade de Aveiro decidiu dedicar-se ao estudo do cancro. Passou pelo Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto (IPATIMUP) e fez o doutoramento em Madrid num dos centros de referência em oncologia com uma bolsa Marie Curie. Depois de cinco anos a fazer trabalho nas alterações cromossómicas decidiu ir para mais longe, para os Estados Unidos.
Em San Diego, junto ao mar, a investigadora concentrou-se a perceber como o metabolismo celular induz aos tumores. No instituto Salk por onde passaram pessoas de renome na investigação."Foi a casa de vários prémios Nobel, por isso tive o prazer de estar num sítio onde borbulhava a ciência", diz com um sorriso.
Apesar de gostar do local e de sentir que o seu trabalho era importante, Bibiana já regressou a Portugal. Só aqui teve que procurar uma bolsa de pós-doutoramento. Tanto em Espanha como nos Estados Unidos celebraram-lhe sempre contratos de trabalho.
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Há cerca de um ano, o Algarve Biomedical Center (ABC) convidou-a a criar e a ser responsável na Universidade do Algarve pelo laboratório que faz as análises à Covid-19. Ao mesmo tempo Bibiana Ferreira continua a dar aulas na Universidade do Algarve e a orientar alunos de mestrado e doutoramento.
Lamenta que apesar de haver cada vez mais mulheres na ciência, até mais do que homens, os cargos de chefia habitualmente sejam para eles. No entanto, é otimista e acredita que um dia esse padrão vai mudar. " Todas as alterações demoram a ter efeito mas a quantidade de mulheres que existem na ciência, a fazer mestrados e doutoramentos é superior aos homens e isso tem que se refletir nos cargos de chefia"
Aos 54 anos investigadora ainda vive com bolsas de investigação
Nos enormes tanques da estação de piscicultura do Instituto do Mar e da Atmosfera (IPMA) em Olhão, nadam douradas, robalos, corvinas e também sardinhas. Esta última espécie é agora um dos mais novos projetos em que está envolvida a investigadora Florbela Soares. " Ainda hoje vamos fazer uma amostragem a um dos ensaios que estamos a terminar em que trabalhamos a nutrição, que alimento devemos dar às sardinhas", explica.
Florbela fez o doutoramento logo após ter terminado a licenciatura na Universidade do Algarve e, quase a completar 54 anos, tem andado de bolsa em bolsa de investigação.
Há uns anos candidatou-se ao IPMA através do concurso Ciência 2008. Ficou no lugar mas até hoje ainda espera integrar os quadros. Continua com uma bolsa, na condição de cientista convidado.
"O processo [de integração] começou em 2017, estamos em 2021 e ainda ninguém me garantiu que vai ser este ano", lamenta.
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A investigadora considera que a instabilidade já se tornou um modo de vida." Quem tem 54 anos e se encontra na situação de "renova bolsa, não renova, escreve projeto para ter contrato", é uma instabilidade". No entanto, tenta desvalorizar " Temos que conseguir viver bem com isto, senão não vivemos".
O grupo que faz investigação ao seu lado é quase na sua totalidade constituído por mulheres.
Quando lhe pergunto se notou ao longo do tempo alguma discriminação pelo facto de pertencer ao género feminino apresenta um exemplo de uma empresa a que se candidatou. " Sugeriram um homem porque consideraram que faria melhor esse trabalho", conta. A situação acabou por se reverter e foi Florbela quem ficou com o cargo. Simplesmente porque já tinha o doutoramento e mais habilitações do que o seu concorrente. Mas até hoje nem essas habilitações lhe serviram para integrar os quadros de um Instituto de investigação em Portugal.