"Não perdemos apenas paisagem. Arde também o futuro do Parque Natural do Alvão"
Em declarações à TSF, antigo responsável pela organização da Serra do Alvão pede ao Governo que pense na "gestão florestal de uma forma menos económica e mais conservacionista"
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O antigo técnico coordenador da gestão partilhada da Serra do Alvão André Brito sublinha que o incêndio que lavrou em Vila Real e Mondim de Basto não representa apenas uma perda de paisagem, mas também do "futuro do Parque Nacional do Alvão".
Com cada incêndio que temos tido nos últimos anos, não perdemos apenas paisagem. Arde também o futuro do Parque Natural do Alvão.
Em declarações à TSF, André Brito lamenta que o país esteja a "assistir em silêncio a uma perda irreversível de um património que dificilmente voltará a ser aquilo que era". Sustenta ainda esta afirmação ao explicar que, por ser a área protegida mais pequena do país, o Parque Natural do Alvão tem "todos os valores naturais bastante concentrados", o que o torna "valioso".
"A zona que está a arder é uma zona de montanha, onde existem habitats muito significativos e um conjunto de espécies também elas bastante importantes que estão em causa com estes incêndios e com outros que houve. Apesar de parte serem zonas de mato, são também zonas que promovem a transição de algumas espécies de uns locais para outros, portanto, zonas de corredores ecológicos, onde grande parte de espécies de invertebrados depositam os seus ovos", argumenta.
Detalha ainda que estão inventariados naquele parque "cerca de 400 espécies de flora e mais de 200 espécies de vertebrados", sendo que 44 estão até inscritas no Livro Vermelho dos Vertebrados. A par disto, um dos animais mais icónicos que lá habitam é o lobo-ibérico, cujas populações são "mais estáveis" na zona do Alvão. Mas também a borboleta azul terreiras, que é uma espécie "muito rara e que só ocorre naquela área em Portugal".
O técnico lamenta, por isso, a quebra destas "barreiras ecológicas" devido às chamas, que põem em causa, mais uma vez, "a continuidade da expansão" destes animais.
Cada incêndio acaba por usar um bocadinho mais do património natural. Há sempre coisas que não recuperam (...). Vamos ter de esperar mais alguns anos para que a vegetação volte a crescer, para que haja condições necessárias para algumas espécies voltarem a ocorrer.
O antigo responsável pela organização da Serra do Alvão apela, por isso, para que o Governo comece a prestar atenção à "conservação da natureza e do património natural do país". Pede igualmente uma "estratégia coerente a longo prazo" para resolver esta questão.
"Qualquer ação que façamos agora provavelmente só terá efeitos práticos e bastante visíveis daqui a 20 anos. Acabamos por andar sempre aqui um bocadinho com remendos, e os remendos acabam por dar nestas situações. Pensar na gestão florestal de uma forma menos económica e mais conservacionista", sugere.
O incêndio que lavrava em Vila Real desde sábado e que teve início em Sirarelhos e serpenteou a serra do Alvão, passando por várias aldeias, até passar para o concelho de Mondim de Basto, atingindo área do Parque Natural do Alvão, foi dado como dominado esta quarta-feira de manhã. Por agora, ainda não há informação sobre a área ardida no Parque Nacional do Alvão.
