A intenção passa por saírem às ruas esta sexta-feira, de forma pacífica, para darem a conhecer as suas reivindicações. A dois dias da data marcada para os protestos, ficamos a conhecer as intenções do movimento que se inspirou nos coletes amarelos franceses.
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Prometem parar Portugal a partir das 7h da manhã desta sexta-feira. Os pontos de encontro estão definidos e as reivindicações circulam através de um manifesto no Facebook. À TSF, a porta-voz do Movimento Coletes Amarelos Portugal (MCAP) explica que o objetivo do grupo é fazer com que o Governo tome ações.
"Queremos que os nossos governantes nos ouçam e tomem medidas face ao que tem sido exposto há alguns anos e que tem feito o comum mortal ficar com as condições de vida neste momento tem. Não são boas a nível geral, e por isso é que temos a adesão que temos tido", explica Ana Vieira.
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O movimento inspira-se nos protestos dos "gillets jaunes" franceses e nas reivindicações dos mesmos e apresenta-se no Facebook como "pacifico, apartidário, sem fins lucrativos e de União." A ideia é, como se lê nos grupos do Facebook, juntar todos os "que estejam insatisfeitos com os variados problemas da atualidade."
Ana Vieira garante que a inspiração nos franceses não diz respeito às reivindicações mas sim ao "simbolismo do colete e à união que isso representou."
Por esta altura existem, além do MCAP, outros movimentos e alguns deles prometem causar desacatos, grupos esses que não serão apoiados por este movimento. "Queremos que tudo seja pacífico, não somos adeptos nem vamos apoiar os grupos de desacato que irão lá estar com certeza", garantiu à TSF.
Aos grupos violentos podem ainda juntar-se questões políticas, algo que também não deverá ter lugar neste protesto. "Vamos tentar dissuadir qualquer atitude dessas. Relativamente às questões políticas de direita e de esquerda, aquilo que tenho a dizer é isto: se há motivo forte o suficiente para que o povo português se levante, nada tem a ver com a cor da camisola", defende Ana Vieira.
Em Lisboa, o MCAP vai promover uma marcha lenta na ponte 25 de Abril e pretende também fazer uma manifestação entre o Marquês de Pombal e a Assembleia da Republica, mas estão a ser agendadas mais manifestações noutros locais do país. Na página do Facebook do movimento surgiu, esta terça-feira, o mapa das concentrações desta sexta-feira.
"Queremos fazer uma marcha pacífica de forma a que os nossos governantes vejam o número real de pessoas que neste momento está deveras descontente", explica. "Contamos com uma adesão muito grande, porque este é um mal geral". O objetivo dos organizadores é que "todos saiam à rua" sem que exista qualquer tipo de destruição.
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"É preciso que a exploração das massas acabe. Existem fortunas à conta da exploração de terceiros. Este é um exemplo, mas existem centenas de outros pontos", que estão presentes no manifesto deste movimento. (Foi publicada uma nova versão deste manifesto poucos minutos depois das 18h, a partir da qual esta notícia foi atualizada)
As intenções são, segundo o documento, "dar voz aos portugueses de forma unânime e organizada" e exigir um "Estado com mais rigor e uma democracia mais transparente na qual possamos confiar e melhores condições", isto sem que seja tolerado qualquer tipo de violência e vandalismo ou sejam causados quaisquer danos pessoais ou a terceiros.
Os problemas identificados em Portugal vão da forma de organização do Governo à quantidade de impostos cobrados, passando pelo valor do salário mínimo. No entanto, o assunto que causa mais revolta nas redes sociais é expresso numa só palavra, escrita e lida vezes sem conta nos grupos do Facebook afetos ao movimento: "corrupção".
As reivindicações uma a uma:
São oito as reivindicações apresentadas pelo "Movimento Coletes Amarelos Portugal" (MCAP) no manifesto que faz circular pelas redes.
O primeiro ponto diz respeito à "redução de taxas e impostos", entre eles o IVA/IRC, a "concessão de incentivos, fiscais e outros, para as micro e pequenas empresas poderem pagar, com a correspondente taxação às grandes empresas e multinacionais, com base na sua margem de lucro", o cancelamento do Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP), a "redução para metade do IVA sobre combustíveis e gás natural" e, por fim, a "redução das taxas sobre a eletricidade, com incidência sobre as taxas de audiovisual e de emissão de dióxido de carbono". A estas intenções junta-se a vontade de "acabar com as comissões bancárias" e não só colocar um fim na "injeção de capital em bancos privados" como também "exigir que seja reposto o que foi retirado."
O salário mínimo é o ponto central da reivindicação seguinte: o MCAP pede um aumento imediato para os 700 euros, indicando que para isso basta "proceder ao corte nas pensões acima de 2.000 euros." Na versão final do documento, o movimento não indica qualquer valor para o salário mínimo nem sugere qualquer corte.
Na senda dos aumentos, também o subsídio de desemprego é mencionado, sendo pedido o aumento não só do seu valor como também da sua vigência. Mais uma vez, é indicado que para isso basta "proceder ao corte nas pensões milionárias acima de 5.000 euros." Mais uma vez, na versão final não é indicado qualquer valor, pedindo-se apenas a "revisão dos valores de subsídio de desemprego, rendimento mínimo e rendimento de reinserção, passando pela discussão com representantes próximos das populações e que procedam a uma análise rigorosa das necessidades e rendimentos reais."
Também as pensões e reformas devem, na ótica do MCAP, ver aumentos: querem ver a pensão mínima aumentar para os 500 euros, referindo que para possibilitar esse aumento basta "proceder aos cortes/medidas acima referidos." A estes cortes, junta-se ainda a intenção de impor aos políticos a reforma aos 66 anos de idade, isto porque "a política não é uma carreira". No documento final é eliminado o valor de 500 euros, sendo que o movimento pede apenas que se procure "diminuir as disparidades nas pensões de reforma, com especial atenção às pensões mais baixas, que têm que permitir o acesso com dignidade aos bens essenciais e recompensar justamente quem trabalhou e se sacrificou pelo país."
É no quinto ponto que surge a palavra "corrupção" e as medidas propostas para o seu combate. O MCAP quer - e escreve-o em letras maiúsculas - a "adoção imediata de medidas visíveis e expressas de combate contra a corrupção no Governo, na Administração Pública, nos serviços públicos" e nos setores empresarial e bancário. E como deve, então, ser feito o combate a esta corrupção que custa, nas palavras dos próprios, "18 mil milhões de euros aos contribuintes"?
Entende o movimento que é preciso criar um Código Penal "mais rigoroso" e investir na criação de "unidades especializadas independentes na prevenção e combate à corrupção". É a partir daqui que vão sendo esmiuçadas outras das questões que os coletes amarelos associam ao problema, entre eles o das falsas presenças. Para o resolver, propõem a "redução para metade do número de deputados" na Assembleia da República e a "adoção de sistemas biométricos/leitura ótica/etc para registo de assiduidade/presença no Parlamento."
Os temas relacionados com os deputados não param por aqui e a questão das "falsas moradas" é também mencionada. O movimento quer ver a questão "sob escrutínio público" e com "obrigação de reembolso". Por último, e numa espécie de resumo de intenções, os responsáveis pelo protesto pedem o fim das "mordomias de toda a classe política portuguesa".
Este é também o ponto que sofre mais alterações na versão final do documento. Nela, o movimento acrescenta que quer a "averiguação e comunicação imediatas às populações dos gastos de toda a classe
política portuguesa." Quanto Código Penal, além da criação de unidades especiais de combate à corrupção, entendem também que é necessária a "investigação e punição efectivas de todos os crimes de corrupção, passados e futuros", bem como a "responsabilização criminal dos actos de gestão danosa e corrupção" acrescentando que deve ser vedado a pessoas "julgadas e condenadas por corrupção o acesso a cargos políticos e públicos."
Também a Lei Eleitoral é alvo de alterações em relação à primeira versão do documento: mantém-se a intenção de ver reduzido para metade o número de deputados e acrescenta-se a intenção de que a eleição seja feita por voto direto. Fora da Assembleia da República há mais alterações: o MCAP pretende "reduzir do número de Ministros e Secretários de Estado" e a criação de "regras explícitas e transparentes acerca dos direitos e deveres" não só dos membros do Governo e da Assembleia da República, mas de todos os elementos pertencentes às classes políticas.
No que diz respeito à apresentação de contas, o movimento acrescenta que quer que sejam reveladas as "despesas com os órgão do Estado, parcerias público-privadas, instituições e todos os organismos que de uma forma ou outra dependem das contribuições dos cidadãos." Neste ponto, os coletes mantêm a intenção de impor uma reforma aos 66 anos para os políticos e o "fim imediato/corte" das suas subvenções vitalícias.
Na versão finalizada, o MCAP abre um novo ponto que pretende ver aplicado a toda a população portuguesa e que se prende com "recompensar com justiça todos os trabalhadores que prestam serviços de auxílio às
populações", "descentralizar e dotar de infraestruturas adequadas as populações menos favorecidas e que vivem longe dos centros urbanos" e ainda garantir o fornecimento de "serviços de saúde e de educação gratuitos e de qualidade."
O Serviço Nacional de Saúde é outro dos organismos para o qual se pedem mudanças, isto porque o mesmo " não consegue, atualmente, prestar um serviço de qualidade." Alegando que o SNS é controlado pelos lóbis "da indústria farmacêutica e da clínica privada", os coletes pedem o fim da "prática antagónica existente entre as necessidades do doente e os lucros da indústria farmacêutica" e entre "o valor de uso e o valor de troca dos medicamentos, face ao poder de compra dos Portugueses". Tudo isto deve, lembram, contribuir para "Impedir o enriquecimento pessoal de políticos que servem os interesses da indústria farmacêutica".
Abordam-se, de seguida, os setores primário e secundário, "destruídos por sucessivos governos incompetentes." Propõe o movimento que o setor primário veja criadas condições "para que a produção e exportação das matérias-primas passem a ter um valor agregado", tomando como exemplo os produtos industrializados, "com o devido controle da qualidade de produção, através da exploração de verdadeiros recursos da natureza."
No que diz respeito ao setor secundário, o MCAP lembra a importância económica do mesmo, principalmente "do lucro obtido na comercialização, que poderá ser significativo para o nosso País." Os responsáveis entendem que "países com um bom grau de desenvolvimento possuem uma significativa base económica concentrada no setor secundário", pelo que a exportação ganha importância redobrada.
O último ponto das reivindicações prende-se com o setor imobiliário e o direito à habitação. "Acabar com a especulação imobiliária" e reverter a penhora de imóveis, por parte da banca, "a famílias com rendimentos abaixo dos 10.000 euros por ano" são as duas questões identificadas como prioritárias.
Notícia atualizada às 19h01 de acordo com a versão final do manifesto do MCAP