Nunca houve tão poucas adesões ao programa Aldeia Segura. Responsáveis pedem investimento do Governo
O presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais reconhece que o Governo está em funções há pouco tempo e tem muitos fogos para apagar, mas espera que haja dinheiro para o programa, no orçamento para 2025
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O programa Aldeia Segura, que nasceu depois dos grandes incêndios de 2017, registou no ano passado o menor número de novas aldeias aderentes. Em 2022 entraram 160 e, no ano passado, apenas 12 aldeias aderiram a este projeto de prevenção de incêndios.
É o que consta do relatório anual da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (AGIF), relativo a 2023, ao qual a TSF teve acesso.
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Tiago Oliveira, o presidente da AGIF, lembra ao Governo que é preciso investir neste programa Aldeia Segura.
"O foco da prevenção tem que ser, de facto, com orçamentos ou com capacidades, tem de ter uma prioridade política. O projeto arrancou bem e agora está numa fase em que necessita de ser reenergizado. As prioridades políticas traduzem-se nos orçamentos, traduzem-se na mobilização dos recursos para o fazer. Há cerca de 2600 aldeias envolvidas, de entre sete mil. Se calhar agora é necessário chegar a outros sítios, é necessário aumentar aqui a envolvência. O reforço da prioridade é política, institucional e local. O país entende os méritos do programa e, portanto, tem de se promover, quase como sem mancha de óleo, os benefícios", explicou à TSF Tiago Oliveira.
O responsável reconhece que o Governo está em funções há pouco tempo e tem muitos fogos para apagar, mas espera que haja dinheiro no Orçamento do próximo ano.
"Certamente virá o tempo em que na orçamentação para 2025 vão priorizar estes projetos, tenho essa perspetiva. O projeto tem méritos, tem oportunidades. A Proteção Civil saberá quais são as oportunidades mais relevantes para estimular e, portanto, acredito que no próximo orçamento vá ser reforçada esta dimensão", admitiu o presidente da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais.
Tiago Oliveira considera ainda fundamental concretizar um novo programa lançado com dinheiro do Plano de Recuperação e Resiliência e que pode complementar o projeto Aldeia Segura. Chama-se Condomínio de Aldeia.
"É um programa que foi lançado pelo Governo anterior no âmbito do PRR e que envolve cerca de 20 milhões de euros para envolver cerca de 60 aldeias para que, em redor destas mesmas aldeias, os terrenos abandonados não tenham só a relação natural de pinhal, eucaliptal ou de matos, mas sim se recuperem usos tradicionais ou usos mais modernos com culturas agrícolas que, numa lógica sustentável, seja paga aqui a arroteia desse terreno, ou seja, tirá-los do mundo do mato e do mundo da não gestão para o mundo da gestão, plantando feijões, tomates e medronhos, outros tipos de culturas que
sejam rentáveis e façam um cordão verde, sempre verde, digamos assim, à volta da aldeia, colocando a ameaça do fogo longe", explicou.
Mais aldeias aderentes em Viana do Castelo
Viana do Castelo é um dos concelhos que vai à frente, na concretização do programa Aldeia Segura. Só este ano, já aderiram 7 novas aldeias e o comandante da Proteção Civil Municipal espera que várias outras entrem, até ao final do ano, para este projeto que prepara as populações para atuar em situação de incêndio.
Uma das 7 aldeias isoladas e em situação de maior risco que já estão a participar é Fincão, na freguesia de Areosa. António Cruz, que lidera a proteção civil do concelho de Viana do Castelo, diz que este programa Aldeia Segura só funciona conhecendo todos os que lá vivem.
"Sabemos quantas pessoas tem cada aglomerado urbano, sabemos, inclusive, que pessoas têm dificuldades motoras, de mobilidade reduzida ou mesmo completamente imobilizadas. Sabermos onde está cada pessoa dessas, sabemos como lá chegar. Temos tudo numa base, seguindo o sistema de informação geográfica. Tudo isto é o trabalho de semanas. Foram semanas de trabalho, de contato direto com as pessoas e depois aparece também um oficial de segurança com a colaboração das juntas de freguesia que nos permite ter o território coberto e sabermos que as pessoas estão sensibilizadas e, acima de tudo, sabem os procedimentos numa situação de realidade", afirmou à TSF António Cruz.
O comandante está convencido que o Aldeia Segura é decisivo na proteção das populações, mas sublinha que este é um trabalho com pessoas a tempo inteiro.
"É preciso ter gente, gente dedicada em exclusivo a esse tipo de trabalho. Isto não pode ser um part-time, tem que ser full-time, as pessoas todos os dias a debruçarem-se sobre isso porque depois é preciso voltar atrás. Há mudanças, há pessoas que entram, que saem, os aglomerados mudando e nós temos essa base de dados que tem de ser atualizada e só com gente a tempo inteiro", sublinhou o comandante.
Carlos Tinoco é oficial de segurança, uma espécie de “comandante local”, e não duvida da importância do programa para as populações.
"Tenho a certeza que sim, porque temos os números das pessoas, os números de telefone. Em caso de incêndio descontrolado podemos chamar as pessoas ou contactar familiares, caso as pessoas não respondam, para nos reunirmos no ponto de encontro e assim controlamos a população. Nesta zona aqui temos uma pessoa acamada que está identificada", acrescentou à TSF Carlos Tinoco.
A resposta da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil
O programa Aldeia Segura foi criado após os grandes incêndios de 2017, com o objetivo de capacitar as populações a defenderem-se em caso de fogo, mas também a prevenir que as chamas lhes batam à porta. É um programa da responsabilidade da Proteção Civil Nacional.
Numa resposta à TSF, a ANEPC afirma que mais de uma centena de aldeias quiseram, em 2023m aderir ao plano, mas não cumpriam os requisitos, pelo que tiveram de ficar de fora.
A autoridade nacional de emergência e proteção civil afirma que são 113 casos em que não existiam, por exemplo, locais que pudessem funcionar como abrigos, nem pessoas disponíveis para assumir o papel de comandante local. Apenas 12 aldeias preencheram todas as exigências e é esse o número de novas aldeias que entrou para o Aldeia Segura em 2023, conforme consta do relatório anual da Agência para a Gestão Integrada de Fogos rurais.
Nunca desde que foi criado havia tão poucas aldeias a aderir a este programa de segurança contra incêndios.
A ANEPC revela ainda que, até à data, em 2024, já aderiram ao plano 30 aldeias.
