O PCP está a "interpretar movimentos sociais" atuais com "ideologia do século XIX"
Dos anos da fundação aos desafios da atualidade. Como nasceu e "para que serve", hoje, o Partido Comunista Português, no novo livro do historiador Adelino Cunha.
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Historiador, investigador e professor de História Contemporânea, Adelino Cunha escreveu "A Ascensão ao Poder de Cavaco Silva; "António Guterres - Os Segredos do Poder", mas também "Os Filhos da Clandestinidade"; "Júlio de Melo Fogaça, biografia"; "Álvaro Cunhal - Retrato Pessoal e Íntimo" e agora "Para que Serve o PCP? Os anos da fundação."
São 208 páginas que resultam de "uma década de investigação" sobre o partido. O autor estende a fita do tempo: dos anos da fundação, aos desafios da atualidade.
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"A ideia deste livro é perceber acima de tudo porque é que o Partido Comunista Português (PCP) existe. E nós às vezes perdemos isso de vista. É um partido centenário, que passa 48 anos organizado contra a ditadura. O ponto de partida é perceber como é o PCP surge, tentando depois extrapolar alguns daqueles que são os desafios que o PCP tem hoje em dia. Desafios contemporâneos", explica o autor, em entrevista à TSF.
Como é que o partido pode começar a interpretar os movimentos sociais com a ideologia do século XIX?
"O PCP tem uma identidade muito fixa. Se deixar de estar dentro do movimento operário corre o risco de entrar em refluxo. Mas o desafio contra também se aplica. Se o PCP se quiser adaptar demasiadamente fácil ao mundo contemporâneo perde a sua identidade", considera Adelino Cunha.
O autor deixa uma "única crítica" ao partido: "Como é que o partido pode começar a interpretar os movimentos sociais com a ideologia do século XIX? Hoje, os movimentos sociais são muito mais fragmentados e intermitentes. Como é que o PCP pode mobilizar este mercado de trabalho, quando o mercado de trabalho recusa esta agregação ideológica?", realça.
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O PCP já soprou as velas mais de uma centena de vezes. Resistiu à ditadura do Estado Novo, ao impacto da queda do Muro de Berlim e ao colapso da União Soviética. Em Portugal, o PCP tem perdido representação parlamentar e autárquica, mas a queda não tem sido tão significativa quando comparada com outros partidos comunistas no mundo. Adelino Cunha traça a receita do "sucesso": "O sucesso do PCP, no sentido de ir aguentando estes refluxos, tem a ver com ser um partido marxista-leninista fortemente enraizado na classe operária".
"No dia em que o PCP deixar de ter esta componente, deixará de ser o PCP que conhecemos", acrescenta.
No dia em que o PCP deixar de ser marxista-leninista, deixará de ser o PCP que conhecemos
Para a pergunta que dá nome ao livro "Para que serve o PCP?", o autor não tem resposta, mas considera que o livro serve para "debater sobre os partidos políticos que têm uma meta narrativa". "Serão esses partidos políticos capazes de explicar o mundo contemporâneo?", questiona o autor.
Em entrevista ao programa "Em Alta Voz" da TSF e do DN, o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, realçou que o partido "não quer ser acessório do PS". Para Adelino Cunha, nos anos da geringonça, o PCP "não cedeu no essencial". O partido "não cedeu no programa político" nem na "própria identidade histórica e centenária".
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"O PCP viabilizou o Governo, creio eu, na convicção de que seria melhor influenciar o Partido Socialista, do que deixar que a direita governasse. Pagou caro esse preço. Mas o partido vai ter sempre esse dilema: como é que pode influenciar as políticas do Governo se está em refluxo eleitoral", conclui.
O livro "Para que serve o PCP?" é apresentado no dia 5 de dezembro, às 19h00, no El Corte Inglês, em Lisboa.