A história do homem que é já uma lenda na Nicarágua.
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Ernesto Cardenal, 94 anos, foi suspenso a divinis, há 35 anos, pelo Vaticano, por pertencer, em 1979, ao governo sandinista de Daniel Ortega, na condição de ministro da cultura.
Em 1984, aquando da visita papal de João Paulo II à Nicarágua, o papa polaco repreende-o, publicamente, de dedo em riste, ordenando-o regularizar a sua situação na Igreja. Miguel Escoto e Fernando Cardenal, também sacerdotes, são seus companheiros de luta no governo revolucionário, entretanto falecidos, levaram igual pena. O Vaticano, ao tempo, era conduzido por um pontífice de pendor estalinista.
Ernesto Cardenal, poeta, escultor, licenciado em Filosofia, aos 32 anos, abandona os caminhos boémios dos tempos do ditador Somoza, e dá entrada no mosteiro trapista de Kentuky, nos Estados Unidos, ao lado de Thomas Merton, renomado mestre de espiritualidade mística. Cardenal perdia-se, então, com a poesia de S. João da Cruz e do teólogo Teilhard de Chardin.
A decadência do povo nicaraguense levou Cardenal a decisões proféticas. Andavam por ali as sombras da Teologia da Libertação, que o Vaticano nunca entendeu e perseguiu, vigorosamente.
Francisco, o primeiro papa latino-americano conhecia o caso de perto e, por estes dias, soltou a decisão. Envolve na cena, o Núncio Apostólico, em Manágua, Estanislau Sommertag, curiosamente polaco como Karol Wojtyla. Discretamente, ordena ao seu diplomata que comunique ao padre rebelde que, a partir daquele momento, estava absolvido de todas as censuras canónicas impostas. E foi prostrado numa cama do hospital da capital do país, a padecer duma crise renal, que, de estola aos ombros, símbolo do poder presbiteral que lhe tinha sido sonegado por Roma, concelebrou missa com o bispo auxiliar de Manágua, D. Sílvio Baez. Não foi sem surpresa que o prelado nicaraguense se abeirou do antigo ministro de Ortega e lhe disse: "Peço a sua bênção como sacerdote da Igreja Católica."