O sínodo que enfrentou a reforma da Igreja Católica que Francisco pretende ainda fazer
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O padre Paulo Terroso nasceu em Argivai, na Póvoa de Varzim, em 1978. É padre da Arquidiocese de Braga, tendo sido ordenado em 2003. Actualmente é reitor da Basílica dos Congregados, diretor de Comunicação da Arquidiocese de Braga e administrador do jornal Diário do Minho. Em 2021, foi nomeado membro do sínodo dos Bispos e colaborou nas duas sessões da XVI Assembleia Geral Ordinária do sínodo dos Bispos.
Em entrevista à TSF, o sacerdote bracarense defende que o último sínodo dos Bispos foi a aposta maior do papa Francisco, que marcará, definitivamente, a reforma que o chefe da Igreja Católica pretende ainda fazer. A sinodalidade é um modo de ser Igreja, depois do Concílio Vaticano II. Os sínodos foram criados em 1965, pelo papa Paulo VI.
Mas este sínodo apresenta uma razão especial. O padre Paulo Terroso começa por dizer que esta reunião quis ser a voz do povo de Deus. Como quem consulta as bases. E isso aconteceu.
As questões fracturantes
Há então eixos novos na rotação da Igreja? Paulo Terroso responde que foram observados neste sínodo novos caminhos de ser Igreja.
Que trato foi dado às questões fracturantes, como o celibato e a ordenação de mulheres?
A Igreja não perdeu de rumo essas questões, mas carregou-as para um maior amadurecimento e a Igreja Católica não tem só de lidar com a sensibilidade da Europa, mas também as sensibilidades a África e da Ásia, que não têm os mesmos instrumentos de reflexão
Como responde o sacerdote director de informação na Arquidiocese de Braga à acusação das mulheres de que a Igreja foi sempre pensada por homens?
Este é um tempo que não é fácil, apesar da história respeitar a grandeza das mulheres dentro da Teologia, como pensadoras e muitas habitadas pela santidade. O papa quer abrir portas neste caminho, mas ainda muito pouco foi andado.
A voz das vítimas
E os abusos sexuais a menores foram abordados com o rigor necessário?
O sínodo teve a oportunidade de ouvir uma das vítimas. Foi o testemunho que mais me impressionou, pela falta de luz e de esperança. Também foi claro que há pouca informação e diálogo, por parte da Igreja, na sua relação com as vítimas. A verdade é que já não se pode esconder esta realidade e o papa Francisco continua a defender tolerância zero. Com os imigrantes, o papa Francisco teve sempre a maior proximidade. Foi ele que estigmatizou o mar mediterrâneo como o maior cemitério dos nossos tempos. Temos de ter atenção à diabolização deste tema e à política [que] nem sempre percorre as melhores saídas. É também destes dias, as fogueiras acesas nos bairros sociais. Não podemos permitir uma política de terra queimada, mas não devemos isolar as forças de segurança.
O eterno clericalismo
Uma questão pertinente no sínodo foi a do clericalismo. Terroso refere que essa questão passa “pelos seminários, onde não se devem criar príncipes, mas servidores da Igreja. As casas grandes, que são os seminários, terão de converter-se em casas pequenas, mais personalizadas. Nestas matérias também não podemos ser os donos disto tudo”.
Como lidar com as finanças e a prestação de contas numa Igreja que tem uma filosofia financeira medieval?
Segundo o padre Terroso, a resposta terá de passar pela “transparência”. O sínodo foi muito claro nessa determinação. É preciso não banalizar o dinheiro que é, muitas vezes, "pertença dos mais pobres".
Como se liga a Igreja católica com a democracia que não pratica, por exemplo, na eleição secreta dos bispos?
A questão não foi esquecida. São muitos séculos de história, mas não se esqueça que o papa Francisco é um sinal novo, diferente do passado, com gestos surpreendentes.
Escutar é, pois, o verbo do Vaticano neste tempo?
É na escuta mútua que nós ouvimos a voz de Deus.
A montanha pariu um rato?
Depois do ritmo que o papa imprimiu ao sínodo, não podemos dizer que a montanha pariu um rato. Esta foi uma questão posta ao Secretário-Geral do Sínodo.
O sínodo foi ainda classificado, pelo padre Terroso, como se de um parto se tratasse: “Foi um nascimento de uma nova vida. Verificou-se, em síntese que, pela primeira vez, na Igreja, o povo de Deus foi escutado. Para mim, a participação no sínodo foi um presente que Deus me deu.”