Observatório de Segurança Interna questiona RTP e patrocinadores sobre cartoon "vergonhoso"
Organização defende que a animação "Carreira de Tiro" tem "caráter duvidoso" e faz uma "acusação velada de racismo e xenofobia" a todos os elementos das forças de segurança do país.
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O Observatório de Segurança Interna (OSI) questionou este domingo a direção da RTP, a Everything is New (organizadora do NOS Alive) e os patrocinadores responsáveis acerca da transmissão de um cartoon que defende ser "uma acusação velada de racismo e xenofobia a todas as mulheres e homens das forças de segurança portuguesas, sem exceção".
Em causa está uma animação transmitida na RTP, chamada "Carreira de Tiro", com cerca de 50 segundos de duração e em que se vê um polícia de perfil a disparar uma arma com cada vez maior intensidade, verificando-se no fim que tinha à sua frente alvos de cores diferentes e que quanto mais escuros, mais buracos de bala apresentam. O "boneco" visível no pequeno filme de animação enverga uma farda azul, um coldre, e são visíveis apenas as letras "POL" escritas no peito da farda.
Por ver este cartoon como um vídeo de "caráter duvidoso" e "com teor de xenofobia contra a própria classe policial", que permite a deterioração "do poder de autoridade destas mulheres e homens, na representação do próprio Estado", o OSI questiona a RTP, a organização do NOS Alive e os patrocinadores sobre se "estão de acordo" com o seu teor, sobre se o patrocínio foi "dado conscientemente" e sobre se vão "demarcar-se publicamente", apresentando um "pedido de desculpas formal".
Num comunicado enviado à TSF, o OSI defende que no conteúdo "não há lugar ao sentido de humor, nem à liberdade de expressão" e que este é apenas uma acusação "gratuita, vil e implícita ao racismo/xenofobia na classe policial, de forma generalizada".
Os responsáveis pelo observatório defendem também ser "vergonhoso" que a RTP, enquanto canal público, "compactue com a obscenidade de catalogar" todos os polícias e escreve que "é sabido" que a "ínfima minoria dos agentes" que apresentam comportamentos semelhantes aos do cartoon "têm sido objeto de processos criminais, e disciplinares, muitos deles com condenações".
Este domingo, o presidente do CDS-PP criticou o ministro da Administração Interna por não ter defendido a honra das forças policiais após a transmissão da animação. Numa mensagem publicada na rede social Facebook, Nuno Melo defende que, "na televisão pública, polícias que representam o Estado foram difamados como racistas que descarregam as armas em função da cor da pele".
No sábado, o PSD questionou o Conselho de Administração da RTP sobre o mesmo cartoon, considerando que "atenta de forma evidente e infeliz contra a imagem e o bom nome" das instituições policiais.
Também no sábado, o Sindicato Nacional da Carreira de Chefes (SNCC) da PSP anunciou que apresentou uma queixa-crime contra os autores do cartoon e também contra a RTP por o ter emitido, considerando que "há, inequivocamente, uma intenção de vilipendiar todos os polícias, retratando-os como xenófobos e racistas".
"Tem a ver com a ocorrência em França"
Contactado pela Lusa, o ilustrador André Carrilho, cofundador, juntamente com João Paulo Cotrim, do Spam Cartoon - responsável pelo cartoon em questão -, considerou que a queixa "não faz sentido", uma vez que o 'cartoon' "não tem nada a ver com a PSP nem com a realidade portuguesa".
"Nós trabalhamos para a RTP desde 2017 e o 'cartoon' é sempre feito num contexto de atualidade nacional e internacional, neste caso é internacional. Tem a ver com a ocorrência em França, da morte de um jovem francês às mãos da polícia que depois deu origem a vários tumultos pelo país inteiro", explicou André Carrilho.
Por sua vez, fonte oficial da RTP disse à Lusa que "o Spam Cartoon é um exercício de opinião livre sobre a atualidade nacional e internacional que a RTP acolhe desde 2017", sendo da autoria de "alguns dos mais reconhecidos cartoonistas portugueses".
"Em nenhuma circunstância serviu para instigar à violência contra quem quer que seja. Os valores da liberdade de expressão e de opinião são basilares da democracia e do serviço público da RTP", salientou o canal de televisão.