Pagamento de 15.º mês sem tributação? CIP acredita que vai avançar, CGTP e UGT chumbam proposta
As propostas dos patrões para aumentar salários e melhorar a situação dos trabalhadores e do país subiram a debate no Fórum TSF.
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O presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) acredita que as propostas que tem feito vão acabar por avançar. Os patrões defendem que o pagamento de um 15.º mês aos trabalhadores é um bónus para tornar as empresas mais competitivas, atrair os melhores e reter talento. No Fórum TSF, Armindo Monteiro afirma que conta com a ajuda do Estado.
"Se agora se decidisse que as empresas iam aumentar todos os trabalhadores 1000 euros, sabe quanto é que as empresas tinham que pagar? Tinham que pagar 2300 euros para que o trabalhador recebesse 1000 euros. Aquilo que nós estamos a dizer é que, estando as empresas descapitalizadas, estando as famílias descapitalizadas, o único que está capitalizado neste momento é o Estado, que deve participar neste esforço de solidariedade", defende.
Para a CIP, "o Estado não tem que estar também a aumentar o custo desse salário". "Por isso, este 15.º mês que nós estamos a propor é um 15.º mês que permita que aquilo que a empresa paga ao trabalhador efetivamente seja recebido 100% por ele, que não tenha nem IRS, nem Segurança Social", refere.
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Armindo Monteiro esclarece que este 15.º mês devia ser pago no regresso às aulas ou de forma faseada. A CIP também propõe para 2024 e 2025 um aumento salarial de 14,75%, com a redução temporária da taxa social única. O presidente da CIP considera que esta seria uma ajuda para a sustentabilidade da segurança social.
"Esta proposta diz que vamos pegar nestes 14,75 que deixamos de entregar à Segurança Social e vamos entregá-lo totalmente ao trabalhador, portanto, passa para a esfera patrimonial do trabalhador", diz, explicando: "Os 4,75 acrescem ao salário do mês e os outros 10 acrescem à sua conta individual de reforma de futuro, ou seja, o trabalhador no futuro, além de ter a reforma que é dada por este desconto dos tais 20% ainda acresce mais um valor individual para complemento da reforma. Isto é algo que já existe em Portugal, o que tem acontecido é que não tem havido contribuições para esse regime complementar."
Sérgio Monte, secretário-geral adjunto da UGT, também ouvido no Fórum TSF, destaca a necessidade das empresas abandonarem os baixos salários, mas manifesta receios em relação ao 15.º mês de salário.
"O 15.º mês é bem-vindo, qualquer trabalhador de salário médio não rejeitará um 15º mês, mas temos que ver como é que este 15.º mês é pago, em condições e como é que se processa, porque ficar num regime voluntário parece-me que é inconcebível uma vez que o trabalhador nunca saberia ao certo o rendimento que teria. Segundo, temos algum receio que este 15º mês, isento de tributação, possa ser utilizado no futuro como "um cavalo de Tróia", onde as empresas depois canalizam os aumentos salariais, ou seja, o salário base passaria a ficar congelado e os aumentos salariais anuais que são devidos aos trabalhadores, seriam canalizados para este 15.º mês", defende.
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O secretário-geral adjunto da UGT faz questão de sublinhar que qualquer negociação ou acordo tem de ser feito na concertação social.
"A falência do sistema previdencial, ou seja, do sistema de pensões, já está anunciada há mais de 40 anos. A questão aqui é que a proposta de uma redução de 14,75 da receita da segurança social, o doutor Armindo Monteiro diz que não se toca no sistema de pensões, mas o regime previdencial assegura outras prestações sociais que não são menos importantes, como a parentalidade, o desemprego, ou a doença. Na UGT temos muitas dúvidas que este sistema de proteção social que assegura estas prestações possa ficar dependente de transferências do Orçamento do Estado", nota.
À semelhança da UGT, também a CGTP não fica seduzida com as propostas da CIP. No Fórum TSF, Ana Pires, da comissão executiva da intersindical, considera que a aposta tem de passar pela redistribuição da riqueza.
"Vinte grandes grupos económicos e financeiros a terem lucros diários superiores a 25 milhões de euros, quando temos grande parte da nossa população a viver com dificuldades. É possível responder de outra forma aos problemas das pessoas aos problemas das famílias e isto faz-se e far-se-á pelo aumento dos salários. Já agora, pelo aumento dos salários todos os meses, porque nós não vivemos só num dos meses ou num hipotético 15.º mês no ano", atira.
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Ana Pires diz que a proposta da CIP fragiliza a Segurança Social e os serviços públicos. O pacto proposto pelos patrões não tem nada social e ninguém vive de um 15.º mês de salário, defende a CGTP. "Deve ser um alívio pontual. Com os baixos salários que se praticam e com o nível de vida que a esmagadora maioria da população tem, um 15º mês ou qualquer apoio é sempre um alívio. O facto é que logo no mês seguinte, as dificuldades voltariam a ser colocadas. O que nós exigimos é 15% de aumento dos salários para todos os trabalhadores, não inferior a 150 euros. E é possível, as empresas têm condição de o fazer", assegura.
Manuel Carvalho da Silva, que coordena o laboratório colaborativo para o trabalho, emprego e proteção social, defende que as propostas da CIP não passam de "um novo embrulho" de "velhas posições" que os "setores mais conservadores do patronato português repetiram ao longo das décadas".
"O chamado 15º mês não é um salário. Trata-se de uma proposta, ou seja, a CIP aconselha a que as empresas voluntariamente atribuam aos trabalhadores um prémio equivalente a um salário. Qualquer contabilista deste país sabe que um prémio não paga Segurança Social, nem paga os impostos que o salário tem que pagar", assinala.
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Depois das propostas apresentadas pela CIP ao Governo, Carvalho da Silva teme o que pode vir no próximo Orçamento do Estado, até porque os patrões conhecem a dimensão da quebra real dos salários.
"Está consciente de que era importante que a média salarial do país fosse, em valores reais, mais 20% do que é atualmente e, portanto, se isso é assim e se o que se está a oferecer é apenas 4,75 e um prémio ocasional que não é salário, nós não vamos deixar de ter jovens a emigrar. A outra questão é que o Governo, com silêncio e com ação, vem configurar passos para a apresentação de um Orçamento do Estado que corre o risco de ser um dos orçamentos de Estado mais neoliberais da história da democracia portuguesa, curiosamente para o ano da evocação dos 50 anos do 25 de Abril", acrescenta.
* Notícia atualizada às 12h09