A agenda da vida política tem estes momentos rituais que marcam a sessão legislativa. A proposta de Lei do Orçamento do Estado é entregue esta terça-feira ao presidente da Assembleia da República. A TSF ouviu a opinião dos economistas.
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Daquilo que já se conhece do texto do Governo, os dados macroeconómicos apontam para o crescimento, este ano, na casa dos 2,1% a 2,2%, já em 2024 poderá haver um crescimento de 1,5%.
Sobre a inflação, a taxa no final deste ano deve situar-se nos 4,6% (em comparação com os 5,1% previstos).
Por outro lado, o saldo orçamental terá um excedente este ano (2023), mesmo que seja inferior a 1%, e poderá ser neutro em 2024.
Entretanto, o discurso do Governo aposta na redução da dívida pública para níveis mais razoáveis. No Programa de Estabilidade, apresentado em setembro, a previsão é de que o rácio da dívida pública face ao Produto Interno Bruto caia de 112,4%, em 2022, para 106,1%, em 2023.
Foi também no Programa de Estabilidade, apresentado no final de setembro, que o Governo falou numa almofada de 400 milhões de euros para desagravar o IRS. Não se sabe ainda como estas contas vão ser feitas, mas o imposto das famílias vai ter até 2027 um valor de dois mil milhões de euros para uma redução da carga fiscal do IRS.
A opinião de Pedro Brinca: "Um Orçamento de paz social"
Para o investigador da Nova SBE, Pedro Brinca, "a primeira dificuldade que este orçamento terá será ter em linha de conta medidas, que consigam trazer alguma paz social para fazer face àquilo que tem sido a regra de 2023, que tem sido uma forte contestação social por vários grupos, sejam os médicos, sejam os professores".
Para a construção deste Orçamento há cenários que não podem ser subestimados. "Se a economia crescer muito abaixo do esperado, a receita também será muito abaixo do esperado, se a economia tiver que passar por uma recessão e disparar o desemprego são pessoas que não vão estar a criar receita fiscal e são pessoas que vão estar a receber apoios sociais e transferências. E a disciplina orçamental que 2023 proporcionou pode não ser alcançada em 2024, por isso, nesse sentido, eu creio que existe uma dificuldade inerente que tem a ver com os níveis de contestação social que ainda não ainda estão por resolver", argumenta.
"Portugal não está em crise. Portugal cresceu 2%, isto obviamente não quer dizer que não haja grupos identificados de pessoas que vão passar por muitas dificuldades e que estejam esses grupos em crise, mas é mais um problema de redistribuição do que propriamente um problema de de crescimento", defende Pedro Brinca.
A expectativa do investigador da Universidade Nova é que este "seja um orçamento equilibrado do ponto de vista das receitas das despesas, o que me parece prudente face à grande incerteza que 2024 encerra. É bom lembrar que nós tivemos nos últimos 12 meses uma subida muito acentuada das taxas de juro, o que aumenta de forma substancial os encargos com juros da dívida pública".
Pedro Brinca lembra que "Portugal tem uma das maiores dívidas da Europa e do mundo; mas é bom lembrar também que o impacto recessivo na economia, tipicamente sempre precisamente 12 a 18 meses após a subida das taxas de juro. Há 12 meses, as taxas de juros estavam cerca de 75 pontos base ou 100 pontos base, agora subiram mais de 4 vezes e teme-se que o grosso do impacto dessas subidas das taxas de juro na economia, se sintam durante 2024. E nesse sentido, é importante ter alguma margem orçamental para fazer face a problemas que podem surgir".
Por outro lado, "Medina não irá desperdiçar a oportunidade de ser o segundo ministro das Finanças em democracia a conseguir ter um superavit das contas, mas algumas medidas extraordinárias como as que já foram adotadas, irão fazer os 0,9% de superavit que o Conselho das Finanças Públicas previu em setembro, provavelmente é um valor que não será atingido. Será um valor marginalmente superior aos 0,2% de Centeno em 2019", conclui.
A opinião de Pedro Braz Teixeira: "Um Orçamento com margem"
O diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, Pedro Braz Teixeira, pensa que "a economia vai crescer muito menos no próximo ano. Vai haver menor crescimento económico, também vai haver um abrandamento da inflação, que é uma boa notícia", para retirar pressão ao Orçamento.
"A execução orçamental correu bastante melhor do do que se esperava. Para este ano, por exemplo, previa-se um défice de 0,4% e vai haver um superavit, não sabemos ainda de quanto, mas se calhar próximo de 1%. A diferença entre aquilo que se esperava e aquilo que vai acontecer vai ser pelo menos 2 mil milhões de euros a mais do que o Governo estava à espera, portanto, o Governo vai partir para construir este orçamento com algum conforto orçamental e isso torna as coisas relativamente menos difíceis", defende Pedro Braz Teixeira.
"Não é um orçamento especialmente difícil porque há, digamos, alguma margem orçamental e margem essa que é preciso sublinhar decorre ter havido receitas, no ano passado e este ano, receitas fiscais e contributivas muito acima do que do que era esperado. Só neste ano já vamos, só em IRS, com cerca de 800 milhões de euros acima do que estava orçamentado. Portanto, os contribuintes estão já a pagar mais do que o Governo previa, é natural que que não seja exigido tanto aos contribuintes", em 2024.
Mas, "não podemos olhar para este excedente como se não tivéssemos dívida nenhuma. Não devemos embandeirar em arco com um excedente que não vai ser muito grande, porque temos uma dívida muito significativa", conclui.