Peneda-Gerês enche "discursos políticos", mas para preservar "não há recursos": conservação é o "parente pobre"
"A Mata do Cabril é uma zona de reserva integral e, se o fogo lá entrar, não há nada a fazer, vai arder mais uma semana", assegura Miguel Dantas da Gama, em declarações à TSF
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Numa altura em que as chamas em Ponte da Barca têm ameaçado o Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), Miguel Dantas da Gama, elemento do Conselho Estratégico deste espaço (em representação de organizações não governamentais ambientais), lamenta que esta seja uma zona utilizada para "encher discursos políticos", que não acompanham o investimento nos "recursos" necessários para preservar o parque.
Questionado pela TSF sobre as implicações do fogo nesta área, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) assume que está "preocupado com a perda de património e valores naturais", estando por isso a "acompanhar de perto" a situação. Destaca, contudo, que apesar de ter disponibilizado à Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil "todos os seus meios para a proteção desta área", é a esta entidade a quem compete "coordenar as operações de combate a incêndios".
Já Miguel Dantas da Gama vai mais longe. Em declarações à TSF, lamenta que o PNPG sirva para encher os discursos políticos enquanto pouco se faz para "investir naquilo que é necessário para preservar" e confessa "não entender" as poucas palavras do ICNF.
A conservação da natureza é o parente pobre do património natural. Apregoa-se que o parque nacional é a joia da coroa quanto interessa.
Miguel Dantas da Gama aponta a importância de passarem a existir "postos de vigia para detetar incêndios a qualquer hora do dia e da noite", uma condição essencial para evitar que as pessoas se vejam "aflitas com as casas" e empurrar os bombeiros para uma situação quase irremediável.
"Em alguns concelhos da zona veem-se cartazes a falar da reserva da biosfera, do parque transfronteiriço, disto e daquilo. Mas, depois, no terreno acautelar e investir tempo naquilo que é necessário, para preservar o parque e as espécies emblemáticas que enchem os discursos dos políticos, para isso, não há recursos", critica.
O conservacionista dá como exemplo o discurso do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que na terça-feira considerou que a estratégia de combate aos incêndios, perante as dificuldades no terreno, “tem seguido aquilo que é correto” e que passa por proteger as povoações. Embora fique igualmente "satisfeito" com a "prioridade" dada ao combate das chamas em "zonas circundantes de núcleos populacionais", vinca que o que está a acontecer é um "desastre ambiental" e, por isso, é impossível afirmar que "o trabalho não ficou bem-feito".
"A Mata do Cabril é uma zona de reserva integral e, se o fogo lá entrar, não há nada a fazer, vai arder mais uma semana", garante o antigo engenheiro eletrotécnico.
Na Mata do Cabril (uma das áreas de reserva integral do PNPG, também ameaçada pelo fogo), lembra, a árvore "principal" é o carvalho-alvarinho, que é depois acompanhada por "um conjunto de espécies arbóreas importantes como o azevinho e o padreiro", que em Portugal "são raras". Mas esta zona é também "um dos principais refúgios da regressada cabra-montez ou da águia-real, que a custo tenta reocupar a zona onde nidifica". "Com a degradação dos ecossistemas, essas espécies tendem a desaparecer", sublinha.