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Longe vai o tempo em que a pesca do bacalhau dava de comer a famílias de pescadores de toda a costa portuguesa. De Viana do Castelo, partiram muitos homens para a longínqua faina, que se arrastava durante meses. Atualmente, é nesta cidade do Norte do país que está atracado e transformado em museu, o Gil Eannes, antigo navio hospital da frota bacalhoeira, que os pescadores batizaram de ‘Anjo branco’, pela sua cor e principalmente porque, na altura, era portador do correio, que lhe levava notícias das famílias distantes, e também transportada as equipas médicas e de enfermagem que cuidavam da saúde das tripulações.
Responsável por aquela embarcação, o Comandante João Lomba da Costa, que há cerca de 40 anos comandou mais de 60 homens na pesca do bacalhau, conta agora que o regresso da faina no Canadá em 2025, trouxe à tona velhas memórias.
“Faz-nos lembrar quando a gente andava lá a pescar e vinham as redes cheias de peixe. Nós chamávamos-lhe as sacadas. Não há dúvida que nos traz à memória aqueles tempos, embora duros. Muito duros mesmo”, contou à TSF Lomba da Costa, membro do Conselho Diretivo da Fundação Gil Eannes, recordando que, apesar das “más condições” dos navios e das fainas de então, “uma das coisas boas” da dura e prolongada [as campanhas por vezes duravam meio ano] pesca do bacalhau em águas gélidas, era “o comer bem”.
“Sempre se comeu bem a bordo dos navios. Estou a falar dos navios do arrasto, porque nos navios da pesca à linha eram extremamente duras as condições. Não havia frigoríficos. A alimentação era à base de leguminosas, feijão, batata, arroz e carne não havia. A carne que ia a bordo, era salgada em barricas. O que se comia bem e com fartura era o peixe fresco. Daí vem a famosa sopa de bacalhau, a chora, as caras de bacalhau, as línguas e as caldeiradas”, recorda.
Viana do Castelo é uma das zonas do país que têm ligação profunda à pesca do bacalhau, mas segundo o antigo comandante da frota bacalhoeira, a sua História está espalhada um pouco por todo o país.
“A Empresa de Pesca de Viana era das mais conceituadas e mais procuradas, porque tinha os navios mais modernos naquela altura. [mas também fazem parte da História] Aveiro, a zona de Ílhavo, a Figueira da Foz, Vila do Conde, e não com navios, mas com origem de pescadores, também a Fuzeta, no Algarve. Aliás, os pescadores vinham de toda a costa”, lembra, aplaudindo o regresso, 32 anos depois, dos pescadores portugueses à pesca do bacalhau no Canadá. Mas considerando que “não será a mesma coisa”, até porque noutro tempo havia “sobrepesca”. “A faina vai voltar. Os stocks estão refeitos, com as regras que foram impostas pelo Canadá. Neste momento há bacalhau em quantidade, simplesmente não vai ser como era, quando nós andávamos lá no princípio do século XX”, concluiu.
O Navio Hospital Gil Eannes, construído em Viana do Castelo nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, iniciou a sua atividade como hospital em 1955, apoiando durante décadas, a frota bacalhoeira portuguesa que atuava nos bancos da Terra Nova e Gronelândia.
