Petição que quer criminalizar 'stealthing' em Portugal já chegou às 3500 assinaturas
A prática, que consiste em retirar o preservativo durante uma relação sexual sem consentimento do parceiro, é crime em vários países europeus e em alguns estados dos EUA. Portugal está de fora da lista e, para ser incluído, foi criada uma petição na sequência de várias denúncias de violação no meio artístico
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A petição online, que defende a criminalização do stealthing em Portugal, foi criada no sábado e, desde então, mais de 3500 pessoas já a assinaram. O primeiro objetivo é que o tema seja debatido na Assembleia da República, mas para isso são precisas pelo menos dez mil assinaturas.
A iniciativa partiu da DJ Liliana Cunha, que denunciou ter sido violada por João Pedro Coelho em maio de 2023. O pianista de jazz rejeitou as acusações, num caso que veio a público no início do mês.
"[A denúncia] teve como objetivo abrir o debate sobre o que o stealthing quer dizer. Como vivi no Reino Unido durante sete anos, isso, para mim, é uma questão de agressão sexual muito óbvia. Não o sendo em Portugal, senti que tinha o dever de trabalhar nisso e de começar uma campanha pública sobre o assunto", refere Liliana Cunha, em declarações à TSF.
O passo dado foi criar uma petição online para que o tema seja discutido no Parlamento. Entre as exigências está a mudança do código penal português: "O stealthing envolve passar do consentimento para o não consentimento dentro da relação sexual e isso não existe no enquadramento legal português e já existe em Espanha, Alemanha, Reino Unido, Suíça e alguns estados dos Estados Unidos."
Liliana Cunha alerta para a urgência de proteger na lei o direito ao consentimento sexual e ajudar as vítimas que queiram recorrer à Justiça: "Sei que existem muito mais mulheres que podem não estar cientes do que este conceito [do consentimento sexual] quer dizer e elas próprias ainda estão a lidar com o facto de rotular isso de tabus. São palavras muito fortes no léxico português e as pessoas têm medo de as clarificar e de verbalizar o que elas querem dizer no ato."
E, para evitar futuros casos, Liliana Cunha defende a prevenção, com uma aposta na "consciencialização" e na educação sexual que considera estar a falhar no sistema português. Acrescenta que é preciso "uma abertura para um espaço público que ainda não é ocupado por vítimas deste ato evasivo e da devassa do corpo e da moralidade de cada ser humano".
Liliana Cunha lembra que o impacto vai além do moral: "A mulher arriscará não só de obter uma doença sexualmente transmissível ou transmiti-la ao parceiro, ou parceira, mas também de incorrer uma gravidez indesejada."
A prática, que consiste em retirar o preservativo durante uma relação sexual sem consentimento do parceiro, não é punida na lei portuguesa, mas Liliana Cunha considera que estamos perante um "ato de agressão sexual", independentemente do modo.
A petição foi criada com base num baixo-assinado, que juntou músicos como Ana Bacalhau, Salvador Sobral ou a atriz Sara Barros Leitão. Mobilizaram-se após denúncias de casos de violação, abuso sexual e assédio no meio artístico
Tudo começou com uma denúncia de violação e stealthing de Liliana Cunha contra João Pedro Coelho, músico e antigo professor da escola do Hot Clube Portugal, que rejeitou as acusações.
A instituição anunciou, entretanto, que criou uma comissão de inquérito para apurar situações que possam ter ocorrido.