Poder "será perigoso e fatal se o Chega não estiver à altura dessa responsabilidade"
Corpo do artigo
André Ventura é taxativo: Se o Chega não fizer "parte da solução" então não haverá "nenhum governo à direita". Afirmando que as próximas legislativas serão o momento "mais desafiante" da vida do seu partido, reconhece os perigos que enfrenta. Quanto à imigração, reconhece que sem ela, "em alguns setores" o país não consegue "sobreviver": "Temos de aceitar isso."
A geringonça de direita nos Açores caiu e caiu por dentro: implodiu. O Chega rompeu e dividiu-se. A IL também rompeu e isso foi decisivo. Sente que tem ou não tem explicações a dar aos portugueses sobre este fracasso?
Creio que há explicações a serem dadas mas devem ser dadas de forma completa. Ou seja, o Chega fez um acordo no Governo dos Açores porque era a única hipótese de retirarmos os socialistas do arco de governação de 25 anos, de um processo que já tinha 25 anos. Esse acordo foi sistematicamente incumprido pelo PSD e tínhamos um caderno de encargos com poucas exigências. E mesmo essas não foram cumpridas. Dentro da autonomia, que como é sabido os partidos têm nas regiões autónomas, o Chega Açores foi chamando a atenção para o incumprimento no âmbito do combate à corrupção. Foi criado um centro sem funções nenhumas, o Gabinete de Prevenção da Corrupção. No âmbito da subsidiodependência, onde no início se começou a fazer um esforço para reduzir [mas] depois parou-se. Um problema a que todos assistimos e que o país assistiu, a questão dos familiares, foi um pedido, uma exigência que fizemos, porque sabíamos que nos Açores era um problema premente. Não haver familiares no governo. Não sei se foi seis meses ou sete meses depois, um meio de comunicação social noticiava mais uma rede de familiares no Governo, nunca se voltou atrás, foram dados sistemáticos avisos. Mas mesmo assim, queria deixar isto claro: apesar de todos estes avisos, não foi o Chega que mandou abaixo o governo dos Açores. O Chega absteve-se, não votou contra o orçamento, absteve-se. E mais, o deputado José Pacheco, que é o líder do Chega nos Açores, depois de se encontrar com o Presidente da República, deixou claro que o Chega não gostava deste Orçamento, mas que entendia que os açorianos precisavam de estabilidade e disponibilizou-se para negociar um segundo documento orçamental caso se entendesse que houvesse condições. E, portanto, foi o Governo Regional dos Açores que entendeu que já não havia nada mais a negociar e vai tentar o exercício de vitimização, que já vimos em António Costa em 2022 e por aí fora. Vamos ver o que é que os eleitores decidem. Mas estou honestamente de consciência tranquila e o Chega Açores também. Fizemos tudo e isto pode ser confirmado. E dissemos que ainda estávamos disponíveis para negociar um segundo orçamento caso o presidente do Governo Regional assim avançasse. Decidiu não o fazer. Não sei o que é que o Presidente da República vai decidir, mas para ter convocado o Conselho de Estado, com toda a probabilidade, vai marcar eleições para o dia 4.
Um eventual acordo em que o Chega alinhe nos Açores terá de ter uma natureza diferente?
Terá de ter uma natureza diferente. Se voltar a existir um entendimento de governação, tem de ser mesmo de governação. Ou seja, não é apenas um caderno de encargos a dizer que devemos caminhar para aqui. É dizer que na secretaria regional tal têm de se cumprir estes objetivos e na secretaria regional tal têm de se cumprir estes. Tem de se garantir que não há familiares no Governo, tem de se garantir que se anda com o Gabinete de Prevenção da Corrupção e tem de se garantir que o Governo é também ele pluripartidário. Ou seja, que o Governo tem uma natureza dos partidos que compõem a coligação. Acho que era o professor Cavaco Silva que dizia, embora não esteja completamente seguro, mas penso que foi até durante o momento da crise com Paulo Portas, que não faz sentido haver acordos de Governo em que os partidos não assumem também a sua parte das responsabilidades com esse Governo. E os Açores, como costumo dizer, foi uma lição que aprendi. Obviamente não foi diretamente comigo, não sou deputado açoriano nem sou membro dirigente do partido nos Açores, mas o Chega aprendeu que o não estar no Governo e não assumir essa quota de responsabilidades traz consequências muito negativas. E o PSD entendeu que podia fazer o que queria. Isso não vai voltar a acontecer.
E não será em absoluto por ação ou por omissão que o Chega não terá qualquer responsabilidade no regresso do PS ao poder nos Açores?
Acho que, depois do que o Chega fez, a permitir que o PSD, mesmo tendo perdido as eleições, assumisse a liderança do Governo, porque era o partido à direita que tinha mais votos. Depois de termos tido infinitas reuniões com o presidente do Governo, de termos chamado à atenção, eu e o Chega Açores, de que as coisas não estavam a ir bem, chega-se a um momento destes. A IL vota contra o orçamento, o PAN muda também o sentido de voto e mesmo assim o Chega diz que está disposto a negociar um segundo orçamento, acho que não podemos em caso algum estar de má consciência com isto. Se o PS vencer as eleições dos Açores, o que espero que não aconteça, é mau em primeira linha para os Açores e é um mau sinal para o país também, e deve-se dizer isso, porque as eleições dos Açores, pelo quadro temporal onde vão estar, vão ter uma leitura política. Por isso é que tinha sugerido a Marcelo Rebelo de Sousa, até por questões de custos, que fossem no mesmo dia das legislativas. E evitava-se que as eleições dos Açores tomem essa proporção, que acho que até tira dignidade à região. Vão ser umas primárias das legislativas nacionais. Acho que isso é mau para os Açores também.
Se as eleições correrem mal ao Chega nos Açores, essa interpretação de que foram umas primárias deixará de existir?
Não, farei sempre a leitura política, mesmo que corra mal. Quer corra bem, quer corra mal. O Chega elegeu dois deputados, passou para um, mas queremos subir. Todas as sondagens indicam, e tivemos agora, embora obviamente a Madeira não se possa comparar com os Açores, mas tivemos agora o barómetro da Madeira em que o Chega consegue um resultado incrível. Praticamente cinco deputados - foram quatro mas estava praticamente no quinto. E, portanto, tudo indica que nos Açores vai haver uma subida consistente também. Evidentemente que se houver uma descida, ou se não houver um resultado próximo do crescimento que o Chega tem tido, é uma derrota e também a saberemos ler. É sinal de que os eleitores nos vão dizer arrepiem caminho, estão no caminho errado.
Vários dos autarcas eleitos do Chega deixaram o partido desde as últimas autárquicas ou perderam a confiança do partido. Uma notícia do final de 2022 dizia que o Chega tinha perdido seis dos 19 vereadores eleitos. O que é que isto diz sobre a utilização do partido por oportunistas? Como é que se pode confiar num partido assim?
Compreendo a pergunta. As pessoas têm de ter noção do seguinte: o Chega, provavelmente na história da democracia portuguesa, cresceu mais rápido que qualquer outro partido. Estou a excluir aqui o PRD, foi um contexto diferente e também com o apadrinhamento do Presidente da República. Nenhum partido cresceu tão rápido. E era importante que os portugueses soubessem disso. Estou a dizer isto genuinamente porque sentimos isto na pele. De repente, um partido que tinha quase inexistência de quadros e tinha cerca de 200 militantes ou 300, consegue uma presença na Assembleia da República. E isso, obviamente, gerou um crescimento muito grande de visibilidade, de trabalho político, etc. Mas por força do calendário político, de repente, tínhamos umas eleições autárquicas e não quisemos fugir à chamada. Então fizemos o que qualquer partido pode fazer nestas circunstâncias, que é recorrer aos seus militantes, aos seus apoiantes, desafiá-los a assumirem um papel político. Muitas destas pessoas nunca tinham tido nenhum papel político.
Mas o Chega foi ou não a barriga de aluguer para muitos oportunistas?
Não. Acho que fomos, não diria precipitados, porque foi um desafio que assumi. Enquanto outros partidos da dimensão do Chega na altura optaram por resguardar-se e não ir a muitos concelhos, portanto, salvaguardando alguns erros de casting, o Chega foi ambicioso e quis ir a todos. Não fomos a todos, mas para a nossa dimensão fomos a centenas de concelhos. Isto teve um elemento bom, elegemos muitos vereadores em todo o lado. Atualmente, o Chega tem uma presença, é o terceiro maior partido autárquico do país, não obstante não ter presidências de Câmara, tem autarquias em todo o lado, juntas de freguesia, assembleias municipais, câmaras municipais. Isso que referiu, diria que são as dores de crescimento, mas más, assumo-as como más, não faço das derrotas uma vitória, é uma dor de crescimento má que aprendemos e quero dar disso a garantia. Por isso é que acho a sua pergunta importante, porque que quem vai votar no Chega nas próximas autárquicas tem de saber que se eu, como presidente do partido, pus muito esforço na seleção nas últimas autárquicas, aqui vou redobrar esse esforço para dar essa garantia, porque vamos eleger muitos autarcas pelo país todo e a responsabilidade em primeira linha é minha, isto é, de dizer às pessoas que esses autarcas vão prestar um bom trabalho ao país.
No princípio, em 2019, que foi o ano em que foi pela primeira vez eleito deputado, o Chega defendia a privatização do Serviço Nacional de Saúde. Estava lá escrito no programa: "Promover a gestão privada dos hospitais públicos". Entretanto, o partido tornou-se um grande defensor do SNS, sobretudo com a pandemia. Pode-se criar uma situação em que não sabemos em que Chega acreditar?
Acho que é preciso compreender um bocadinho que o partido tinha como grande missão no início a redução do tamanho do Estado e das gorduras do Estado. E uma lógica que era a nossa, e por isso talvez não tenha sido tão bem expressa, de ter na saúde, como na educação, como noutras áreas, em vez de um modelo ideológico estritamente público, um modelo que combinasse o público e o privado e em que o público pudesse reduzir custos aos contribuintes e o privado assumisse gestão, ou seja, uma espécie de parcerias público-privadas como tivemos na saúde.
Num esquema generalizado, não é?
Num esquema abrangente, sim. Porquê? Porque os casos que temos de PPPs na saúde funcionaram bem. Funcionaram quase todos bem. Tirando um caso, quase todos os outros reduziram muito os custos para os contribuintes, aumentaram a eficácia e a eficiência. O que queríamos dizer é que não podemos continuar a ter um Estado altamente gorduroso na saúde, na educação, sem que os portugueses sintam que isso traz alguma vantagem. Eu, aliás, até tenho aprendido muito nestes quatro anos.
Não admite que nesse campo da saúde, por exemplo, evoluíram quase para a posição inversa?
Não por isto que lhe vou dizer: as pessoas geralmente pensam em saúde pública ou privada. Atualmente, o que defendemos é uma saúde pública que funcione, mas uma saúde privada, como nos países anglo-saxónicos, que funcione bem também e que consiga até corrigir as falhas dessa saúde pública. Mas só para terminar este exemplo, tenho aprendido muito nesta área da saúde, porque também tenho estudado muito sobre isto. Quando falamos em privado-público isso já nem faz muito sentido no sistema português atualmente. E apercebi-me de que hoje já uma grande parte das instituições públicas de saúde, dos hospitais, uma grande parte dessa gestão em matéria de exames, de consultas, de compensação, etc., que é feita por entidades privadas. E não sabia disso, mas sei agora. E, portanto, isto quer dizer que cada vez mais faz sentido termos um modelo complementar e não este modelo demasiado público, exclusivamente público, que os socialistas nos trouxeram. Aliás, acho que a maior prova de falha é esta, é que não temos pouco dinheiro para o SNS. Quando o Governo diz que este ano vai haver mais dinheiro do que nunca para o SNS, não está a mentir. Ele vai pôr mais dinheiro no SNS, mas, curiosamente, também é dos anos em que vemos que esses serviços funcionam pior. Portanto, acho que podemos chegar à conclusão de que o modelo não está a funcionar e temos de arriscar outro. E acho que temos aqui a sorte de a direita em geral, agora estou a referir-me até à Iniciativa Liberal, que diz que não é direita, mas estes três partidos, que são os partidos atuais na direita, têm uma visão parecida da saúde. E acho que nisso pode haver um entendimento alargado que melhore a vida das pessoas nesta área.
O Chega tem uma contribuição extraordinária a cobrar à banca. Curiosamente, o PCP e o Bloco de Esquerda também. Afinal têm ideias semelhantes com a esquerda?
Acho que foi feito um estudo até sobre que partidos é que mais tinham votado ao nosso lado e nós ao lado deles. Acho que o PAN tinha votado muitas vezes também ao meu lado, quando era deputado único, e eu votei várias vezes propostas do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda. Quando atacamos aqueles que fizeram este SNS e dizemos assim, "o vosso problema é cegueira ideológica", tudo o que é público é bom, tudo o que é social é mau, tudo o que é privado é mau. Não estaríamos a fazer a mesma coisa se uma proposta, porque vem do PCP, deve ser reprovada à partida? Analiso as propostas, faço esse trabalho mesmo. Gostava de ter mais, mas quando recebo um projeto de lei, um projeto de resolução, vou lê-lo, vejo se ele é bom, não vejo se vem do Bloco de Esquerda ou do PCP, não é isso que interessa tanto. Isto vai funcionar ou não vai funcionar? Outra área de convergência é as polícias, tenho de reconhecer isto para ser honesto intelectualmente.
Mas no caso da banca os eleitores esperariam que viesse propor uma contribuição extraordinária, vindo da direita?
Não, não esperariam. Mas só para dar este exemplo: o Chega e o PCP, em muitos casos, convergiram na necessidade de aumentar salários e condições dos polícias. Foram os únicos até a convergir e isso não me envergonha. Ainda bem que há outros partidos que pensam assim, mesmo que não o tenham feito quando tiveram possibilidade de influenciar o Governo. A questão da contribuição extraordinária é mais uma medida que mostra como o Chega é um partido atípico no sistema partidário português. Porque, de facto, à direita, e aqui refiro-me até a alguns militantes do Chega e apoiantes do Chega, que ficaram bastante chocados com a nossa proposta de contribuição extraordinária. E talvez aí esteja a razão. Porque deixámos a esquerda apoderar-se de tudo o que é causas sociais, apoderar-se de tudo o que é contestação, mesmo quando essa contestação é evidentemente legítima. Qual é a diferença? É que a esquerda acha que deve taxar o lucro por taxar. Portanto, a esquerda, por ela, taxava todos os lucros e acha que todos os lucros são excessivos. Nós fizemos uma proposta equilibrada, inspirada, aliás, no modelo germânico, que era que houvesse uma contribuição temporária sobre lucros da banca. Há bancos a ter 11 milhões de euros de lucro por dia. E isto, a mim, que não tenho inveja, parece-me que esses lucros são bons se trabalharem para isso.
Mas essa pode ser uma medida temporária e depois, eventualmente, quando chegar ao poder ou noutro momento, mudar esse seu pensamento e voltar ao original?
Não. Acho que se for temporária é por aplicar-se temporariamente enquanto os níveis de inflação estiverem muito elevados. Qual é a nossa ideia? Que haja uma contribuição extraordinária porque é muito fácil dizer a toda a gente, e dizemos isso muitas vezes, que vamos subir pensões, que vamos ajudar as pessoas a pagar o crédito à habitação. É um dos nossos desafios. Mas, ao fim do dia, as pessoas perguntam onde é que vamos buscar o dinheiro? Vamos criá-lo? Portanto, a contribuição extraordinária sobre a banca, na nossa perspetiva, não é mais um imposto normal, é uma contribuição obrigatória em que uma parte daquela contribuição deve canalizar para baixar o crédito à habitação das pessoas, de forma temporária. Não sei se, isto é, de direita ou de esquerda, mas não vivo bem num país em que bancos estão a ter sem trabalhar para isso, porque isto é fruto da inflação e não do seu trabalho de investimento, 11 milhões de lucros por dia e há pessoas da classe média que já não conseguem pagar as suas casas. Isto é de direita ou de esquerda? Acho que é ter bom senso e por isso é que deixamos a esquerda ficar com as causas sociais todas.
Já que falou em pensões nessa sua resposta, ouvi-o há pouco dizer, ainda nos bastidores da entrevista, que as pensões deveriam ser um desígnio nacional. O que é que propõe fazer? Já ouvimos o PSD fazer uma promessa. O que é que o Chega promete aos eleitores pensionistas?
É a nossa proposta mais ambiciosa e também é a que vai gerar mais despesa fiscal, se podemos dizer assim. E é preciso assumir isto, que vai gerar despesa, não é só dizer o que vamos fazer. E por isso temos de fazer com cabeça, tronco e membros. E quem é que vai pagar? Porque é o Estado que vai ter de pagar, ou seja, os contribuintes. É importante saber isso. Mas também quero explicar porquê. Temos um desígnio que gostava de conseguir concretizar numa legislatura, embora reconheça a sua dificuldade, que é que não haja em Portugal pensões abaixo do salário mínimo. Mas este é um desígnio muito ambicioso. Temos muitas pensões, ainda dentro de sistemas anteriores, sistemas contributivos e não contributivos anteriores. Acho que tem de ser um desígnio nacional porque atualmente, onde temos maior dificuldade de acesso à saúde, grande dificuldade nas questões de habitação e de alimentação, é precisamente nos mais idosos.
E isto vai ter ao ponto que estas dificuldades também existem de forma acrescida porque há pensões muito baixas. Ora, estou convencido que é um grande esforço fazer um aumento de pensões em que todas garantam uma espécie de salário mínimo e, portanto, isto vai ter custos muito elevados, assumo isso, mas ao mesmo tempo estou convencido que a jusante este investimento social vai trazer uma descida do investimento na saúde por parte do Estado, uma vez que vai haver também mais condições por parte destas pessoas para prevenção, para medicação, para até recorrer a outros serviços de saúde privados, na alimentação e nos apoios e até nos subsídios sociais da segurança social. Portanto, é verdade que é um investimento que vai custar muito e esperamos no Congresso, em janeiro, apresentar ao país com contas certas estas medidas, mas ao mesmo tempo estou convencido de que também vamos conseguir arrecadar alguma vantagem, porque isto vai diminuir, por parte da segurança social, o investimento social, e vai reduzir também a despesa na saúde. Portanto, acho que tem de ser um desígnio. Para terminar, acho que nada nos deve chocar mais, a nós políticos, do que ver pobreza. E infelizmente em Portugal tem aumentado muito, mas mais me custa ainda quando vejo pobreza nos mais velhos, acho que todos temos pais e avós, e ver pessoas que lutaram a vida toda, trabalharam a vida toda e não conseguem ter o mínimo que temos para poder fazer as escolhas da sua vida, a mim irrita-me. Irrita-me ainda mais quando vou à Alemanha a um encontro do ID, ou a França ou à Itália e vejo os pensionistas de outros países a terem condições para viajar, para terem a sua vida, o que merecem depois de uma vida de trabalho, e os nossos não. A mim causa-me mesmo perturbação.
Pode ser grave para a consolidação eleitoral do Chega, após as legislativas, que o partido não consiga aceder ao poder ou então integrando um governo, ou num acordo parlamentar? O partido vive atualmente numa espécie de tudo ou nada?
Não, não vivemos numa espécie de tudo ou nada. Estamos tranquilos. Mentir-lhe-ia se dissesse que não é o momento mais desafiante da vida do Chega, até em termos de responsabilidade. É onde a pressão é maior porque sinto a responsabilidade, até como presidente do partido de se, como as sondagens indicam, o Chega for uma parte fundamental de uma maioria ou de um governo, sinto pessoalmente a responsabilidade de apresentar ao país e aos eleitores soluções de credibilidade. E soluções que vão efetivamente resolver problemas que as pessoas estão à espera que o Chega resolva. é importante também para olharmos para outros casos europeus e americanos de partidos próximos do nosso que foram rápidos a alcançar o poder, mas também rapidamente desiludiram as pessoas.
Por exemplo, prometer pensões como prometeu sem ter o ónus que isso trará para o Estado e para os contribuintes, pode-se criar precisamente esse risco?
Exato, por isso é que isso nunca vai acontecer. Todas as propostas que levarmos à Assembleia da República para serem aprovadas vão ser garantia de que temos as contas e a base para isto. Já falei em valores na ordem dos sete mil milhões de euros, é um valor muito elevado para os cofres do Estado, mas queremos mesmo fazer um esforço orçamental nisso, talvez o maior da história. Também queremos envolver a Europa nisso.
Mas sente que o exercício do poder governativo pode ser fatal para o Chega ou pode ser perigoso para o Chega, dado que o partido ainda só tem quatro anos?
Será perigoso e fatal, sim, se o Chega não estiver à altura dessa responsabilidade. Será o momento mais benéfico da vida do Chega se estivermos à altura dessa responsabilidade. E, portanto, não sei ainda o quadro o que vai acontecer, nem sabemos se vamos ter essa responsabilidade, se os portugueses nos vão dar essa responsabilidade ou não. Mas há uma coisa que sei: estou já a escolher pessoas boas, credíveis para, caso o Chega tenha de assumir essa responsabilidade, as poder ter em várias áreas. E acho que esse é o dever de qualquer líder de partido cujas sondagens indicam ter 15%, 16%, 17% ou 18%. E, portanto, este momento pode ser duro para o Chega se não estivermos à altura e se falharmos às pessoas. E é preciso não esquecer que o Chega disse que ia ser disruptivo. Se depois não for, isso pode trazer muitas consequências para o partido, nomeadamente a nível do seu eleitorado descontente. Se conseguirmos mudar o país em alguma coisa disruptivamente, então também pode ser o nosso momento mais importante e mais benéfico. E até podemos estar perante uma mudança geral do panorama político português, como acho que pode acontecer a breve trecho.
Se as sondagens dizem que é o líder da oposição mais popular, será muito estranho para si que a relação de forças que vier a ser ditada pelos eleitores para o Parlamento determine que, então, o melhor é ficar na oposição, já que é o melhor líder da oposição?
Ficarei onde os portugueses entenderem que devo ficar e saberemos ler os resultados eleitorais.
Mas neste momento, a verdade é que o PSD disse categoricamente que Chega nem pensar e a Iniciativa Liberal também tem dito a mesma coisa. Não vemos, para já, nenhuma perspetiva de o Chega ir para o poder.
Repare, o PSD e a Iniciativa Liberal podem dizer o que entenderem, mas se não houver maioria para governar à direita, é uma conversa vazia de conteúdo, não é?
E aí põe o PS no poder?
Não, quem põe o PS no poder é o PSD, eu não porei de certeza. Repare, é importante que isto fique esclarecido e até temos uma sondagem de hoje, é a última que temos, por isso é bom falarmos dela, do jornal Sol e da Euronews, que dá ao Chega 17,2%. E ao PSD, 30% ou 29%. Só o PSD e o Chega juntos formam a maioria absoluta. O PSD com todos os outros, e mesmo que vá buscar partidos não parlamentares, nem sequer se aproxima da maioria absoluta. Portanto, uns com os outros podemos dizer o que quisermos, podia ser assim, podia ser assado, gostava que o céu fosse negro em vez de ser azul, mas a verdade da política é isto. E, portanto, vai haver um dia, após as eleições, em que os portugueses votaram. E deram, imagine, uma maioria ao Chega e ao PSD. O que é que acontece com esta maioria? Da nossa parte é claro: a construção de uma alternativa. É preciso ir perguntar ao PSD o que é que o PSD acha.
O PSD já tem dito que não quer nada com o Chega.
Mas tem de lhe perguntar depois das eleições, porque depois das eleições é quando há votos.
Portanto, acredita que o PSD vai mudar de ideias depois das eleições, se ganhar as eleições?
Não é questão de acreditar. É que a irresponsabilidade de não fazer uma alternativa, quando ela nos é disponível, é colocar o PS no poder. Portanto, não sou eu que coloco o PS no poder. Há uma maioria, o PSD diz que não quer governar com esta maioria, então não sou eu que não quero, é o PSD que não quer e tem de assumir perante os eleitores que não quer. E então o que é que acontece ao país? Temos de nos perguntar isso também.
Mas tem para si como muito natural que a próxima legislatura vai ser uma legislatura instável e novamente não vai acabar? Ou seja, dado que não se perspetiva nenhuma maioria absoluta monopartidária.
Isso não vai acontecer de certeza, por isso é que lhe estava a dizer que é para mim impensável que os partidos, os quatro maiores pelo menos, não estejam à altura das responsabilidades no dia a seguir às eleições. Acho que seria um sinal mau que dávamos aos eleitores. Os eleitores votam e nós vamos dizer que o voto não contou para nada? Agora andamos aqui a brincar se fazemos alianças ou não, coisas de bastidores? Não, não há outra hipótese. Se os eleitores votarem que Chega e PSD, ou Chega em primeiro ou PSD em primeiro, porque ainda não desisti de ultrapassar o PSD e de ficar o Chega em primeiro lugar. Porque também essa é outra questão: será que o PSD também viabilizava o governo do Chega? Era outra questão. Agora, se dissermos assim, o PSD tem um governo minoritário e diz que não quer os votos do Chega, porque o que ouvimos dizer foi que não quer os votos do Chega nem o apoio do Chega, então, se não quer, está resolvida a questão. Vá buscar os votos ao PS ou vá buscar os votos ao Bloco de Esquerda.
Porque o Chega vota contra o programa de governo do PSD?
Mas se é o PSD que não quer...
Mas pode abster-se e viabilizar na mesma.
Mas isso é querer os votos do Chega. Mas algum partido se abstém se não entrar num diálogo com o partido que propõe?
Ou seja, um acordo qualquer de incidência parlamentar ou governamental poderá incluir não o voto do Chega, mas a abstenção do Chega e consequente viabilização?
Penso que ainda não fui suficientemente claro, por isso vou ser. Pode ler os meus lábios: se o Chega não fizer parte da solução, não há nenhum governo à direita, a não ser que o PS viabilize.
Mas quer definir o que é fazer parte da solução? É integrar o Governo, ter o ministro A, B, C?
É assumir a responsabilidade de funções governativas. Caso isso não aconteça, não vai haver.
Portanto, ter pastas no Chega?
E é por isto, porque aprendemos nos Açores que o resto é uma má solução, que não vamos importá-la para o país todo. Temos de perceber o seguinte: os eleitores não querem governos de maioria absoluta, querem, como em toda a Europa está a acontecer, governos de entendimentos, de convergência. O Chega está disposto para essa convergência, mas se os outros não estão...
Alinharia numa coligação pré-eleitoral com o PSD, em tese?
Não, não, está fora de questão. Permita-me só referir o seguinte porque é importante: se por toda a Europa está a acontecer governos que têm de se entender, porque é que cá mantemos a velha lógica dos anos 80 de que só pode haver um governo de uma só cor, se está a acontecer a fragmentação por todo o panorama político europeu?
No caso de um acordo de governo com o PSD, o Chega vai impor, ou tentar impor, velhas bandeiras da fundação como, por exemplo, a revogação da lei do aborto, o fim do casamento gay, essa agenda dos costumes?
Depende da agenda de que estamos a falar. Se vamos revogar a descriminalização das drogas sintéticas, vamos.
Estou a falar da lei do aborto e do casamento gay especificamente.
Não são temas prioritários para o Chega nesta altura e isso já ficou claro nos últimos debates e programas que temos. Temos ideias sobre isso, mas também reconhecemos que há momentos e momentos para a discussão. Neste momento o país vive uma crise enorme relacionada com corrupção e com falta de crescimento económico. Essas são as preocupações dos portugueses e é a essas que queremos dar resposta. Agora, há bandeiras que são importantes para nós.
Pegando nessas bandeiras, no fundo, que cedências e exigências admite fazer em nome da chegada ao poder?
A reforma da justiça tem sido para nós decisiva. E é com pena que tenho visto que o PSD tem fugido desta questão, mesmo no quadro do que estamos a viver. Pode-se falar da reforma da justiça, sem necessariamente ter de falar de casos concretos, do A ou do B. Percebemos que há uma perceção em Portugal, generalizada, de más práticas na administração pública, nos negócios do Estado, etc. E agora aqui não me estou a referir à operação Influencer. O que tenho dito, e tenho dito no Parlamento, é que o que estas operações mostram muitas vezes, não é a questão de se vai ser acusado ou arguido, isso é uma questão para a justiça. Depois a justiça resolverá. O que mostram é a forma de fazer negócio público em Portugal: o negócio, a cunha, o favor. Há uma reforma que tem de ser feita. É a reforma da justiça e da administração pública. Portanto, esta, em algum sentido, é uma exigência. A justiça tem de ser menos politizada e temos de evitar que os políticos consigam interferir no Ministério Público, na Polícia Judiciária ou noutras entidades. E acho que esta é uma reforma que deve ser feita pelos políticos em funções, para mostrarem que são eles os primeiros a dar o exemplo, mesmo quando estão eles em funções. É fácil falar disso quando já se saiu da política há 10 anos ou há 15. Não, nós estamos em funções e queremos que as autoridades nos investiguem como qualquer cidadão. Tendo também a presunção de inocência, como qualquer cidadão. Temos de ter uma administração pública eficaz. É outra coisa que nos distingue um bocado dos nossos parceiros, entre aspas, da direita. Há no PSD e na IL quase um sentimento anti administração pública e esse não é o sentimento do Chega. O Chega não só tem votado favoravelmente à dignificação das várias carreiras da administração pública e na administração local, mas reconhece que há neste momento excesso de órgãos relacionados com a despesa do Estado e que há falta de eficiência. E, portanto, outra exigência nossa, se tivermos força eleitoral, a par das pensões, é esta. É que se o PSD pensa que vai para o Governo voltar a reestruturar ou a cortar na administração pública, está enganado. Temos é que melhorar a administração pública, não é cortar empregos nem afastar pessoas.
Num casamento há exigências e há cedências e do lado das cedências, o que é que admite ceder em nome da chegada ao poder?
O PSD tem de pôr em cima da mesa também o que acha que é muito grave no programa do Chega. Isso é do outro lado que tem de ser dito, não é? E certamente que o que não for prioritário para o país neste momento, também saberemos estar à altura das circunstâncias. Vou dar-lhe um exemplo, mesmo que o PSD nunca me tenha falado sobre isso: como sabe, sou um acérrimo defensor da prisão perpétua, apesar de isto não ser uma questão de Governo, é uma questão parlamentar de legislação. Sou um acérrimo defensor da prisão perpétua e, aliás, está a acontecer por toda a Europa nos países mais evoluídos. Acho que era fundamental. Se o PSD disser que está disponível a aumentar penas, mas não está disponível em caso algum para a questão da prisão perpétua, pergunto aos ouvintes: vale a pena criar um conflito político por causa disto?
E o que é que responde aos ouvintes?
Responderia que, se tivermos a tal cedência, que talvez não tenhamos prisão perpétua, mas temos um aumento, por exemplo, dos 25 para os 40 anos de prisão, como é em Espanha, já é um passo. Não demos o passo que queríamos, mas demos um passo. Em nome de estabilidade governativa, acho que será positivo. Em matéria económica e fiscal, temos uma agenda fiscal mais ambiciosa que o PSD. O PSD vai fazer certamente também exigências, pô-las em cima da mesa. Acho que é importante olharmos para os programas uns dos outros e ver o que é possível, sendo que todos queremos fazer o país crescer e pagar menos impostos.
E na fiscalidade tem alguma causa em particular?
Vou dar-lhe um exemplo, mas não vou falar destas pequenas coisas, entre aspas, do IUC e tal.
Mas no IRC e IRS do que é que estamos a falar?
Sobretudo o IRC e o IRS merecem um debate à parte, mas devemos pôr fim ao IMI. Acho que o IMI é atualmente um imposto absolutamente estúpido. O engenheiro António Guterres dizia que a sisa era o imposto mais estúpido do mundo, eu acho que o IMI é o imposto mais estúpido do mundo. E acho que temos condições, desde que compensemos as câmaras municipais, para acabar com ele. Repare, atualmente, quando compramos uma casa, e estou à vontade porque não tenho casa sequer, por isso é o que vejo das pessoas, mas quando compramos uma casa pagamos um imposto. Quando vendemos uma casa pagamos também um imposto e o ridículo é que por termos uma casa, também pagamos um imposto. Depois, se for ao pé da calçada do tal, paga-se mais, se tiver uma janela mais aberta paga-se mais. É absurdo. E, portanto, acho que, se queremos mesmo que o mercado de habitação até funcione e estimular o mercado de oferta e procura, uma medida simpática que podíamos ter, porque estes proprietários que pagam IMI, se calhar os senhores pagam também, não são ricos, não são as pessoas ricas que pagam IMI. Esses também pagam, mas a grande parte do país paga IMI dos proprietários. Não era um bom sinal de fiscalidade amiga que dávamos aos proprietários acabar-se com este imposto estúpido? Não sei o que é que o PSD pensa sobre isso, mas é um dos temas que vou pôr em cima da mesa.
Imigração tem sido um tema recorrente do Chega.
Vai ser um dossiê difícil também.
Sei que defende a regulação da imigração, acessos controlados, etc., mas reconhece ou não, para começar, que há setores inteiros da economia nacional, como a restauração ou a agricultura, que dependem de mão-de-obra imigrante?
Há uma carência de mão-de-obra e a imigração tem vindo a suprir essa carência.
Mas o que é que isso lhe diz sobre a indisponibilidade dos portugueses para certos trabalhos?
Pegando na última parte, talvez pudéssemos associar essa indisponibilidade de muitos em trabalhar à cultura de subsidio-dependência que criámos e aí pôr a mão na consciência do que andámos a dizer nas últimas décadas. Quando se alimenta as pessoas com subsídios permanentes, é evidente que depois há menos disponibilidade para trabalhar e menos disponibilidade para fazer parte de certos trabalhos, como a restauração, a construção civil, a hotelaria, o turismo, os tuk-tuks, etc. Acho que toda a gente que nos ouve percebe o que quero dizer. Mas foi a cultura que criámos desde os anos 2000, que é toma lá e fica por aí, sem fazer nada. Esse é um problema. Agora, se eu dissesse assim: quando começarmos a governar vamos fechar as portas a toda a gente e acabou a imigração. Isso é um disparate. E sei que até sou criticado por isso, há setores que gostariam de dizer para fecharmos as fronteiras.
Setores no seu partido?
Não, setores mais radicais da sociedade. Acho que isso era um erro e assumo esses riscos políticos também, mesmo estando no espectro político em que estou. O país não consegue atualmente em alguns setores sobreviver sem imigração e temos de aceitar isso. Agora, isso é uma coisa, outra coisa diferente é esta absoluta desregulação e descontrolo em que entrámos nos últimos anos. E é essa crítica que gostava de deixar. Acho que ninguém se sente capaz de explicar esta abertura dos vistos da CPLP, até a União Europeia nos abriu um processo por dizer a qualquer pessoa que chega aqui que antes era preciso um visto, mas depois passou a ser preciso um contrato de trabalho. Agora, você chega a Lisboa e diz assim, eu estou à procura de emprego, mas agora chega-se a Lisboa e diz-se que se está à procura de emprego e pode ficar-se um ano a residir aqui só porque disse que está à procura de emprego. É evidente que em países que ganham 100 dólares por ano que isto é um chamariz. Portanto, o que queremos é controlar a imigração, regulá-la e garantir que estamos em segurança. Não gosto nada quando vejo notícias que o tipo que matou dois suecos na Bélgica esteve a passear livremente na Guarda. Acho que isto não prestigia o país.
Um estudo recente da Faculdade de Direito sobre imigração diz que 80% dos inquiridos concordam com a regularização de imigrantes que trabalham e descontam para a Segurança Social. E 63,3%, dois terços mais ou menos, consideram que os imigrantes devem ter acesso total ao Serviço Nacional de Saúde. O Chega, quando tratou desta notícia no seu site e no seu jornal, sublinhou que boa parte dos portugueses, 55%, têm preocupações semelhantes às do Chega. Há aqui ou não uma política de medo e de exploração do medo? E quantos votos é que o medo lhe rende?
Não é de medo, de todo. Os portugueses são um povo que recebe bem, sempre fomos assim e queremos continuar a ser. Quem venha, que venha por bem, esteja integrado, trabalhe e pague impostos. O que não podemos continuar a ter é um descontrolo absoluto e por isso, talvez pela primeira vez, porque deixámos esse descontrolo acontecer - penso que isto são dados recentes -, pela primeira vez os portugueses colocam a imigração como um dos seus principais problemas. Isto era impensável há 20 anos. Impensável. Os portugueses dizerem que a imigração é um dos principais problemas. E, portanto, quando estes dados saem, porque é que acontece? Vou contar-lhe esta experiência: fui a pé a Fátima este ano, espero não repetir tão brevemente porque custou-me mesmo muito, mas fui e, portanto, fui pelo interior do país. Em muitas zonas do interior, olhava para dentro das casas e a única coisa que via era não-europeus.
E? Não mordem.
É uma realidade. Sim, não mordem e não fazem mal, mas estou a dizer que a realidade é assim. E, portanto, quando deixamos a imigração chegar, e também já fomos um país de imigração e temos de ter noção disso, muitos temos familiares que emigraram, mas estes países para onde os nossos familiares foram, para França, para Suíça, para os Estados Unidos, não recebem qualquer pessoa de qualquer maneira. Têm regras. O que queremos impor cá é regras e até adaptar isso à nossa estrutura produtiva. Como faz o Canadá, como faz a Suíça, como se faz em outros países. Muito bem, precisamos de imigrantes, mas então em que área? Que formação é que têm? Para a Austrália, se quiserem imigrar para lá, têm de dizer quais são as suas qualificações, o que é que estão dispostos a fazer, se têm família e apresentar o registo criminal. Qual é a ideia que dá Portugal? É que aqui entra qualquer pessoa, tenha registo criminal ou não tenha. Acho que se chegassem ao aeroporto e dissessem que vão cometer um atentado terrorista ainda lhes respondiam, muito bem, então tem um ano para tentar fazer. Pode tentar. Está a ver a ideia? E é com isso que queremos acabar. Pode ter a certeza disto: não vamos fechar a fronteira, queremos é regras.
No entanto, desde 2001 que não há um único morto por terrorismo em Portugal. Quer dizer, isso não conta para nada? Ao contrário do que acontece em Espanha, em França, em Inglaterra.
Sabe que isto é como o diabo, não se deve invocar muitas vezes para não aparecer.
Mas está a falar na hipótese de terrorismo quando durante mais de 20 anos não o tivemos.
Mas ainda o ano passado tivemos...
...Tivemos o caso do Centro Ismaili, mas que sabe que é um caso social, não é um caso de terrorismo.
Sem dúvida, mas tivemos, a par desse caso de ataque a duas vítimas mulheres, relatórios que estão ao dispor de todos, que dão conta de que Portugal está a servir como plataforma giratória para o terrorismo europeu e acho que isso não é positivo para Portugal. E a PJ, graças a Deus, tem grandes profissionais e está a fazer o possível, mas no tráfico de droga e no terrorismo estamos a ser vítimas desta política de portas abertas sem controle que desenvolvemos. É com isso que vamos acabar, vamos pôr controlo, não vamos acabar com a imigração.
Vamos à Justiça e ao caso das gémeas luso-brasileiras. Considera que esta situação pode ter consequências no mandato presidencial?
Pode ter. Há uma coisa que é a questão criminal e aqui vejo a possibilidade de que há abuso de poder, que há tráfico de influências, mas isso é uma questão que vai ser discutida pelo Ministério Público e pelos tribunais. Porque é que é tão grave politicamente para o Presidente? Porque toca duas questões que para Marcelo sempre foram importantes: uma é a questão da família, da separação da família e do poder, e ele próprio atacou o Governo socialista, lembramo-nos do Family Gate, quando isso aconteceu. A segunda é que a questão da saúde diz mesmo muito às pessoas. Tive a preocupação de ver ontem o acesso a medicamentos nos hospitais portugueses e 94% dos hospitais não conseguem aceder a medicamentos. Portanto, as pessoas estão em causa. Todos temos a experiência de familiares, de amigos, que não sendo ricos, têm dificuldades para ter consultas, cirurgias ou medicamentos. Saber-se que alguém, por ser poderoso, amigo do Presidente ou amigo do ministro, chegou a Portugal e obteve a nacionalidade em 14 dias e obteve medicamentos de quatro milhões de euros, pode ter consequências políticas devastadoras. E, portanto, compreendo que Marcelo esteja incomodado com isto, porque isto passa uma imagem muito, muito má do poder político em Portugal. Ainda por cima numa área que é tão sensível.
E a credibilidade das instituições de soberania fica beliscada?
Se isto for como tem sido noticiado, e infelizmente os elementos têm mostrado que sim, fica beliscada porque isto mostra uma forma de fazer as coisas. Ainda hoje, quando vinha para aqui, assisti a Lacerda Sales, que é um deputado que gosto, por acaso, pessoalmente, e acho que é um tipo sério, acho mesmo e tenho uma boa relação com ele, fazer o pior serviço que se pode prestar à política. Que é, quando disseram que ele é que tinha marcado a consulta, ele negou completamente, mas hoje vi-o andar pelos corredores do Parlamento com os jornalistas atrás a dizer que agora já não se lembra. Ou seja, ontem não foi ele de certeza, hoje já não se lembra, amanhã ainda diz que sim. Como é que podemos pedir às pessoas credibilidade com exemplos como este?
Nas presidenciais, André Ventura pode ser outra vez o candidato do Chega ou desta vez o Chega tentará uma candidatura global da direita? Se Pedro Passos Coelho avançar, teria o seu apoio ou não? Ou o Almirante Gouveia e Melo?
Tudo é possível, todos esses nomes seriam possíveis de ter o nosso apoio. Também é possível que me recandidate. É um cenário que vai depender muito, porque agora temos um novo quadro em que vai haver legislativas antes das presidenciais, portanto, neste novo quadro político, tomaremos essa decisão. Agora, independentemente disso, há uma coisa de que tenho a certeza: precisamos de um Presidente da República diferente do que está a ser Marcelo Rebelo de Sousa. Precisamos de um Presidente da República popular, próximo das pessoas, de afetos também, mas precisamos de um Presidente que se resguarde mais e que nos momentos decisivos também consiga tomar decisões com maior autonomia para os portugueses também olharem para o papel do Presidente não só como um corta-fitas, mas como alguém que tem um papel relevante no sistema político português. E, por isso, qualquer destes nomes que referiu era possível. Também é possível que me recandidate. Ainda não tomei uma decisão.
E ainda antes das presidenciais temos as eleições europeias. Quem será o cabeça de lista pelo Chega?
Ainda não sei, não tomei mesmo essa decisão, até porque temos um congresso agora no início de janeiro. Havia uma sondagem há pouco tempo que nos dava quatro eurodeputados, ao PSD seis e ao PS seis. É uma responsabilidade muito grande e por isso não decidi ainda quem é o cabeça de lista, mas quero deixar um compromisso aos ouvintes e aos leitores de que vamos apresentar uma equipa competente, com provas dadas, mas no quadro internacional e com capacidade de intervenção no Parlamento Europeu. Atualmente, temos uma muito boa relação com os nossos parceiros no ID [grupo Identidade e Democracia, a família europeia do Chega], estão a apostar muito em nós. De resto, o congresso do ID foi em Lisboa, mesmo sem termos deputados europeus e isso é a prova da importância que nos estão a dar no quadro europeu. Não quero faltar à chamada e acho - e continuo a dizer isto mesmo tendo legislativas agora a 10 de março -, que vamos ter o melhor resultado de sempre nas eleições europeias.
