"Porque é que as escolas, a partir do ensino básico, não têm uma disciplina de Proteção Civil?"
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José Guilherme, o comandante da Proteção Civil que chefiou a equipa de 52 portugueses que ajudou nas operações de socorro depois do sismo que abalou a Turquia no início do ano, defende que as escolas portugueses devem lecionar Proteção Civil a partir do ensino básico e alerta que a população portuguesa ainda não está sensibilizada para os efeitos reais de uma catástrofe desta natureza.
A ver, à distância, o sismo que abalou Marrocos na última sexta como mais um evento da natureza para o qual "ninguém no mundo está preparado", admite que, seis dias depois do abalo, ainda seja possível encontrar sobreviventes, embora o tempo seja um bem cada vez mais precioso.
A esperança, lembra o comandante em entrevista à TSF, é a última a morrer, mas neste caso, mais do que o ditado popular, há uma correspondência com a realidade: "A janela de oportunidade de encontrar alguém com vida cada vez é mais reduzida, cada vez está mais fechada, e depois também tem a ver com onde ocorreu o sismo e a qualidade da construção", que em Marrocos, apontam os especialistas, não é a melhor.
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Ainda assim, continua a ser possível encontrar vida debaixo dos escombros, mas tudo depende de se a vítima tem "uma bolsa de ar e acesso a água e a comida", já que esses "são os dois bens essenciais principais para o organismo poder sobreviver". A estes, junta-se "a resistência metabólica de cada ser humano" como fator decisivo para a sobrevivência.
As operações de socorro costumam durar entre dez a 12 dias e só os governos podem decidir quando acaba a fase de procura de vida e começa a da reconstrução. Até lá, as operações continuam, mesmo onde, por vezes, há pouco espaço. Mas "a partir do momento em que há acesso, nem que seja através de um orifício, a primeira avaliação que as equipas fazem é a do estado clínico da vítima e, a partir daí, dão-lhe através dessa entrada os bens essenciais como água e comida".
Estas equipas contam também com psicólogos que apoiam diariamente os operacionais para enfrentar cenários difíceis: no caso de Marrocos, o acesso às montanhas não tem sido fácil e a temperatura dificulta ainda mais. De dia rondam os 30 ºC ou 40 ºC e à noite "até podem ser negativas".
"São sempre condicionantes, mas as equipas vão preparadas para isso", resultado de anos de treino que se aliam à ajuda da população no local. "Ao fim e ao cabo são eles que residem ali, são eles que conhecem o vizinho do lado, além dos familiares. É sempre importantíssimo, seja até mesmo para a ajuda no transporte do equipamento."
José Guilherme garante que, se Portugal for chamado a ajudar Marrocos, consegue ter uma equipa preparada em entre seis a 12 horas, mas no caso de Portugal ser abalado por, confessa-se preocupado.
"Temos população que ainda não está sensibilizada para que, se formos afetados por um sismo, as primeiras coisas a falhar são a rede de telemóvel, redes de comunicações, o saneamento, a água e a luz. Ainda há pessoas que pensam que, se tiverem um sismo, pegam no telemóvel, ligam para os bombeiros e, no minuto a seguir, têm uma equipa de bombeiros na sua casa. Isto não acontece", adverte.
Apesar da aposta portuguesa na prevenção, José Guilherme avisa que é preciso apertar na formação e questiona até "porque é que as escolas, a partir do ensino básico, não têm uma disciplina de Proteção Civil".
Fica a dúvida de quem chefiou a equipa portuguesa de socorro no sismo da Turquia e de lá trouxe uma certeza: "Ninguém no mundo está preparado para responder quando a nossa mãe natureza nos surpreende", mas a melhor resposta continua a ser uma boa prevenção.
