No dia de Ano Novo morreram 513 pessoas, um número que nunca foi atingido a 1 de janeiro nos últimos 10 anos.
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Portugal registou 5542 mortes nas primeiras duas semanas de 2024, sendo o início de ano em que mais pessoas morreram desde 2021, durante a pior fase da pandemia de Covid-19 no país, segundo dados oficiais.
O Sistema de Informação dos Certificados de Óbito (SICO) mostra que no dia de Ano Novo morreram 513 pessoas, um número que nunca foi atingido em 01 de janeiro nos últimos 10 anos.
De acordo com a informação divulgada no 'site' do SICO, desde o primeiro dia do ano até esta sexta-feira a mortalidade tem permanecido "muito acima do esperado".
Em 02 de janeiro morreram 551 pessoas, um valor que não era verificado para o mesmo dia desde 2017, quando foram contabilizadas 578 mortes.
Nos primeiros quatro dias de 2024 foram registados 2119 óbitos. Nos últimos dez anos nunca foram registadas mais do que duas mil mortes nesse período. Nem em 2021, ano marcado pela pandemia.
O SICO regista ainda que nos últimos sete dias se verificaram 638 óbitos em excesso. A mortalidade em excesso é aquela acima do esperado pelas autoridades para o mesmo dia.
O excesso de mortalidade tem vindo a ser registado desde o dia de Natal de 2023, ficando 37,4% acima do esperado em 01 janeiro, 47,4% em 02 de janeiro, 43,3% em 03 de janeiro e 38,6% em 04 de janeiro, os dias mais críticos.
Nos últimos sete dias, o sistema contabilizou uma média de excesso de mortalidade de cerca de 24%, com 3.291 óbitos no total.
Entre 01 de janeiro e hoje, a maioria dos óbitos ficou a dever-se a causas naturais, com uma média de 413 mortes diárias. A média de óbitos por causas externas é de 1,5 e 586 estão sujeitos a investigação.
Como explicar estes dados?
Ouvido pela TSF, o presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública, Gustavo Tato Borges, apontou ser "muito difícil" ter para já uma conclusão "muito completa" sobre este fenómeno, mas aponta alguns fatores "importantes".
"O primeiro tem a ver com a incidência da gripe, que aumentou dramaticamente depois das festividades do Natal e que também pode ter sido potenciada depois das festividades do Ano Novo", associado à circulação de uma variante da gripe "que é mais agressiva, que é esta variante H1N1", e a uma cobertura vacinal "abaixo do desejável para esta altura do ano".
Assim, o resultado desta combinação de fatores é do que há "pessoas expostas de uma forma consistente ao vírus e que não estão totalmente protegidas ou tão protegidas quanto deveriam".
A estes fatores junta-se ainda os encerramentos de vários serviços de urgência no final do ano, "que impediram, se calhar, um acesso adequado aos cuidados de saúde" e que resultaram em protelações e num "aumento de mortalidade".
A TSF falou também com o antigo diretor-geral da Saúde, Constantino Sakellarides, que não descarta uma ligação entre este excesso de mortalidade e uma menorização do papel dos centros de saúde.
O papel do Serviço Nacional de Saúde "tem sido menorizado nesta última evolução", nota, "devido à formação de grandes agrupamentos de centros de saúde e perdeu a gestão de proximidade".
Sakellarides encontra também problemas na "forma como o programa de vacinação foi anunciado, há uns meses", porque "tinha elementos que menorizavam o papel importante" dos centros de saúde nesse âmbito. "Isso, de certa forma, pode ser um dos componentes desta resposta vacinal mais débil numa altura que mais precisamos dela."
Portugal no topo da EuroMOMO
Os dados disponibilizados pelo SICO são atualizados de forma automática em intervalos de 10 minutos, permitindo fornecer aos administradores de saúde, autoridades de saúde pública e responsáveis pelo planeamento na área da saúde informação atualizada sobre mortalidade ocorrida em território nacional, por área geográfica, grandes grupos de causas de morte e grupo etário.
Portugal é o país com maior excesso de óbitos na primeira semana de 2024, entre os 25 que constituem a rede europeia EuroMOMO, que calcula semanalmente os números da mortalidade dos países membros.
Os dados consultados pela agência Lusa revelam que Portugal é o único membro da EuroMOMO registado com "excesso muito elevado".
Os internamentos por gripe nas Unidades de Cuidados Intensivos diminuíram na primeira semana do ano para 11,7% face à época do Natal e Ano Novo, segundo o Boletim de Vigilância Epidemiológica da Gripe e outros Vírus Respiratórios do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA).
Na semana de 01 a 07 de janeiro deste ano "a proporção da gripe em UCI [Unidades de Cuidados Intensivos] foi de 11,7%, valor inferior ao registado na semana anterior".
O documento refere que a proporção da gripe em UCI aumentou entre as semanas 50 e 52 de 2023 (Natal e Ano Novo), altura em que atingiu os 17,1%, valor acima do registado em períodos homólogos (proporção máxima de 13,5% na época 2013-2014).
No que se refere ao número de novos internamentos por infeção por RSV (Vírus Sincicial Respiratório) em crianças menores de 24 meses na rede de vigilância sentinela apresenta uma tendência decrescente nas últimas semanas.
Desde outubro de 2023 foram reportados 340 casos de internamento por RSV pelos hospitais que integram a rede de vigilância.
Segundo os mesmos dados, a mortalidade por todas causas tem registado valores acima do esperado desde o final do ano passado e nos grupos etários acima dos 45 anos.
No panorama internacional, até ao final do ano passado, as taxas de incidência de infeções respiratórias agudas e de síndrome gripal na comunidade mantêm uma tendência crescente no espaço europeu.
