Cavaco Silva lembrou hoje o «génio literário» de Sophia de Mello Breyner Andresen, enquanto a presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, recordou a poeta mas também a luta contra a ditadura do Estado Novo.
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«No momento em que se realiza a trasladação dos seus restos mortais para o Panteão Nacional, onde a partir de hoje repousará, por direito próprio, ao lado de grandes vultos da cultura e da história portuguesas, é justo homenagear também, a par do seu génio literário, a grandeza cívica e humana por que sempre se distinguiu», afirmou Cavaco Silva.
Na cerimónia de transladação da poeta e escritora para o Panteão Nacional, o Chefe de Estado lembrou que, com a morte de Sophia de Mello Breyner Andresen, há dez anos, «desapareceu uma das personalidades mais carismáticas da nossa literatura contemporânea», mas «também uma cidadã exemplar, um modelo de retidão moral e uma referência ética da sociedade portuguesa».
«Sophia de Mello Breyner foi grande pela harmonia e a aura dos seus versos, mas foi igualmente grande pela inteireza do seu carácter. Ambas as dimensões - a literatura e a vida - constituem na sua biografia dois ramos da mesma árvore, firme e inabalável. Era como escrevia e escrevia como era: autêntica, inteira na escrita e na coragem da defesa da justiça e da liberdade», afirmou.
Para o Presidente da República, a obra de Sophia de Mello Breyner Andresen «impõe-se hoje em dia como um verdadeiro marco na língua portuguesa».
Cavaco Silva considerou que «a sua voz foi ao mesmo tempo moderna e antiga na ligação às raízes portuguesas, gregas, cristãs», sendo Camões o «Poeta maior, em quem Sophia de Mello Breyner se revê». «Mas Camões é também para Sophia o testemunho de um País onde o poeta foi vítima de invejas e calúnias. Um País 'que tu chamaste e não responde/ País que tu nomeias e não nasce'», citou.
«É contra esse País do silêncio e da injustiça que Sophia vai erguer a sua voz, serena mas nem por isso menos veemente, ansiosa por ver raiar no horizonte 'o dia inicial inteiro e limpo', que tanto a empolgou no momento em que a liberdade foi restaurada», declarou, citando o poema 25 de Abril.
«Homenagear Sophia de Mello Breyner Andresen é um gesto a que se associam as várias gerações de Portugueses, irmanados na língua comum, que hoje partilhamos com mais sete povos independentes», afirmou. «Hoje, como no futuro, temos de ser dignos da Pátria que ela sonhou e pela qual tanto se bateu, com coragem e com palavras que ficarão para sempre na nossa memória coletiva», concluiu o Presidente.
Já a presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, lembrou hoje Sophia de Mello Breyner Andresen como poeta mas também «nos caminhos da política feita com alma», na luta contra a ditadura do Estado Novo e como deputada constituinte.
«Vemo-la, então, nos caminhos da política, a política feita com a alma, busca da felicidade dos homens, entrega inteira. Vemo-la persistente, buscando para a cidade a forma justa! Buscando a harmonia e a unidade de todos os homens. Contra o tempo de negação do Estado Novo, anunciando já um outro tempo», afirmou.
«Sophia de Mello Breyner representou a 'inteireza do estar na terra', para recorrer às suas próprias palavras. Uma inteireza que parece libertar-se da condição humana, uma inteireza impossível que, afinal, se realiza. Cidadã combatendo com a alma, intelectual, mulher e mãe, Sophia foi mesmo alguém todo inteiro, arauto de um tempo novo como tempo justo!», declarou.
A presidente da Assembleia da República considerou que as palavras de Sophia de Mello Breyner Andresen são «palavras de desafio»: «Para sermos heróis de um mundo novo, inscrevendo em cada ação a claridade da sua fórmula intemporal: a relação justa com os homens e a relação justa com as coisas».