Quatro mil autocarros na JMJ preenchem "quatro faixas da Vasco da Gama num sentido"
Em entrevista à TSF, o representante dos transportadores pesados de passageiros diz-se preocupado com várias das questões de mobilidade da JMJ, em especial perante um plano que vai ser apresentado tão tarde que será impossível resolver situações mais graves. Sem saber ao certo quantos autocarros serão precisos, avança desde já que não basta olhar para as estradas: é preciso saber também que condições encontrarão os motoristas.
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A menos de um mês do arranque oficial da Jornada Mundial da Juventude, e com a apresentação do plano de mobilidade prometida para a próxima semana, a câmara municipal de Lisboa e o Sistema de Segurança Interna convocaram comerciantes e empresários para uma sessão de esclarecimentos sobre as regras de circulação na cidade durante o evento e, entre os convidados, está uma especialmente preocupada Associação Rodoviária de Transportadores Pesados de Passageiros (ARP).
À TSF, o presidente da associação, Rui Pinto Lopes, lamenta que até aqui nada tenha sido dito "a quem está no terreno" e avisa que na próxima semana já é tarde demais para apresentar um projeto desta dimensão.
Sem saber ao certo quantos autocarros vão ser empenhados nas operações - uma estimativa que diz ser "impossível" fazer - Pinto Lopes avisa desde já que podem ser dois, quatro ou cinco mil os veículos e que tal terá especial impacto no trânsito da área metropolitana.
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"Alerto que quatro mil autocarros preenchem duas faixas do tabuleiro da Ponte Vasco da Gama, ida e volta. Ou, se quiser, quatro faixas num sentido só, de um extremo ao outro da ponte", avalia o representante dos transportadores.
"Se tivermos em conta que estes autocarros vão movimentar-se dentro da cidade, e também do exterior da cidade para a cidade, e vice-versa, para trazerem os peregrinos de manhã, todos aqueles que estão alojados em Évora, em Fátima, em Torres Vedras, em "n" sítios que já foram adiantados aqui por autarcas locais e por entidades ligadas à Jornada Mundial da Juventude, parece-nos algo arriscado lançar um plano em tão pouco tempo", conta.
Leia aqui a entrevista na íntegra:
A esta distância será manifestamente pouco tempo para corrigir qualquer anomalia que o plano tenha. Sendo o plano gizado por pessoas que, presumimos, entendam do assunto, mas que muito provavelmente não estão no terreno no dia a dia, o ajuste de toda esta máquina em tão pouco tempo irá ser, com certeza, muito complicado. Ou então, como é apanágio em Portugal, giza-se um plano e é assim que vai ser, independentemente de ser exequível ou não, é o que está traçado. É esta a nossa grande preocupação.
Nesta altura, sabe mais ou menos quantos autocarros nacionais foram mobilizados?
Não, isso é um número impossível de sabermos. Existem em Portugal cerca de 400 empresas de autocarros, é impossível, teriam de ser contactadas uma a uma. Eu recordo uma entrevista que foi dada pelo responsável do lado da Câmara, em abril, que na sua ótica estimava que viessem para Portugal nesta altura, que estivessem a operar na JMJ quatro mil autocarros. Não sei se serão quatro, se serão cinco, se serão dois mil, mas alerto que quatro mil autocarros preenchem duas faixas do tabuleiro da Ponte Vasco da Gama, ida e volta. Ou, se quiser, quatro faixas num sentido só, de um extremo ao outro da ponte, só para o público ter uma ideia, uma noção do que estamos aqui a falar em termos de ocupação do território. Se tivermos em conta que estes autocarros vão movimentar-se dentro da cidade, e também do exterior da cidade para a cidade, e vice-versa, para trazerem os peregrinos de manhã, todos aqueles que estão alojados em Évora, em Fátima, em Torres Vedras, em "n" sítios que já foram adiantados aqui por autarcas locais e por entidades ligadas às Jornadas Mundiais da Juventude, parece-nos algo arriscado lançar um plano em tão pouco tempo.
Repare: pode ser o melhor plano do mundo. O problema que está aqui é que não há comunicação, não se fala, as entidades que estão a gerir isto só falam para si próprias, não falam para quem está no terreno, não falam para quem está envolvido ou quem vai estar envolvido. E isto é um mau sinal. Não queremos de todo estar aqui a vaticinar que será uma tragédia, mas aquilo que nós olhamos e que é claro a todos é que não há comunicação, não há troca de opiniões, não há troca de informação. Portanto, parece-nos que começa inquinado este plano por aqui, logo. Depois se será bom ou mau, se haverá necessidade de correções... É normal que num projeto desta dimensão haja sempre necessidade de correções. Agora, teremos tempo para as fazer? Detalhes, eventualmente sim. Situações de maior gravidade, provavelmente, a esta distância, será impossível.
Mas o que é que receia em concreto?
Acima de tudo, enquanto português, receio que o bom nome de Portugal possa ser beliscado pela má organização. Porque não está em causa aqui, perante a opinião pública internacional, se foi a pessoa A ou B que traçou um plano, que fez isto ou fez aquilo, o que está em causa é o nome de Portugal. E isto preocupa-nos porque andamos todos aqui a lutar para ter um país pós-pandemia com mais turismo, turismo de maior qualidade, andamos sempre aqui a colocar exigências aos hotéis, aos autocarros, a tudo o que é serviço, temos regras e temos exigências, e depois temos um evento de uma dimensão mundial que é uma oportunidade fantástica para promover ainda mais o nosso país e mostrarmos que somos que somos bons, que somos gente de bem e que temos um país fabuloso, e corremos o risco de não ser esta a imagem. Repare, todos os dias vão estar centenas de milhares de pessoas num sítio que não é servido por metro, que tem uma linha de comboio que passa a umas centenas de metros e que não tem nenhuma paragem, nenhuma estação direta para o evento, e isto preocupa-me, claro que me preocupa, porque muitos dos peregrinos vão chegar à estação do Oriente, por exemplo quem for de metro, porque é a estação mais próxima, e depois vão ter de fazer a pé a 3 km para chegar ao palco das jornadas. E, portanto, isto preocupa-me.
Preocupa-me também que, estima-se, por exemplo, que em Fátima estejam largos milhares de pessoas alojadas e Fátima não tem sequer comboio. A estação de comboio de Fátima está longe da cidade, está bastante longe e, portanto, serão transportados de autocarro. São 100 km, sim, em termos de condução estamos a falar de uma hora e um quarto de distância se não houver obstáculos na via. Agora, eu queria que me explicassem como é que nós transportamos 20 ou 30 mil pessoas diariamente de Fátima para Lisboa quando, em média, um autocarro leva 50 pessoas. São precisas largas centenas de autocarros e depois é, como é que estes autocarros entram em Lisboa? Onde é que vão deixar os peregrinos ou os jovens que vão para a jornada? Onde é que eles vão ficar aparcados durante o dia? Isto naturalmente que me preocupa porque vamos ter lá motoristas - e são centenas ou milhares de motoristas que vão ali estar durante o dia numa temperatura que pode chegar aos 35 °C -, e não vamos ter, por questões ecológicas, os autocarros ligados a todo momento para os motoristas terem um sítio com ar condicionado dentro do próprio autocarro, porque fora não existem condições, não há nada, não há nenhum apoio. Não há uma casa de banho. Tudo isto são questões que têm de ser devidamente estudadas, devidamente analisadas para que se faça um plano de mobilidade que não é só, e isto é importante as pessoas terem noção, que não é só movimentar um autocarro, conduzir um autocarro, é onde é que se vai aplicar o autocarro? Onde é que o profissional que está no volante do autocarro vai ter condições de estar horas a fio à espera para iniciar a seguinte viagem? Tudo isto é um problema se não for analisado.
E nós estamos preocupados e acho - opinião pessoal e profissional - legitimamente preocupados porque temos uma entidade que se chama Câmara Municipal de Lisboa e temos uma entidade que é o Governo de Portugal que não comunicaram nada com quem vai para o terreno, com quem vai operar no terreno. Não trocaram informações. Não deram informações e, portanto, a três semanas do início das jornadas, que na realidade não são três semanas, porque há muitos jovens que vêm antes para o país e que vão chegar aqui na semana anterior - nós temos muitos pedidos de transferes, já na semana anterior, do aeroporto do Porto para unidades hoteleiras e para organismos que vão alojar estes jovens, e temos depois muitos pedidos para os levarmos para Lisboa no dia anterior às jornadas. Isto não começa no dia da jornada, isto começa muito antes e não é só um problema de Lisboa. Vai ser um problema de Lisboa, do Porto, de Coimbra, de uma série de cidades que vão estar afetadas por este volume, por esta dimensão, que as jornadas encerram em si próprias. É isto que nos preocupa.
