Pedido de habeas corpus foi entregue na última segunda-feira.
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O Supremo Tribunal de Justiça indeferiu, esta quinta-feira, o pedido de habeas corpus entregue por um grupo de advogados encabeçado por Varela de Carvalho para libertar a mulher de 22 anos que abandonou o filho recém-nascido num caixote do lixo. A informação é confirmada pelo próprio tribunal.
O pedido deu entrada no tribunal na última segunda-feira. O anúncio da entrega da ação foi feito através do Facebook, onde Varela de Matos garantia que "a malta advocante [sic] não se conforma e quer fomentar a discussão" sobre a prisão preventiva a que a mulher de 22 anos foi submetida.
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Nesse mesmo dia, Varela de Matos explicou à TSF que até perceberá as razões que poderão ter levado o juiz a ordenar a prisão preventiva, mas são razões que não se podem sobrepor à justiça.
"O juiz atuou aqui como assistente social, procurando num raciocínio a priori a salvaguarda dos interesses da pessoa em questão ao pensar que ela, que acabou de ter uma criança na via pública há dois dias, ficaria melhor numa prisão onde tem assistência médica com cama e comida a horas do que continuar deitada na tenda a chover, onde viveu e teve o parto", disse o candidato a Bastonário da Ordem dos Advogados.
Em reação à rejeição do pedido para libertação imediata da mãe por parte do Supremo Tribunal de Justiça, Varela de Matos fez uma publicação no Facebook em que afirma que o seu primeiro grande objetivo está alcançado: chamar a atenção para este que classifica como um caso de gritante injustiça.
"Chamar a atenção para as condições miseráveis em que vivem centenas e centenas de homens e mulheres nas grandes cidades. Sensibilizar as autoridades para pôr mãos à obra no auxílio aos sem-abrigo, na sequência dos apelos do senhor Presidente da República. E pôr os tribunais a discutir esta questão", pode ler-se na publicação de Varela de Matos.
Na última sexta-feira, a mulher de 22 anos que abandonou o filho recém-nascido num caixote do lixo foi condenada à medida de coação mais gravosa, a de prisão preventiva. O caso remonta à passada terça-feira, quando o bebé foi encontrado por uma pessoa sem-abrigo no interior de um contentor junto a uma discoteca na Avenida Infante D. Henrique, em Santa Apolónia.
A sustentação
"Ao contrário do que consta do requerimento de 'habeas corpus' apresentado, o ilícito imputado à arguida corresponde à prática do crime de homicídio na forma tentada e não de exposição, abandono ou infanticídio, salientando-se que, quanto a este último, é determinante a perturbação pós-parto, que não se afigura compatível com a conduta da arguida, documentada nos autos e que indicia a sua premeditação na prática dos factos", sustenta a decisão do STJ, a que a Lusa teve acesso.
A juíza de instrução criminal fundamentou a aplicação da prisão preventiva à arguida com o facto de estar em causa um crime de homicídio qualificado na forma tentada.
O STJ refere que desta imputação, "genericamente, corresponde ao facto de a arguida, de forma premeditada, ocultando a gravidez e munindo-se de um saco de plástico para o efeito, ter depositado o seu filho acabado de nascer num caixote do lixo na via pública".
Após o parto, referem os juízes conselheiros, a arguida "colocou o bebé e o material biológico proveniente do parto no referido saco de plástico e depositou o mesmo num ecoponto amarelo", acrescentando que o bebé "veio a ser encontrado por um transeunte, desnudo, gelado, com o cordão umbilical irregularmente cortado e coberto de sangue".
Nesse sentido, os juízes conselheiros Nuno Gonçalves (relator), Pires da Graça (adjunto) e Santos Cabral (presidente da secção) entendem que "não se afigura que a prisão preventiva da arguida seja ilegal, devendo manter-se a mesma, porquanto se mostram inalterados os pressupostos que determinaram a sua aplicação".
A decisão sublinha ainda que não é o 'habeas corpus' o "procedimento constitucional e legalmente previsto para discutir a qualificação jurídica efetuada na decisão judicial que impôs a prisão preventiva à arguida", razão pela qual também indeferiu a petição de 'habeas corpus' por "falta de fundamento".
Na decisão do STJ, de 36 páginas, constam as declarações e as explicações dadas pela jovem quando presente a primeiro interrogatório judicial, durante o qual disse que vivia desde junho numa tenda junto à estação de caminhos de ferro de Santa Apolónia, em Lisboa, juntamente com um companheiro.
A arguida afirmou que, por ter feito um teste num centro de apoio a sem-abrigo, na Mouraria, sabia que estava grávida desde pelo menos o sétimo mês de gestação, acrescentando que lhe perguntaram se queria abortar, tendo dito que não.
Além disso, referiu que encobriu a gravidez, que não sabia o dia em que o bebé iria nascer e que não pensou em pedir ajuda, admitindo que, após o parto, colocou a criança num saco de plástico e depositou-o num contentor ecoponto.
A jovem justificou esta atuação com o facto de estar desesperada, sem saber o que fazer ao bebé, pois não tinha condições porque estava na rua.
Disse ainda não saber quem é o pai da criança.
Segundo a Polícia Judiciária, a mãe do recém-nascido agiu sozinha e nunca revelou a gravidez a ninguém, vivendo numa situação "muito precária na via pública".